A Daimler, casa-mãe da Mercedes e Smart, tem em Dieter Zetsche um obreiro de respeito (e respeitado por todos, dentro e fora da empresa) desde 2006, que dirigiu o grupo alemão nos últimos 12 anos. A sua liderança foi sendo sucessivamente renovada até agora, quando, para surpresa geral, foi anunciado o seu afastamento do lugar de CEO e “lateralização” para o lugar de chairman, mas só em 2021. Para os analistas, quem tanto fez pela Mercedes, levando-a a ultrapassar a Audi e a BMW, merecia mais e melhor.
É certo que Zetsche tem 65 anos e é também verdade que a Mercedes esteve envolvida em alguma polémica envolvendo o Dieselgate, emissões manipuladas, mesmo em motores legais, que adquiriu à Renault e onde depois montou uma gestão electrónica que defraudou a legislação. Mas não é evidente que seja isto que mandou Zetsche abaixo, especialmente desta forma: ‘sai agora, que daqui a três anos passas a chairman‘.
Outra explicação possível envolve Li Shufu, o chinês dono da Geely, Volvo e afins, que adquiriu quase 9,7% da Daimler por 9 mil milhões de dólares no início do ano. Primeiro, Shufu fez saber que gostaria de adquirir uma fatia da Daimler, como accionista especial, com o grupo alemão a responder que isso nunca iria acontecer, que ele não era bem-vindo e que se fizesse questão, realizasse a operação através da bolsa. A resposta surgiu através de um porta-voz, o que num assunto tão sensível nunca aconteceria sem o aval de Zetsche.
Depois desta primeira “canelada”, Li Shufu foi ao mercado e efectivamente comprou 9,7% da Daimler (ele que facilmente poderia adquirir 20 ou 30% sem grande esforço, pois apesar da empresa estar blindada para quotas a partir de 20%, há sempre formas de contornar esta premissa. Depois, o tal porta-voz voltou a vir a público dar mais um golpe em Shufu, afirmando que a entrada do chinês não iria alterar a estratégia do grupo alemão para a China, onde já tinha um parceiro, que não Li Shufu. Mais uma agressão desnecessária, que dificilmente o chinês esqueceria.
Como passados uns meses desta dupla falta de delicadeza para com o maior accionista do grupo, Zestche é afastado para um limbo – facilmente a Daimler poderia afastar já Manfred Bischoff, o actual chairman que ninguém conhece e que está previsto sair em 2021 e que, tal como Zetsche, foi eleito em 2006 e já conta com 76 primaveras –, a dúvida em relação ao facto do afastamento de Dieter da Daimler tem toda a razão de existir. O tempo dirá qual o motivo, mas é sempre bom ter presente que os CEO (sem participação determinante na empresa) são meros empregados e são os accionistas (especialmente se têm uma posição representativa) que verdadeiramente mandam na empresa.