O Presidente afegão, Ashraf Ghani, pediu nesta terça-feira “esclarecimentos” aos Estados Unidos depois de o seu homólogo norte-americano, Donald Trump, dizer que facilmente venceria a guerra no Afeganistão, mas não queria “matar 10 milhões de pessoas”.

“O Governo da República Islâmica do Afeganistão quer esclarecimentos sobre as declarações do Presidente dos Estados Unidos”, referiu o gabinete do Presidente Ghani num comunicado.

O Presidente norte-americano fez estas declarações na Casa Branca na segunda-feira, durante a receção ao primeiro-ministro paquistanês, Imran Khan.

“Podia ganhar guerra do Afeganistão numa semana. O país desaparecia em 10 dias”, garante Trump

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Num período em que têm decorrido conversações entre Washington e representantes dos talibãs afegãos na perspetiva de um acordo de paz, Trump afirmou em paralelo que podia vencer a guerra no Afeganistão “numa semana”, mas acrescentou que não pretende seguir “por esse caminho” porque implicaria matar “dez milhões de pessoas”.

“Poderia ganhar essa guerra numa semana, mas não quero matar dez milhões de pessoas”, afirmou perante os jornalistas e após receber Imran Khan.

“O Afeganistão poderia ser apagado da face da Terra. Não quero ir por esse caminho”, acrescentou o chefe de Estado norte-americano, e que terá solicitado a Khan que pressione os talibãs a assinarem um cessar-fogo permanente no Afeganistão.

Os comentários de Donald Trump provocaram revolta e indignação no país.

Traumatizado por décadas de conflito, os afegãos estão preocupados com uma retirada precipitada das forças dos Estados Unidos e temem que isso provoque o retorno ao poder dos talibãs, que controlam ou exercem influência em quase metade do país, ou até uma nova guerra civil.

Cabul e Washington, no entanto, há tempos culpam o Paquistão por alimentar o conflito afegão ao apoiar os talibãs. Em janeiro de 2018, o próprio Donald Trump acusou Islamabad de “abrigar os terroristas” que estavam no Afeganistão.

A influência do Paquistão sobre os insurgentes — expulsos do poder afegão em 2001 por uma coligação internacional liderada pelos Estados Unidos — é, no entanto, vista como um elemento essencial para acabar com a presença norte-americana de quase 18 anos no Afeganistão.

“Se o governo afegão apoia os esforços dos EUA para garantir a paz no Afeganistão, o governo também enfatiza que os chefes de Estado estrangeiros não podem determinar o destino do Afeganistão na ausência de líderes afegãos”, afirmou o gabinete de Ghani.

O Presidente afegão mostra-se regularmente irritado por ser mantido praticamente de fora das negociações de paz que ocorrem há cerca de um ano dos Estados Unidos com os talibãs.

Muitos afegãos também reagiram fortemente nas redes sociais aos comentários de Donald Trump.

“Sinto-me chocado, ameaçado e humilhado. Nós confiamos nos norte-americanos (…) e agora o Presidente Trump está a ameaçar-nos com o genocídio!”, escreveu um afegão na rede social Facebook.

O enviado norte-americano para a paz no Afeganistão, Zalmay Khalilzad, chegou nesta terça-feira a Cabul.

Khalilzad deve acompanhar a oitava ronda de negociações com os talibãs, marcada para os próximos dias em Doha, novamente na ausência do Governo afegão.

No final de junho, o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, disse que esperava um acordo de paz com os talibãs “antes de 1 de setembro”.