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O que já se sabe da queda do Boeing no Irão

Este artigo tem mais de 4 anos

Pouco depois de levantar voo de Teerão, o Boeing 737 das linhas aéreas ucranianas caiu matando 176 pessoas. O que se passou? Que "erro humano" esteve na causa do acidente?

Membros do Crescente Vermelho Internacional recolhem corpos de vítimas no meio dos destroços, depois da queda do Boeing 737-800 da Ukraine International Airlines
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Membros do Crescente Vermelho Internacional recolhem corpos de vítimas no meio dos destroços, depois da queda do Boeing 737-800 da Ukraine International Airlines

ABEDIN TAHERKENAREH/EPA

Membros do Crescente Vermelho Internacional recolhem corpos de vítimas no meio dos destroços, depois da queda do Boeing 737-800 da Ukraine International Airlines

ABEDIN TAHERKENAREH/EPA

A queda, no Irão, de um avião Boeing 737-800 da Ukrainian International Airlines (UIA) que se dirigia para Kiev (Ucrânia), provocou a morte de todas as pessoas que estavam a bordo: 83 iranianos, 57 canadianos, 11 ucranianos, dez suecos, quatro afegãos, três alemães e três britânicos. A queda do avião aconteceu num momento de especial tensão entre Estados Unidos e Irão, após os EUA terem abatido o general iraniano Qasem Soleimani e o Irão ter respondido com um ataque às bases militares dos EUA no Iraque.

Se os iranianos foram rápidos a negar que tivessem abatido o avião Ukrainian International Airlines (UIA) — um primeiro relatório da autoridade de aviação civil do país demorou menos de 24h a ser produzido e ilibava os iranianos de responsabilidades —, as potências ocidentais foram quase unânimes na convicção de que o avião caiu após ter sido atingido por um míssil iraniano, possivelmente disparado por lapso.

Depois de Justin Trudeau, primeiro-ministro canadiano, ter garantido na quinta-feira que existem provas de o aparelho ter sido atingido por um míssil iraniano disparado a partir de terra — as provas “assim o indicam” — um comunicado este sábado divulgado pela televisão estatal iraniana viria a pôr um ponto final às dúvidas e a revelar que o avião foi abatido inadvertidamente por militares iranianos. Hassan Rouhani, presidente do Irão, pediu desculpas via Twitter por este “erro imperdoável”.

Eis o que já se sabia sobre o acidente e o que se ficou a saber este sábado.

Irão admite ter abatido por engano avião ucraniano

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Afinal, o que aconteceu?

Este sábado, as dúvidas dissiparam-se com o Irão a admitir que o avião ucraniano foi abatido inadvertidamente por militares iranianos. O presidente do Irão, Hassan Rouhani, pediu desculpas via Twitter por esta “grande tragédia e o erro imperdoável”, lamentando “profundamente”.

A declaração, difundida pela televisão estatal iraniana, atribuiu o derrube do aparelho a um erro humano. Já o ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Mohammad Javad Zarif, tentou atirar as culpas aos Estados Unidos. No Twitter disse que o desastre foi “causado pelo aventureirismo dos EUA”. Segundo o responsável, os Estados Unidos estavam a preparar-se para ataques aéreos em vários locais e alvos do Irão, “e isso levou a uma postura de defesa ainda mais sensível por nossas unidades antiaéreas”.

Segundo o The New York Times, as forças armadas iranianas explicaram que o avião ucraniano “adotou a postura de voo e a altitude de um alvo inimigo” ao aproximar-se de uma base do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica. E foi “nessas circunstâncias” que “foi atacado”.

Segundo o general responsável pela divisão aeroespacial, Gen Amir Ali Hajizadeh, o operador que disparou o míssil que atingiu o avião não obteve uma ordem oficial para o fazer devido a “interferências” nas telecomunicações. O soldado confundiu o Boeing com um “míssil de cruzeiro” e teve “apenas 10 segundos” para reagir, revelou o general. “O míssil de curto alcance explodiu perto do avião. É por isso que o avião foi capaz de continuar a voar um pouco mais. Explodiu quanto atingiu o solo”.

O general reconheceu a culpa em nome da unidade aeroespacial e disse mesmo que “preferia morrer a testemunhar este acidente”.

As autoridades iranianas já garantiram que as responsabilidades estão a ser apuradas e que o caso vai ser rapidamente levado à justiça militar.

A que horas levantou o voo, de onde partiu e para onde ia?

O voo 752 da transportadora aérea ucraniana Ukrainian International Airlines (UIA) levantou voo da pista do aeroporto internacional Tehran Imam Khomeini, em Teerão (Irão) às 6h12 (hora de Teerão, mais 3h30 do que em Lisboa). Quatro minutos depois de ter levantado voo, perderam-se as comunicações.

O avião dirigia-se para Kiev (Ucrânia), onde deveria ter chegado 3h42 minutos depois.

O que disse o relatório inicial sobre a causa da queda do avião?

Qassem Biniaz, porta-voz do Ministério dos Transportes do Irão, disse à agência de notícias estatal IRNA que as autoridades iranianas acreditavam que um dos motores do avião se tinha incendiado após a descolagem e, por causa disso, o piloto perdeu o controle da aeronave.

A Organização de Aviação Civil do Irão citava diversas testemunhas que estavam no solo, bem como membros de tripulações de outros voos, para garantir que um incêndio foi observado no aparelho e a explosão subsequente ocorreu devido à colisão com o solo.

Presidente da Ucrânia decreta luto nacional pelos 176 mortos na queda de avião no Irão

A Organização da Aviação Civil do Irão indicou que o avião se dirigia inicialmente para oeste e, “depois de ocorrer o problema, virou à direita e tentou retornar ao aeroporto internacional Imã Khomeini, em Teerão, quando se despenhou”.

Onde estão as caixas negras?

Em relação às caixas negras, os representantes da Organização da Aviação Civil do Irão começaram por assegurar — mantendo a tese — que foram “danificadas” pelo acidente e pelo incêndio no avião, recusando-se também até à data a entregá-las à Boeing e aos EUA e negando terem sido destruídas provas que ajudariam a apurar as causas do que aconteceu.

Esta sexta-feira, o chefe da principal organização de aviação civil do Irão, Ali Abedzade, indicou que as autoridades do país preferiam ser elas a fazer o “download” das caixas negras do avião. “Mas se virmos que não conseguimos fazê-lo por as caixas estarem danificadas, então procuraremos ajuda”, referiu ainda, citado pela agência Reuters. O acesso às caixas negras foi entretanto cedido à Ucrânia.

A nossa equipa já teve acesso às caixas negras. Todas as informações vão agora ser analisadas”,  disse o ministro Vadym Prystaïko em conferência de imprensa, citado pela agência Lusa.

Já um porta-voz do governo iraniano, Ali Rabiei, apontou: “Todos os países que tinham cidadãos a bordo do avião podem enviar representantes seus e instamos também a Boeing a enviar os seus representantes [para Teerão] para se juntarem ao processo de investigação às caixas negras”. A investigação, disse, poderia demorar, já que os iranianos apontaram como “um a dois meses” o prazo para “extrair informação de gravações de voz e dados do voo” e como “um ou ou dois anos” o tempo que poderá demorar a concluir a investigação.

Os líderes do Irão sabiam da real causa do acidente?

O presidente do Irão, Hassan Rouhani, e o líder supremo do país, Ayatollah Ali Khamenei, souberam da verdadeira causa do acidente na sexta-feira, segundo a Fars News Agency. Depois de ter sido informado, o líder supremo ordenou a organização de uma reunião urgente do Conselho Nacional de Segurança.

Pouco depois da reunião, exigiu que os resultados fossem tornados públicos o mais rapidamente possível. Ficou assim decidido que seriam as forças armadas iranianas e o presidente, Hassan Rouhani, a divulgarem comunicados com a informação de que o avião foi abatido inadvertidamente por militares iranianos.

Quem investigou o caso?

O Irão liderou as investigação, apesar do convite dirigido à empresa norte-americana Boeing e a representantes dos países que tiveram cidadãos seus entre as vítimas para “participar”. A Ucrânia também colaborou mais estreitamente com as autoridades iranianas nas investigações, dado que o avião abatido era um Boeing 737-800 da Ukrainian International Airlines (UIA).

Na quinta-feira, durante a conferência de imprensa do primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau, o governante frisou ser “extremamente importante que a investigação seja credível e minuciosa”. Trudeau mostrou-se disponível para conversar com “qualquer pessoa para conseguir respostas” sobre o que se passou em Teerão.

Já o líder da NATO, Jens Stoltenberg, alertou esta sexta-feira para a importância de que se apurem “todos os factos” e pediu ao Irão para “participar e contribuir por inteiro para uma investigação transparente e minuciosa”. “É exatamente por isso que precisamos de ter cooperação total do lado iraniano”, reforçou.

O Canadá, que não tem representação diplomática no Irão, começou por pedir apoio à Itália. O ministro das Relações Internacionais de Itália, Luigi Di Maio, prometeu “toda assistência e apoio” ao Canadá e ao seu pedido para proteger os interesses canadianos e “facilitar as atividades de assistência consular”, avançou a AFP.

Esta sexta-feira, os meios de comunicação estatais iranianos avançaram que estava confirmado que representantes do Canadá, EUA e França iriam viajar para Teerão para participarem em reuniões da investigação à queda do avião. A informação foi dada pela Reuters, que lembra que nem EUA nem Canadá têm relações diplomáticas com os homólogos iranianos.

A disponibilidade do Irão para colaborar parece contudo confirmada, já que a Transportation Safety Board of Canada — principal autoridade de aviação civil do Canadá —avançou estar a tratar de detalhes para preparar a visita ao local da queda do avião, “depois de um convite” iraniano. Também a U. S. National Transportation Safety Board (NTSB) — ou seja, a entidade homóloga dos EUA — afirmou ter escolhido já um representante para se juntar à investigação.

Já a agência francesa BEA, especializada em acidentes aéreos — e que após a última queda de um avião da Boeing na Etiópia, ajudou os investidores a analisarem dados — avançou que se iria envolver na investigação.

O presidente francês Emmanuel Macron já prometeu ao presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, ajuda de especialistas franceses para descodificar as caixas negras. Macron disse ainda  que os procedimentos para uma investigação internacional já começaram e que visitará Kiev, a capital ucraniana.

Que imagens são conhecidas do que aconteceu?

Na quinta-feira o norte-americano The New York Times revelou um vídeo que, de acordo com o jornal, mostra o que parece ser o avião a ser abatido por um míssil.

O jornal norte-americano diz que analisou elementos sonoros e visuais presentes nesse mesmo vídeo e concluiu que estão de acordo com imagens de satélite, enviadas pela Maxar Technologies, uma empresa de tecnologia aeroespacial, e com informações relativas ao trajeto do Boeing 737-800 da companhia aérea ucraniana, onde seguiam 176 pessoas.

Como conta o Libération, os serviços de inteligência norte-americana detetaram a ativação de um radar e o disparo de dois mísseis terra-ar através de satélites de vigilância. O míssil utilizado terá sido um Tor-M1, de fabricação russa. A tese ganhou mais força com as declarações do primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau.

De acordo com o The New York Times, os cerca de 10 segundos que passam entre o flash que se vê no vídeo — e que se acredita ser o míssil — e o som da explosão permitiu calcular a distância entre o avião e a câmara que filmou o momento em que este é atingido pelo míssil. Esta distância, de pouco mais de três quilómetros, está alinhada com o trajeto do avião registada pela FlightRadar24, uma empresa que permite acompanhar os vários aviões no ar em todo o mundo.

New York Times explica como verificou a veracidade do vídeo do avião abatido no Irão

Pouco tempo depois de o primeiro-ministro canadiano ter avançado que as autoridades tinham provas de que o avião foi atingido por um míssil terra-ar iraniano, foi divulgado o vídeo pelo The New York Times. Justin Trudeau levantou, contudo, a hipótese de tudo se ter tratado de um acidente.

Ao todo, surgiram até agora dois alegados vídeos de câmaras amadoras que filmaram o momento em que supostamente um míssil atinge o avião.

Que hipóteses estiveram em cima da mesa?

Foram, sobretudo, colocadas duas hipóteses em cima da mesa — a de falha técnica, como inicialmente avançado pelas autoridades iranianas — e a de que um míssil teria atingido o avião, como se veio a confirmar.

Chegou a questionar-se que seria possível que o problema fosse, efetivamente, da aeronave, um Boeing 737-800. Este aparelho é diferente do Boeing 737 Max, o modelo envolvido nos dois acidentes em 2018 e 2019 que mancharam a reputação da empresa norte-americana e que estão proibidos de voar.

“Não punha a minha família num [Boeing 737] Max”, diziam funcionários

No Twitter, a Boeing disse estar “disponível para ajudar no que for preciso”.

As suspeitas de que teria sido um míssil a abater o avião começaram a ser lançadas por Justin Trudeau, presidente do Canadá, e Donald Trump, presidente do EUA.

Em conferência de imprensa, Justin Trudeau afirmou: “Temos informações de múltiplas fontes, nomeadamente dos nossos aliados e dos nossos serviços, que indicam que o avião foi abatido por um míssil terra-ar iraniano. Pode não ter sido intencional”, declarou o primeiro-ministro canadiano, que sempre se mostrou contra o ataque aéreo dos Estados Unidos da América, que culminou na morte do general Qasem Suleimaini.

Questionado pelos jornalistas sobre se considerava que o ataque ao general iraniano tinha sido a causa da queda do Boeing 737-800, Trudeau afirmou que era “demasiado cedo para tirar conclusões ou para atribuir culpas ou responsabilidades em qualquer proporção”. “As provas sugerem que é a causa provável, mas precisamos de uma investigação completa e credível para estabelecer exatamente o que aconteceu. É isto que estamos a pedir e é isto que esperamos que aconteça”, disse o líder canadiano.

Num discurso ao país na quinta-feira, o presidente dos EUA, Donald Trump, não deu relevância à explicação inicial do Irão de que um erro mecânico causou o acidente. Contudo, também não culpou diretamente o Irão pelo acidente.

“Estava a voar numa zona bastante difícil, e alguém pode ter cometido um erro”, disse Trump. “Algumas pessoas dizem que era mecânico. Pessoalmente, não acho que isso seja uma pergunta”, afirmou.

Na mesma madrugada, o Irão lançou dezenas de mísseis às bases norte-americana de Al-Asad e Erbil, no Iraque. Esperou-se nessa madrugada um escalar do conflito Irão-EUA, mas tal não aconteceu não havendo retaliação militar dos norte-americanos até à data.

https://observador.pt/2020/01/07/irao-lanca-misseis-a-bases-dos-eua-no-iraque/?utm_source=testedefinitivo1&utm_medium=testedefinitivo2&utm_campaign=testedefinitivo3&utm_term=testedefinitivo4&utm_content=testedefinitivo5

As autoridades iranianas rejeitaram a tese apresentada por Trudeau e Trump. Na opinião dos iranianos, a hipótese não fazia sentido. “Vários voos domésticos e internacionais voam ao mesmo tempo no mesmo espaço aéreo iraniano à mesma altitude de oito mil pés, e essa história de ataque com mísseis (…) não podia estar mais incorreta”, declararam o presidente da Organização de Aviação Civil do Irão e o vice-ministro dos Transportes em comunicado. “Esses rumores não fazem qualquer sentido”.

Na sexta-feira de manhã, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, determinado a descobrir “toda a verdade”, pedia cautela, aguardando dados confirmando a tese do disparo de mísseis. “Reunimo-nos com representantes americanos e recebemos dados importantes que serão processados ​​pelos nossos especialistas”, escreveu o ministro das Relações Internacionais da Ucrânia, Vadym Prystaïko, no Twitter, sem dar mais detalhes.

A agência Reuters avançava, contudo, a garantia de um “representante dos EUA” (não nomeado) de que os norte-americanos têm um “grau de certeza elevado” de que o avião foi abatido por “mísseis anti-aéreos” e “por lapso”.

A mesma fonte norte-americana disse que os dados, obtidos através de informação satélite, mostram que dois minutos depois de o avião descolar de Teerão, foram detetadas “assinaturas [ou sinais] de calor de dois mísseis terra-ar”. Houve “uma explosão próxima” e “os dados de calor mostram que o avião estava a incendiar-se enquanto caía”, avançam ainda os EUA.

Como reagiram os líderes políticos à confirmação do míssil?

O presidente da Ucrânia reagiu via rede social Twitter. Volodymyr Zelenski pede ao Irão que lhes sejam devolvidos os corpos, que lhes pague uma compensação e que faça um pedido oficial de desculpas.

O primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau, também reagiu e garante que o governo quer uma “investigação completa e minuciosa” sobre o derrube do avião, assim como uma cooperação das autoridades iranianas. Num comunicado, Trudeau assegura que o foco do país “continua a ser o apuramento das responsabilidades, a transparência e a justiça para com as famílias das vítimas”.

É uma tragédia nacional e todos os canadianos estão de luto unidos. Continuaremos a trabalhar com os nossos parceiros em todo mundo para garantir uma investigação completa e minuciosa, e o governo canadiano espera cooperação total das autoridades iranianas”, concluiu.

Que efeitos está a ter a queda no espaço aéreo?

Várias companhias aéreas, como a Air France e a própria Lufthansa, já tinham cancelado voos para a região do Médio Oriente. Outras, como a a australiana Qantas, Malaysia Airlines ou a Singapore Airlines alteraram as rotas dos seus aviões para não sobrevoarem o espaço aéreo iraniano.

Por exemplo, a Lufthansa explicou que tomou a decisão de cancelas os seus voos devido à situação de insegurança do espaço aéreo em torno do aeroporto iraniano.

EUA/Irão: Lufthansa cancela voos de Frankfurt para Teerão

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