Uma educadora de infância numa escola pública da Madeira viu a sua avaliação anual ser prejudicada por se ter recusado a ir receber o bispo Nuno Brás da Silva Martins à igreja, noticiou o Diário de Notícias. Isabel Teixeira, educadora no pré-escolar há 30 anos na Madeira e há 16 no jardim de infância da Escola EB1 PE de Ponta Delgada e Boaventura, já se tinha recusado anteriormente a participar em atividades religiosas, mas diz nunca ter sido penalizada por isso.
O encontro com o bispo foi sugerido pelo padre da paróquia e apresentado aos professores pela diretora da escola, Ana Cristina Abreu. Isabel Teixeira recusou participar na atividade, em que os alunos estiveram presentes, como antes já tinha recusado levar as crianças à missa, porque entende que não se deve misturar a escola com a religião. “Isso não faz parte do meu trabalho com as crianças e não estava no plano anual de atividades”, disse ao DN.
A diretora, no entanto, não o entende assim. Na avaliação anual frisou que a professora não tinha tido uma prestação muito boa no que diz respeito ao envolvimento com os projetos e atividades da escola.
“A docente de facto participou nos diferentes projetos propostos no Plano Anual de Atividades, mas recusou-se a participar em algumas atividades, [sic] propostas pela diretora/parceiros e aprovadas por maioria em conselho escolar. Exemplificando: saída do Pão por Deus à Câmara, desfile de Carnaval, receção ao Sr. Bispo no adro da igreja”, especifica a diretora.
Isabel Teixeira foi apanhada de surpresa com as justificações apresentadas pela diretora para não lhe dar o “muito bom” que necessita para subir para o sétimo escalão da carreira em 2020. Ao DN explica que foi ao Pão por Deus durante o seu turno (manhã), mas que a visita à Câmara só aconteceria da parte da tarde e confirma que não participou no desfile de Carnaval porque é feito ao domingo e ao domingo não trabalha.
A diretora da escola, Ana Cristina Abreu, recusou responder às perguntas do DN.
Misturar a escola e o Estado com a religião é um erro, diz Eduardo Vera Jardim, presidente da Comissão de Liberdade Religiosa, que, no entanto, entende que “há hábitos que levam tempo a perder”. O que não pode acontecer é que uma pessoa seja penalizada por se recusar a participar numa atividade religiosa.
“Esse parâmetro não deve contar para a avaliação – é inconstitucional que conte. A Constituição é clara, ninguém pode ser prejudicado ou beneficiado por causa da religião, por uma opção religiosa ou por se opor a uma coisa dessas”, diz Eduardo Vera Jardim.
Outro questão são as crianças e os pais que se veem confrontados com este tipo de atividades. Isabel Teixeira diz que muitas vezes os pais dizem que sim para não parecer mal e Eduardo Vera Jardim confirma que esse é um tipo de pressão que se pode fazer sentir nos meios mais pequenos e mais religiosos.
Num país com liberdade religiosa como Portugal, ninguém deve ser obrigado a ter uma religião nem a ter um ensino religioso, assim como também ninguém deve ser obrigado a partilhar a forma como encara a religião ou que religião professa, diz um acórdão do Tribunal Constitucional citado pelo DN, sobre um outro caso ocorrido na Madeira.