Mal acabou de anunciar a imposição de sanções à importação de petróleo da PDVSA, a petrolífera estatal da Venezuela, o conselheiro de Segurança Nacional de Donald Trump, John Bolton, cedeu o púlpito ao seu colega e secretário do Tesouro, Steven Mnuchin.
A notícia já estava dada por John Bolton — os EUA anunciaram sanções à PDVSA, bloqueando bens no valor de 7 mil milhões de dólares e estimando que o impacto seria de 11 mil milhões de dólares perdidos num só ano — quando Steven Mnuchin se entregou à tarefa de entrar em detalhes. Mas, enquanto este último falava, foi outro detalhe que chamou a atenção de todos no caderno de John Bolton: um rabisco onde se lia “5000 tropas para a Colômbia”.
Aquele rabisco, escrito a caneta preta sobre folhas amarelas, foi fotografado em detalhe pelos vários fotojornalistas que estavam na sala de imprensa da Casa Branca. E causou alarme, o que não é para menos: a Colômbia partilha uma fronteira de mais de 2200 quilómetros com a Venezuela e, além de ser um ponto de passagem do migrantes venezuelanos, que já são mais de 1 milhão naquele país vizinho, é um ponto de grande tensão entre aqueles dois países.
Sobre este assunto, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Colômbia, Carlos Holmes Trujillo, emitiu um comunicado onde se lia que “a Colômbia não conhece as razões por trás daquelas notas e desconhece o seu verdadeiro alcance”. Além disso, acrescentou apenas que “a Colômbia vai continuar em conversações com os EUA sobre vários assuntos e vai continuar a cooperar com s EUA em quaissquer temas bilaterais”.
Mata e esfola. Agora que tem o ouvido de Trump, o que lhe dirá o falcão John Bolton?
Em declarações já no dia seguinte àquele episódio, o secretário interino de Defesa dos EUA, Patrick Shanahan respondeu a perguntas sobre aquele rabisco. “Não falei com o secretário Bolton sobre isso”, disse o homem que, por estar à frente do Pentágono, tem verdadeira jurisdição sobre as tropas norte-americanas, ao contrário do conselheiro para a Segurança Nacional. Este, no entanto, tem maior proximidade geográfica ao Presidente: ao passo que o secretário de Defesa trabalha num edifício completamente diferente, John Bolton tem o seu escritório a poucas portas de distância da Sala Oval, onde Donald Trump trabalha.
Questionado diretamente sobre a possibilidade de haver ou não tropas dos EUA na Colômbia, Patrick Shanahan disse ainda: “Não vou comentar esse assunto”. E fim de conversa.
A verdade é que há muito tempo que Donald Trump e a administração norte-americana têm ensaiado esse discurso várias vezes. A primeira foi em agosto de 2017, quando o próprio Presidente dos EUA disse: “Temos várias opções para a Venezuela. E, já agora, não vamos afastar uma opção militar. Temos muitas opões para a Venezuela. Estamos a falar de um país vizinho. Temos tropas no mundo inteiro em sítios longínquos. A Venezuela não é longínqua. E as pessoas estão a sofrer e a morrer. Temos muitas opções para a Venezuela, incluindo uma solução militar, se for necessário”.
Ao longo desta crise, acentuada após o reconhecimento norte-americano de Juan Guaidó como Presidente legítimo da Venezuela, tem havido várias declarações nesse sentido — que os EUA não afastam o cenário de uma intervenção militar e que todas as opções estão na mesa.
No entanto, esse mesmo cenário tem sido liminarmente afastado por vários observadores da situação venezuelana, muitos deles ouvidos diretamente pelo Observador. “É altamente improvável, não há qualquer tipo de apetite na região para isso e os EUA já não têm a postura que tiveram, por exemplo, em 1989 no Panamá”, assegurou Harold Trinkunas, especialista da Venezuela da Universidade de Stanford, nos EUA. O mesmo se aplica à Colômbia e ao Brasil, cujos líderes têm sido agressivos para a Venezuela no campo retórico — mas que dificilmente sê-lo-ão na prática. “Nenhum dos países está em posição de avançar militarmente, não têm capacidade para isso. Além disso, não é isso que lhes interessa. A América do Sul tem sido uma região bastante pacífica entre estados nas últimas décadas.”
Por isso, é possível que aquele rabisco não passe a apenas de bluff por parte do veterano da política internacional que é John Bolton. Mas, seja como for, pôs o mundo a falar dessa possibilidade.
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