A antiga residência oficial do presidente da Câmara de Lisboa está disponível para alojamento local num site de reservas turísticas, sendo que a licença de utilização é da empresa MCO II, que também gere outros espaços públicos em Lisboa. A “Villa” Casa do Presidente, localizada na Estrada do Penedo, na Ajuda, em pleno parque florestal de Monsanto, está, segundo informação do site Booking, disponível para alojamento desde agosto deste ano.

Ao Observador, fonte oficial da Câmara de Lisboa explicou que o edifício deixou de ser residência oficial do presidente da autarquia em 2008 (altura em que a existência de uma residência oficial deixou de fazer parte do estatuto dos autarcas) e que o último a fazer uso do espaço, nessa condição, foi Pedro Santana Lopes. De lá para cá, a moradia ficou sem qualquer utilidade, o que levou à decisão de a entregar à exploração por privados. A CML acrescenta que a concessão do palacete à empresa MCO II, na sequência de um concurso público internacional, fez parte de um negócio mais abrangente, que inclui um total de 53 mil metros quadrados de terreno, em Monsanto, onde estão localizados outros edifícios do género. Todos estariam em estado de abandono, por isso o acordo previu que a empresa investisse quase 4 milhões de euros em obras e pagasse uma renda mensal de 2.600 euros mais IVA. Um valor objetivamente baixo, tendo em conta o custo do arrendamento na cidade de Lisboa e a dimensão do terreno, mas que, sublinha a autarquia, não pode ser isolado do tais quase 4 milhões gastos em obras, que permitirão a recuperação total da área em causa.

Em comunicado, entretanto enviado às redações, a CML acrescenta que a concessão incluiu “a recuperação e exploração de uma parte delimitada da Quinta da Pimenteira, o Moinho do Penedo e duas casas de função – todas localizadas em Monsanto” e que, terminado o prazo da concessão, “todo o património, já reabilitado, permanecerá propriedade do Município de Lisboa, que não quis abdicar desse património”.

(Veja aqui as fotos da Casa do Presidente, como anunciada no site Booking)

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A licença do Registo Nacional de Alojamento Local pertence à empresa MCO II, que gere, entre outros espaços, o Mercado de Campo de Ourique. É também esta empresa que ficou com a concessão do Moinho do Penedo e a Quinta da Pimenteira, ambos em Monsanto, através de um concurso lançado pelo município lisboeta em 2014, conforme uma notícia do jornal “Público” de 2015.

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A Casa do Presidente foi morada de Pedro Santana Lopes, quando este assumiu a presidência da autarquia em 2002, um imóvel inaugurado em 1989 por Krus Abecassis, mas que até então não tinha sido utilizada. Anos mais tarde, quando presidia à autarquia, António Costa, chegou também a utilizar a residência.

No site Booking, a Casa do Presidente é caracterizada como uma propriedade construída em 1920 e que oferece acomodações com terraço. Uma noite pode rondar mais de 800 euros, segundo uma simulação feita pela agência Lusa, para o dia 23 de outubro.

“A villa dispõe de quatro quartos, sala de estar, área para refeições e cozinha bem equipada com lava-louças. A villa também oferece TV de tela plana, máquina de lavar roupa e banheiro com banheira e chuveiro. Um café da manhã continental é servido diariamente na propriedade”, pode ler-se ainda no site.

Segundo a descrição, a villa oferece ainda uma piscina ao ar livre e tem jardim e ‘lounge’ compartilhados “onde você pode também relaxar”.

Bloco de Esquerda quer esclarecimentos da autarquia

O caso levou já o Bloco de Esquerda a anunciar que vai questionar a Câmara Municipal de Lisboa, através dos seus deputados municipais. Num curto comunicado enviado às redações, o partido diz que saber “que imóveis públicos estão concessionados pela CML, qual o prazo das concessões e sob que condições”, considerando “injustificável que, num momento de crise na habitação e alojamento para estudantes, existam concessões de imóveis públicos para turismo”.

Ainda no ano passado, o antigo vereador bloquista Ricardo Robles condenava a entrega daqueles terrenos, em Monsanto, a privados. Segundo um artigo do Diário de Notícias, à data, Robles questionava a razão para entregar o espaço de 53 mil metros quadrados no total, que incluíam um solar do século 18 e outras construções que iriam dar lugar a um hostel com 120 camas. O vereador dizia que o negócio era “lesivo para a cidade” e que “nada batia certo” nos números apresentados.

Naquela altura, Robles prometia continuar a exigir esclarecimentos ao presidente, Fernando Medina, mas, 10 meses depois, o bloquista acabou por demitir-se do cargo, depois das acusações de especulação imobiliária a propósito do negócio da compra e venda de um prédio em Alfama — um edifício comprado por 347 mil euros e posto à venda por 5,7 milhões, que seria também para alojamento local.

Prédio de Robles era para alojamento local. Veja aqui o anúncio da Christie’s

Nova regras entram em vigor esta segunda-feira

A notícia de que a residência oficial do presidente a Câmara de Lisboa já está disponível para receber hóspedes é conhecida no dia em que entram em vigor as novas regras do alojamento local. O diploma permite às câmaras municipais e às assembleias de condóminos intervirem na autorização do alojamento local, autorizando a fixação de “áreas de contenção” para “preservar a realidade social dos bairros e lugares”.

Na semana passada, a Câmara Municipal de Lisboa anunciou, em reunião privada do executivo, liderado pelo PS, que vai suspender novos registos de alojamento local nos bairros de Madragoa, Castelo, Alfama, Mouraria e Bairro Alto. A informação foi transmitida aos vereadores durante a reunião que decorreu na quinta-feira passada, nos Paços do Concelho, através da apresentação de um estudo urbanístico do turismo em Lisboa, ao qual a agência Lusa teve acesso. De acordo com fontes consultadas pelo Observador, foram apenas apresentadas as linhas gerais do estudo. Não houve nenhuma proposta concreta e o executivo camarário ainda não dá a discussão por fechada.

Esse eventual plano levou a Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP) a pedir a Fernando Medina e à autarquia que “clarifiquem as regras do jogo” no que diz respeito à entrada em vigor das novas regras. “No que diz respeito à possibilidade de criação de zonas de contenção — até ao momento apenas Lisboa tornou pública a vontade em querer aplicar –, importa esclarecer que diz respeito apenas à possibilidade de suspensão temporária de registos em certas áreas até que o Regulamento [sobre as zonas de contenção] seja publicado“, explicou a ALEP num comunicado enviado às redações.