Chama-se Yongbyon, fica a cerca de 100 quilómetros da capital norte-coreana de Pyongyang, e é considerada a maior instalação nuclear da Coreia do Norte, com capacidade de produção suficiente para construir cinco a sete bombas atómicas. Esta quinta-feira, Kim Jong-un ofereceu-a numa bandeja a Donald Trump, na cimeira entre os dois líderes. Mas aquilo que exigiu em troca — o levantamento total das sanções a que a Coreia do Norte está sujeita — foi um preço demasiado alto a pagar para o Presidente norte-americano, que recusou, levando assim ao fim abrupto da cimeira. Na decisão de Trump terá ainda pesado o facto de que os EUA suspeitam que Pyongyang tem outros locais secretos de produção de armamento nuclear.

Inaugurado em 1986, Yongbyon é um complexo composto por dezenas de edifícios com um reator com capacidade de cinco megwatts, um reator de termodinâmica experimental com capacidade de 100 megawatts e — ainda mais relevante — é uma das poucas instalações no país com capacidade para enriquecer urânio. Siegrid Hecker, investigador nuclear da Universidade de Stanford que visitou Yongbyon quatro vezes, estima que o complexo tenha capacidade para produzir material suficiente para fabricar cinco a sete bombas atómicas.

O encerramento de instalações como estas seriam, na opinião de Hecker “um grande, grande feito”. “Vejo Yongbyon bomo o coração do programa nuclear [da Coreia do Norte]”, resumiu o investigador ao Washington Post.

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Já em 1992 havia relatos na imprensa norte-americano do “misterioso local” que podia ser um sinal de que os norte-coreanos estavam a tentar tornar-se numa potência nuclear. Num artigo publicado no New York Times podia ler-se que o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atómica, Hans Blix, visitou o “extenso laboratório em Yongbyon”, que, segundo o jornal, representava “a prova mais firme de que a Coreia do Norte pode ter tentado construir uma bomba nuclear, ou talvez continue a tentar fazê-lo”.

Dois anos depois, e na sequência de negociações entre os governos norte-americano e norte-coreano, o reator principal de Yongbyong foi encerrado em 1994. Em 2003 voltaria a funcionar, na sequência do colapso das negociações entre os dois países. O processo repetir-se-ia alguns anos depois: encerrada em 2007, Yongyong voltou ao pleno funcionamento dois a três anos mais tarde, depois de inspetores internacionais terem sido banidos das instalações e de o regime ter investido no enriquecimento de urânio — um componente essencial para a produção de armamento nuclear.

O desmantelamento de Yongbyon atrasaria o programa nuclear da Coreia do Norte — mas não acabaria com ele

A possibilidade de Yongbyon voltar a ser encerrada, na sequência da aproximação de Kim Jong-un e Donald Trump, é uma hipótese que já tinha sido falada pelo regime norte-coreano. Numa das cimeiras entre as duas Coreias, em setembro de 2018, Kim terá proposto a “destruição permanente” de Yongbyon, mas apenas no caso de os Estados Unidos tomarem “ações correspondentes”. Agora, na véspera da cimeira de Hanói, o assunto voltou a ser abordado: Moon Chung-in, conselheiro do Presidente sul-coreano, disse à agência Bloomberg que o líder norte-coreano estava disponível para encerrar o complexo e permitir a entrada de inspetores internacionais no local.

Imagens de satélite recentes, analisadas pelo site especializado em assuntos da Coreia do Norte 38 North, mostram que o reator de produção de plutónio não parece estar operacional, mas que continua a haver “movimento de veículos e de pessoal à volta do reator”.

O encerramento deste complexo representaria uma machadada forte no programa nuclear norte-coreano, afirmou Hong Min, membro do Instituto da Coreia pela Unificação Nacional, ligado ao Governo sul-coreano, ao Korea Herald: “As capacidades nucleares da Coreia do Norte seriam continuamente reduzidas após o desmantelamento do complexo de Yongbyon, ao mesmo tempo que a produção adicional de plutónio que pode ser usada para uma bomba de hidrogéneo seria interrompida.”

Apesar de representar uma boa notícia para os que gostariam de ver a Coreia do Norte desnuclearizada, a verdade é que a destruição de Yongbyon, embora seja significativa, não representaria o fim do programa nuclear do país.

A instalação onde se enriquece urânio desde 2010 exige uma experiência operacional de alto desempenho. A Coreia do Norte pode ter um local escondido onde acumula experiência”, alertou Ahn Jin-soo, investigador nuclear, ao mesmo jornal.

Jeffrey Lewis, investigador do Instituto Middlebury de Estudos Internacionais, resumiu assim a situação: os serviços secretos norte-americanos creem que há pelo menos mais duas centrais de enriquecimento de urânio no país (uma em Kangson, a outra num local não identificado) e, portanto, o encerramento de Yongbyon “pode ‘atrasar’ o crescimento do inventário de matéria físsil, mas não ‘acaba’ com ele”. Talvez por isso, Donald Trump tenha decidido que não valia a pena ceder e aceitar a proposta de Kim Jong-un.