Um Real Madrid-Barcelona é sempre um Real Madrid-Barcelona mas o desta quarta-feira era ainda mais do que um já importante Clásico. O jogo desta quarta-feira no Santiago Bernabéu foi o segundo de três entre as duas equipas em apenas 25 dias e valia o passaporte para a final da Taça do Rei. Depois de um empate na primeira mão da meia-final, com Malcom a responder na segunda parte ao golo embrionário de Lucas Vázquez, estava tudo em aberto na segunda mão — que servia também de antecâmara ao próximo encontro entre Real Madrid e Barcelona, já no próximo sábado, desta feita a contar para o Campeonato.

Barcelona e Real Madrid empatam e deixam tudo em aberto para a 2.ª mão da meia-final da Taça (1-1)

À partida, existia um fator distintivo dos últimos dois jogos entre as duas equipas: Leo Messi estava disponível e era titular no Barcelona. Depois de ter falhado o encontro da primeira volta do Campeonato, que os catalães venceram por 5-1 e que culminou na saída de Lopetegui do comando técnico do Real Madrid, o argentino voltou a não participar na primeira mão desta meia-final — tinha regressado de lesão há dias e ficou sentado no banco durante a totalidade dos 90 minutos. Messi, que no sábado fez o 50.º hat-trick na Liga espanhola e venceu praticamente sozinho o Sevilha, está num momento de forma admirável e era sem dúvida a melhor notícia que Ernesto Valverde tinha na iminência de duas visitas consecutivas ao Santiago Bernabéu.

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O treinador dos catalães mudou de estratégia face ao último jogo e tirou Philippe Coutinho, algo apagado nas últimas semanas, do onze inicial. Valverde optou por jogar com Messi e Suárez na zona mais adiantada do terreno e Dembélé no corredor esquerdo, com Sergi Roberto no corredor direito, para dar largura a um meio-campo com dois homens mais defensivos, Rakitic e Busquets. Cá atrás, Lenglet voltava a ser titular ao lado de Piqué, em detrimento de Umtiti, e o português Nélson Semedo ocupava a direita da defesa.

Do lado do Real Madrid, no dia em que o Tuttosport dá como certa a saída de Marcelo para a Juventus, Solari não convocou Isco e Bale voltou a não ser titular, acumulando provavelmente o descontentamento que levou o galês a não festejar o golo que marcou no passado domingo e que valeu a vitória frente ao Levante. Face a esse encontro, Sergio Ramos voltava ao onze inicial depois de ter cumprido castigo e Keylor Navas substituía Courtois na baliza e essas eram a única alterações de Solari: o meio-campo estava entregue aos inevitáveis Kroos, Casemiro e Modric e o ataque era responsabilidade do trio Vázquez, Benzema e Vinícius. O avançado brasileiro, aliás, tentava reproduzir o feito de Raphael Varane na meia-final da Taça do Rei da temporada 2012/13: na altura, com Mourinho no comando dos merengues, o central francês de apenas 19 anos foi o herói da eliminatória, marcou nos dois jogos e foi fulcral para a passagem do Real Madrid à final (onde perdeu com o Atl. Madrid).

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Numa primeira parte morna e sem grandes pontos de destaque, o Real Madrid mostrou sempre mais vontade de entrar com critério no último terço do relvado e demonstrou uma qualidade de passe superior, com maior assertividade e sem quota de risco, com a intenção clara de não perder bolas em zonas proibidas. Vinícius, tombado no corredor esquerdo e a explorar o espaço entre o lateral e o central, fez a vida negra a Nélson Semedo durante o primeiro tempo e foi de forma constante o homem mais perigoso dos merengues. Do lado do Barcelona, as raras tentativas de desmarcações e desequilíbrios surgiam também pelo lado esquerdo, com Dembélé a procurar servir Suárez e Messi sempre muito móvel nas costas, a tentar construir a partir de trás face à incapacidade dos catalães de trazer jogo desde os setores mais recuados.

Depois de um lance perigoso que não chegou a incluir um remate mas que teve uma boa assistência de Suárez que só não acabou nos pés de Sergi Roberto porque Reguilón se antecipou (8′), o Barcelona não voltou a conseguir criar perigo e ficou sempre pelo quase: o quase remate, o quase cruzamento, a quase oportunidade. O Real Madrid foi tentando sempre surgir pela ala esquerda e esperar de forma paciente pelos erros — e foram alguns — do meio-campo blaugrana. Vinícius esteve perto de inaugurar o marcador aos 19 minutos, Benzema recebeu do brasileiro e só não marcou porque Ter Stegen foi melhor (37′) e, no minuto seguinte, Vinícius atirou de primeira mas por cima depois de uma boa iniciativa de Casemiro. À ida para o intervalo, o ritmo estava lento e a favorecer o Real Madrid: afinal, os merengues haviam marcado fora na primeira mão e estavam em vantagem na eliminatória.

Na entrada para a segunda parte, nem Valverde nem Solari mexeram e o jogo parecia ter voltado praticamente igual, com um Real Madrid mais seguro e constantemente à procura de criar superioridades numéricas que pudessem abrir desequilíbrios. Os merengues estavam bem no jogo, assim como haviam estado na primeira mão em Camp Nou, e pareciam ter a eliminatória algo controlada. Mas o Barcelona, tal como mostrou no passado sábado frente ao Sevilha, vive atualmente de lances de génio de individualidades e não necessariamente de grandes exibições. Aos 50 minutos, sem muito fazer por isso e já depois de Benzema ficar perto do golo com um cabeceamento, os catalães chegaram à vantagem no jogo com um grande passe de Jordi Alba a lançar Dembélé no corredor esquerdo. O avançado cruzou rasteiro e atrasado e Suárez antecipou-se a Sergio Ramos para bater Navas de primeira: o uruguaio é já o jogador do Barcelona que mais golos marcou ao Real Madrid desde que ele próprio se estreou pelos catalães, 11 em 13 jogos.

De repente, o Barcelona estava apurado para a final da Taça do Rei e o Real Madrid precisava de marcar para empatar e marcar dois golos para voltar a ter vantagem. Com a necessidade dos merengues de estender o jogo e procurar baliza, a equipa blaugrana ameaçou explorar a falta de ligação entre os setores, com duas arrancadas de Dembélé e Messi, mas rapidamente percebeu que o melhor seria temporizar e colocar em prática um jogo de paciência que não soube materializar na primeira parte. O Real ficou perto do empate em três lances praticamente seguidos, primeiro com Vázquez a falhar o remate entre Lenglet e Alba (59′), depois com Ter Stegen a responder com uma defesa enorme a um cabeceamento de Reguilón depois de (mais) um bom lance individual de Vinícius (62′) e novamente com o brasileiro, que deixou Piqué pregado ao chão para então atirar ao lado (65′).

Mas o Real Madrid nunca marcou. E, mais uma vez, o Barcelona fez-se valer das individualidades para decidir. Aos 69 minutos, depois de um período mais ou menos longo em que os merengues jogaram no meio-campo catalão, Nélson Semedo desmarcou Dembélé no corredor direito e o francês cruzou para a área, onde Varane acabou por fazer autogolo quando tentava evitar que a bola chegasse a Suárez. Três minutos depois, com o Real completamente perdido, sem sequência nem consequência e a permitir espaços entre os setores ao Barcelona, Casemiro fez grande penalidade sobre Suárez e o próprio uruguaio converteu, à Panenka, levando o resultado para 0-3.

Os merengues entraram em vantagem, tiveram a eliminatória praticamente controlada mas falharam na reação eficaz ao primeiro golo sofrido e perderam o norte com o segundo. O Barcelona, que no sábado dependeu de Messi para vencer o Sevilha, valeu-se agora de Suárez para ganhar de forma inequívoca em casa do principal rival, apurar-se para a final da Taça do Rei (onde vai encontrar Betis ou Valencia) e fazer história, já que se tornou a primeira equipa de sempre a chegar a seis finais consecutivas. Longe do Campeonato, fora da Taça, ao Real Madrid resta agora aquilo que sempre sobra: a Liga dos Campeões.