Os negociadores do Governo britânico e da União Europeia chegaram a um entendimento sobre o Brexit, que resolve o problema da fronteira na Irlanda do Norte, numa reunião esta terça-feira, segundo avançam várias fontes aos media britânicos.

O documento com o texto acordado será agora discutido num Conselho de Ministros de emergência, marcado para esta quarta-feira. A primeira-ministra Theresa May espera que o acordo seja agora validado pelos seus ministros. Se tal acontecer, o acordo poderá depois ser finalizado na próxima cimeira europeia e depois votado pelo Parlamento britânico e pelo Parlamento Europeu, a fim de estar em vigor antes da data oficial do Brexit, marcada para 29 de março.

O acordo técnico ainda não foi confirmado oficialmente quer por Londres quer por Bruxelas, mas Downing Street já reconheceu que haverá um Conselho de Ministros extraordinário nesta quarta-feira, às 14h. May prepara-se para convencer os seus ministros, o primeiro desafio que terá de enfrentar para avançar com este acordo, antes de ele poder ser confirmado pelos Estados-membros da UE e depois pela Câmara dos Comuns britânica.

A BBC acrescenta ainda que os embaixadores dos restantes 27 países da UE se reunirão também esta quarta-feira, em Bruxelas.

Problema da fronteira nas Irlandas pode ser solucionado com acordo de comércio

De acordo com o jornalista Tony Connely, da RTE, o documento acordado prevê uma resolução para o problema da fronteira entre as duas Irlandas (que, para respeitar o Acordo de Paz, não pode criar uma fronteira rígida entre as duas regiões): um acordo de comércio entre o Reino Unido e a UE, a nível nacional, que preveja termos “mais profundos” no que diz respeito à Irlanda do Norte. Uma fonte presente nas negociações declarou mesmo ao jornalista que o acordo é “o mais estável que podia ser”.

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O busílis está na criação de um chamado backstop, uma espécie de rede de segurança que deixasse a fronteira entre as duas Irlandas numa situação que não fosse a de uma fronteira física com controlos de segurança apertados, depois de o Reino Unido abandonar a União Europeia. O problema é que tem havido grandes divergências sobre a forma que essa rede de segurança deve ter: Bruxelas tem defendido que a Irlanda do Norte seja incluída numa zona de comércio livre europeia, como o resto da Irlanda, mas os unionistas do DUP opõem-se fortemente a isso, defendendo um regime igual para todo o Reino Unido.

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Segundo a televisão irlandesa RTÉ, a solução encontrada nestes últimos dias terá sido a de propor um backstop para todo o país, através de um acordo comercial UE-Reino Unido temporário, com regras mais específicas para a fronteira entre as duas Irlandas. Resta saber se os ministros mais eurocéticos aceitarão uma solução desse tipo, bem como o DUP.

Resistência entre os unionistas e os eurocéticos

Para além da possível resistência dos seus ministros mais eurocéticos, May terá ainda de convencer o Partido Unionista Irlandês (DUP no original), de quem depende na Câmara dos Comuns. Embora o DUP seja aliado do Governo, tem feito algumas exigências na questão da fronteira irlandesa.

Esta terça-feira, membros do DUP reagiram de imediato, explicando que apesar de ainda não terem visto o documento em causa, consideram difícil apoiar um acordo que esteja em linha com o que tem sido falado. O porta-voz do partido, Sammy Wilson, explicou à BBC as condições que o partido impõe para aprovar um acordo:

Quaisquer que sejam os acordos, não podem tratar a Irlanda do Norte de forma diferente. Pelo que temos ouvido, não tem sido esse o caso. Em segundo lugar, esses acordos têm de ser temporários. E terceiro, a possibilidade de abandonar esses acordos tem de estar na mão do Governo britânico, não da UE nem de nenhum órgão independente.”

O Governo irlandês declarou oficialmente, através de um porta-voz, que as negociações “ainda decorrem”. “Não vamos comentar mais fugas que surgem na imprensa”, disse o porta-voz do vice-primeiro-ministro irlandês, Simon Coveney.

No passado, May também apresentou propostas que levaram à demissão de ministros do seu próprio Executivo, como Boris Johnson e David Davis. Johnson, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, já reagiu inclusivamente a estas notícias, esta terça-feira, classificando um acordo que mantivesse o Reino Unido na união aduaneira, mesmo que de forma temporária, como “coisa de Estado vassalo” e algo “totalmente inaceitável”. “Pela primeira vez em centenas de anos, este Parlamento não teria voto na matéria em leis que dizem respeito ao país”, resumiu à BBC.

Também o deputado conservador Jacob Rees-Mogg, um conhecido eurocético dos tories, se pronunciou contra este alegado acordo que, diz, manteria o mercado comum europeu “de facto“. “Espero que o Conselho de Ministros o bloqueie e que os deputados o bloqueiem”, declarou.

Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista (o maior da oposição), reagiu às notícias sobre este possível acordo com ceticismo: “Vamos olhar para os detalhes do que foi acordado quando estiverem disponíveis, mas pelo que sabemos da forma caótica como estas negociações foram geridas, é pouco provável que este seja um bom acordo para o país.”