O interrogatório de José Sócrates já terminou. À saída, pelas 19h15, o ex-primeiro-ministro disse que não ia “fazer comentários sobre o que se passou no tribunal” mas garante estar “muito satisfeito pela forma como as coisas estão a correr“. Um comentário que, aliás, é igual ao que já tinha feito na segunda-feira à saída da primeira audição. “As vossas fontes estão muito desorientadas”, vincou ainda, naquilo que foi também a repetição de um comentário que já tinha proferido a entrada para o tribunal.

No interrogatório desta terça-feira, segundo apurou o Observador, Jose Sócrates foi questionado sobre a relação com o empresário luso-angolano Hélder Bataglia, fundador da ESCOM, assim como também teve de responder a perguntas sobre a ligação que tinha com Joaquim Barroca, ex-administrador do grupo Lena. O ex-primeiro-ministro terá dito que não conhecia Barroca, segundo disse aos jornalistas Castanheira Neves, advogado do empresário.

José Sócrates à saída do Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa. (JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR)

As perguntas focaram ainda o momento em que conheceu Carlos Santos Silva e a relação que com ele estabeleceu desde esse momento. O interrogatório desta tarde teve assim um foco especial na rede de contactos do ex-primeiro-ministro que disse ainda não conhecer sequer o nome do filho de José Lello. Num interrogatório que demorou mais de cinco horas, José Sócrates foi ainda auscultado sobre as vindas de Lula da Silva a Portugal.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Ainda de acordo com informação recolhida pelo Observador, um dos temas quentes do interrogatório foi o negócio de Vale do Lobo. O ex-primeiro-ministro disse que só lá foi “uma vez jantar e nada mais”. Respondeu ainda a perguntas sobre a nomeação de Armando Vara para a Caixa Geral de Depósitos. Sócrates disse que não foi um pedido seu mas antes uma insistência de Teixeira dos Santos, ex-ministro das Finanças, chegando a afirmar que estava relutante quanto à nomeação de Armando Vara.

“As fontes que vocês têm estão um pouco desorientadas”

Na segunda-feira, José Sócrates saiu, já depois de ser noite, cansado mas sorridente, ao fim de cinco horas de interrogatório — “Olhe para a minha cara: acha que estou satisfeito?”, atirou aos jornalistas, à saída do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), em Lisboa. Menos de 24 horas depois de ter entrado e praticamente cinco anos depois de ter sido detido no aeroporto da Portela, quando regressava de Paris, onde morava na altura, José Sócrates está de regresso ao edifício da antiga sede da Polícia Judiciária para o segundo dia de interrogatório no âmbito da fase de instrução do processo Operação Marquês. “Estou muito bem disposto”, garantiu aos jornalistas, logo depois de ironicamente questionar o que foi escrito sobre o interrogatório de segunda-feira: “Li as primeiras páginas dos jornais e fico com a sensação de que as fontes habituais que vocês têm estão um pouco, como dizer, desorientadas”.

Chegada de José Sócrates ao Tribunal Central de Instrução Criminal. (JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR)

Será o segundo dos quatro dias consecutivos reservados pelo juiz Ivo Rosa para a inquirição do ex-primeiro-ministro, que chegou a estar detido preventivamente na cadeia de Évora durante 10 meses, e está acusado de 31 crimes — 3 de corrupção passiva de titular de cargo político, 16 de branqueamento de capitais, 9 de falsificação de documentos e 3 de fraude fiscal qualificada.

Depois de esta segunda-feira José Sócrates ter respondido essencialmente sobre o caso da Portugal Telecom (PT) e o alegado favorecimento que terá concedido ao Grupo Espírito Santo (GES) para manter o controlo da operadora nas mãos da família Espírito Santo — não só negou tudo como chamou “mente delirante” a José Maria Ricciardi; acusou o governo de Passos Coelho de, ao acabar com a golden share, ter sido o responsável pela captura da PT pelo GES; e ainda insinuou uma pretensa promiscuidade entre António Costa e o grupo liderado por Ricardo Salgado — esta terça-feira as perguntas do juiz de instrução deverão versar outros pontos da acusação do Ministério Público. A saber: o alegado favorecimento a um grupo de investidores liderados por Diogo Gaspar Ferreira e Rui Horta e Costa na aprovação do financiamento da Caixa Geral de Depósitos superior a 256 milhões de euros e o alegado favorecimento do Grupo Lena pela adjudicação da 1.ª fase da linha de alta velocidade entre o Poceirão e Caia ao consórcio Elos — do qual o grupo de Leiria fazia parte.

Operação Marquês. Os cinco pontos essenciais da acusação contra Sócrates

(JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR)

O processo Operação Marquês envolve 28 arguidos — 19 pessoas e nove empresas. José Sócrates é o penúltimo arguido a ser interrogado nesta fase, que arrancou em janeiro deste ano, deverá estar terminada um ano depois e é facultativa, servindo para Ivo Rosa determinar se o caso do Ministério Público deve ou não seguir para julgamento. Carlos Santos Silva, empresário e amigo do ex-primeiro-ministro deverá ser o último a responder às perguntas do juiz de instrução, no próximo dia 27 de novembro.