Os pais de quatro crianças (e uma quinta criança traficada pelo grupo criminoso) que foram obrigadas a mendigar e a roubar na rua foram condenados esta sexta-feira a nove anos de prisão efetiva, pelo Tribunal de São João Novo, no Porto, confirmou o Observador junto de fonte ligada ao processo. Um terceiro elemento do grupo, namorado de umas das menores — que também explorava a própria companheira e os irmãos –, foi também condenado a cinco anos e nove meses de prisão efetiva.

Quando se quer pedir, pede-se, não se engana. E sobretudo não se explora menores”, disse o juiz presidente Pedro Brito, durante a leitura do acórdão, citado pela agência Lusa.

Todos os arguidos, que se encontravam em prisão preventiva, estavam acusados, cada um, de um crime de tráfico, quatro de maus tratos, quatro de utilização de menores na mendicidade e um de associação criminosa. Mas o tribunal deixou cair algumas das acusações.

Desde logo, foram todos absolvidos do crime de associação criminosa. Além disso, o casal foi absolvido de um crime de maus tratos — sendo condenados por apenas três — e absolvidos dos quatro crimes de utilização de menores na mendicidade. Isto significa que os juízes consideraram que os pais não obrigavam os filhos a mendigar. O genro do casal foi absolvido dos três crimes de maus tratos de que estava também acusado e de um crime de utilização de menores na mendicidade, sendo que estava acusado de quatro.

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O que é punido aqui não é a mendicidade em si. É a utilização de menores nessa atividade para proveito próprio, enganando as pessoas”, referiu ainda Pedro Brito.

Uma parte do dinheiro angariado pelo grupo explorador, mais de 85 mil euros, foi declarada perdida a favor do Estado, bem como telemóveis e outros objetos que os menores foram obrigados a roubar. Durante os seis anos em que exploraram os menores, o grupo conseguiu arrecadar mais de 170 mil euros. Não só através dos peditórios, mas também através dos objetos furtados que eram enviados em caixas para a Roménia, de onde eram todos naturais, e de apoios sociais que foram conseguindo.

Defesa acha pena “bastante exagerada” e vai recorrer da decisão

A defesa já anunciou que vai recorrer da decisão. Em declarações à CMTV à saída do tribunal, o advogado do casal, Carlos Macanjo, considerou que “esta pena peca por exagero” e, por isso, vai “analisar o acórdão e depois de o analisar interpôr o competente recurso”. O advogado adiantou ainda que os arguidos foram apanhados ” de surpresa” e ficaram indignados com a pena atribuída.

Vamos recorrer. Esta pena peca por exagero e obviamente que vamos analisar o acórdão e depois de o analisar interpôr o competente recurso”, anunciou o advogado.

A advogada do terceiro elemento  — genro do casal — do grupo explorador também anunciou que vai recorrer da decisão. “Achei a pena bastante exagerada. Apesar de terem sido todos absolvidos do crime de associação criminosa, entendo que a pensa foi bastante pesada”, disse em declarações à TVI24.

Ninguém sabe das crianças. Menores foram institucionalizados mas fugiram

As crianças estão, porém, em parte incerta. Depois de realizadas as buscas a cargo do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que investigou o caso os menores foram sinalizados e institucionalizados no próprio dia da operação, por decisão do Tribunal de Família e Menores do Porto.

Mas as vítimas abandonaram as instituições — uma delas, a menor que tinha sido traficada, que se encontrava grávida, fugiu no dia em que tinha chegado. Embora dois dos filhos e a menor traficada sejam maiores de idade, os restantes dois são menores: um tem 16 anos e outro tem 13.

Mesmo após a detenção do grupo criminoso, o SEF colaborou com o Tribunal de Família e Menores do Porto e Diretoria do Norte da Polícia Judiciária para eventualmente apurar o seu paradeiro. Foram difundidos pelo Sistema de Informação Schengen vários pedidos de localização judicial dos menores desaparecidos, por determinação do Tribunal de Família e Menores, apurou o Observador junto de fonte ligada ao processo.

Seis anos a explorar os filhos e uma menor traficada

De acordo com a investigação, levada a cabo por 20 inspetores do SEF, o grupo explorador iniciou a sua atividade em 2011. Os menores pediram dinheiro na rua e furtaram vários objetos durante seis anos, de norte a sul do país: em, pelo menos, 26 cidades. Quando iniciaram a atividade em Portugal, as crianças tinham idades entre os cinco e os 11 anos. 

Os três agora condenados decidiram, em 2016, “alargar a sua rede de menores explorados”, traficando uma menor como a qual não tinham qualquer grau de parentesco, para os mesmos tipos de exploração. Então com 14 anos e também de nacionalidade romena, a jovem foi “cedida pela sua mãe aos arguidos”, refere a acusação do Ministério Público a que o Observador teve acesso.

Depois de tantas sinalizações da PSP e da GNR já acumuladas, em novembro de 2017, foram feitas buscas à casa do grupo criminoso. Nas buscas, foram apreendidos vários documentos que permitiram confirmar as suspeitas de como o grupo atuava. Os pais e o genro foram detidos e ficaram em prisão preventiva, desde então. As vítimas foram institucionalizadas, sendo que a menor que tinha sido traficada, que se encontrava grávida, fugiu da instituição no próprio dia.