A União Europeia está disponível para ‘acomodar’ na Declaração Política as opções alternativas votadas pelo parlamento britânico, que precisa, contudo, de ratificar o acordo de saída para evitar um Brexit desordenado, assumiu esta terça-feira o negociador-chefe comunitário, Michel Barnier.

Intervindo num pequeno almoço organizado pelo ‘think tank’ European Policy Centre em Bruxelas, dedicado ao ponto de situação do Brexit e sugestivamente batizado ‘Deal or no deal?’, Michel Barnier começou por confessar que esteve acordado até altas horas, para acompanhar a votação na Câmara dos Comuns, antes de reiterar que se o Reino Unido “ainda quiser sair da União Europeia de uma forma ordenada” o acordo de saída negociado entre Bruxelas e Londres “é e será a única forma possível”.

Ontem [segunda-feira] houve votos indicativos na Câmara dos Comuns e presumo que o debate vá continuar. O parlamento rejeitou consistentemente sair da UE sem acordo. Mas a única forma de evitar um ‘no deal’ é através de uma maioria positiva”, insistiu.

Dado que, uma vez mais, o parlamento britânico não chegou a um consenso na noite de segunda-feira sobre o caminho a seguir a curto/médio prazo, rejeitando as quatros opções votadas, o principal negociador da UE para o Brexit traçou três possíveis cenários na contagem decrescente para o Conselho Europeu de 10 de abril, não excluindo mesmo uma perspetiva mais otimista, a da possibilidade de “um voto significativo [do acordo de saída] bem-sucedido nos próximos dias”.

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Mas fez questão de sublinhar que sem acordo não haverá um período de transição: “Não há acordo, não há transição”.

A “verdade nua e crua” é que o Parlamento britânico continua sem se entender

“Do nosso lado, estamos abertos a uma união aduaneira, e um modelo ‘Noruega +’. A Declaração Política pode acomodar todas essas opções. Se o Reino Unido assim o desejar estamos preparados para trabalhar a Declaração Política”, declarou, insistindo, todavia, que tal implicaria sempre a ratificação do Acordo de Saída.

Os deputados britânicos rejeitaram na noite de segunda-feira as quatro opções alternativas votadas, nomeadamente o estabelecimento de uma união aduaneira com a União Europeia (UE), por 276 votos contra e 273 a favor (uma diferença de apenas três votos) e o modelo ‘Noruega +‘, também conhecido como ‘Mercado Comum 2.0’, que previa a manutenção do Reino Unido no mercado único – o que seria sinónimo de liberdade de circulação de bens, capitais, serviços e pessoas, como na Noruega -, mas a isso acrescentando a exigência de uma política aduaneira e comercial comum.

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Se a Câmara dos Comuns não votar a favor do texto acordado há quatro meses entre Bruxelas e Londres nos próximos dias, há então, na opinião do principal negociador da União Europeia para o Brexit, duas opções: o Reino Unido sair sem acordo ou pedir uma extensão mais longa.

“Será responsabilidade do Governo britânico escolher entre estas duas opções. O ‘no deal’ nunca foi o nosso desejo, mas a UE a 27 está preparada. Dia após dia, esse cenário é mais provável”, admitiu.

No entanto, caso Theresa May solicite uma extensão longa, “uma justificação forte será necessária” para convencer os 27, nomeadamente um desenvolvimento político, seja ele “eleições ou um referendo”, já que os custos dessa opção para o bloco comunitário são muito elevados.

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“Muitas empresas na UE avisaram-nos sobre o custo de adiar o Brexit. Haverá também um custo político: o Reino Unido terá de organizar eleições europeias, nomear o seu representante na Comissão Europeia. Em suma, uma longa extensão pode apresentar riscos ao nosso processo de tomada de decisão”, elucidou.

Revogar o Artigo 50.º do Tratado de Lisboa não é, para o político francês, uma opção, dado que esta possibilidade foi reiteradamente rejeitada pelos parlamentares britânicos.

“Geralmente, sou contra especular. Sou o negociador da UE e por este momento estou a trabalhar com o governo britânico com a premissa de que vão sair”, pontuou.

O negociador comunitário rejeitou ainda as acusações de arrogância europeia, mencionadas pelos jornalistas britânicos presentes na sala, vincando que a negociação da saída do Reino Unido da UE não é “uma negociação normal”. “É um divórcio”, recordou, já depois de ter lembrado que não lhe cabe a si defender as mais-valias do Acordo de Saída, negociado pela primeira-ministra Theresa May, diante dos britânicos.

“Jean-Claude Juncker disse ontem [segunda-feira] que a paciência da UE está no limite. Eu, como negociador da UE, digo que ainda me resta alguma paciência”, garantiu.