Francisco Carvalho Araújo vive, por estes dias, duas quarentenas. Em Londres, onde mora e trabalha há cerca de três anos, e em Portugal, de onde as notícias da família e os pontos de situação chegam amiúde. Diz que o Reino Unido leva um atraso de duas semanas, evidência inédita quando tirada de contexto.
Por cá, e apesar de nunca ser demais relembrar, apelos como “lava as mãos”, “isola-te”, “não te mantenhas em contacto” e “reinventa o espaço” podem parecer elementares, mas em terras de sua majestade a renitência em cumprir à risca as medidas de restrição para conter a pandemia tem dado um pouco mais de trabalho. Francisco, observador atento e português das circunstâncias que o rodeiam, optou por estampar os conselhos em t-shirts e camisolas. A marca chama-se Dress for Awareness e ganhou forma há duas semanas. Mais do que um negócio, é um projeto sem fins lucrativos.
“Já andava aqui a cozinhar qualquer coisas — uma marca de roupa que fosse bem feita. Via muita gente a comprar e a deitar fora, sem fazer a mínima ideia de onde é que as coisas eram feitas. entretanto, a pandemia explodiu e acabei por abandonar a ideia inicial de ter um pequeno negócio”, explica Francisco ao Observador.
Mas até chegar aqui, este empreendedor de 29 anos já tinha passado por umas quantas alterações de rota. A começar pela chegada a Londres, mudança motivada por questões profissionais, não dele, mas da mulher, Carolina. Durante seis meses, Francisco manteve o trabalho que já tinha em Lisboa, para a portuguesa Uniplaces. Depois, assumiu o cargo de gestor de produto na Monzo, empresa britânica de fintech.
Mas em janeiro deste ano, voltou a mudar de rumo. “Saí e fiz uma pausa. Comecei por pôr a escrita e a leitura em dia. Fiz os Caminhos de Santiago”, conta. O projeto de ter uma marca própria começou a ganhar forma. Inscreveu-se no curso de design que há tanto andava a adiar. Nas duas semanas seguintes, aconteceu tudo — converteu a marca num empreendimento solidário, criou o conceito e comprou o domínio.
A Covid-19 foi o ponto de partida para os primeiros slogans (entretanto, já devidamente traduzidos no segundo parágrafo), mas a Dress for Awareness quer explorar outras problemáticas que exijam tanta o mais sensibilização, entre elas a crise dos refugiados e a saúde mental. Quanto à sustentabilidade, esta continua a estar presente seja qual for a mensagem impressa. O algodão é certificado, não há utilização de plástico ao longo da cadeia de fornecimento, as embalagens são à base de resíduos industriais e qualquer peça, sem exceção, pode ser reciclada.
“O facto de a marca ser sustentável, só por si, atrai as pessoas. Há quem peça t-shirt e camisolas sem frase nenhuma e já estamos a providenciar”, admite. A premissa beneficente é que não arreda pé — todos os lucros que resultem das vendas destas peças, com ou sem mensagem, revertem para os serviços nacionais de saúde britânico e português. E quando os temas forem outros, haverá sempre uma organização de ação relevante para apoiar.
Para já, com duas semanas de encomendas, o balanço ainda não é expressivo. Mas o empreendedor garante o projeto está a despertar curiosidade, sobretudo a dos ingleses. “As mensagens têm gerado boas conversas. As pessoas partilham nas redes sociais, outras usam em videochamadas. Outras preferem querem esperar por outros temas”, refere o jovem empreendedor, cujo objetivo é também lançar o movimento nas redes sociais através do hashtag #dressforawareness.
Por estes dias, e depois de ter concretizado o projeto em tempo recorde, Francisco gere produção e encomendas a partir de casa, em Aberdeen Park, na zona este de Londres, como aliás tem feito desde o primeiro dia. Explica que a Dress for Awareness vai permanecer minimal no que toca ao estilo. Além das t-shirts, camisolas e sacos de pano em cores neutras, os hoodies devem juntar-se em breve ao catálogo. “Quero manter isto simples, até para a escolha ser fácil”, afirma. Criar uma comunidade de criativos em torno da marca é outra das metas a médio prazo — designers, copywriters, escritores são bem-vindos a contribuir com o que melhor sabem fazer, até porque, como o próprio confessa, “já está a ser difícil gerir isto sozinho”.
Nome: Dress for Awareness
Data: 2020
Ponto de venda: loja online
Preços: dos 14 aos 40,50 euros