O Hospital Universitário de Southampton, em Inglaterra, está a experimentar um novo medicamento em doentes com Covid-19, noticiou a BBC. O fármaco é feito à base de interferão beta-1a, um tipo de proteínas que fazem a comunicação com outras células do sistema imunitário e as orientam para a atividade que devem exercer contra um agente invasor. Normalmente, esta solução é usada em pacientes com esclerose múltipla.

O interferão beta-1a é um tipo de citoquinas, proteínas produzidas pelo organismo que influenciam o comportamento de outras células. De acordo com Richard Marsden, diretor executivo da Synairgen, as autoridade de saúde querem testar este medicamento por dois motivos — porque os ensaios clínicos já terão produzido resultados positivos em doentes com asma e problemas pulmonares crónicos; e porque o novo coronavírus parece reduzir a produção destas citoquinas quando infeta o organismo.

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Como Manuel Vilanova, imunologista do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, já explicou ao Observador, as citoquinas são “mediadores imunológicos” que assinalam aos macrófagos e às células dendríticas como devem engolir o vírus, destruí-lo e recrutar os linfócitos para reconhecer os fragmentos e dar uma resposta específica para aquele invasor. Essa também é a forma como o sistema imunológico reage ao ser infetado pelo SARS-CoV-2.

Em alguns casos, no entanto, é a produção exagerada de citoquinas que provoca os casos de infeção mais graves que precisam de ser internados ou mesmo acompanhados nos cuidados intensivos. “Entra-se numa tempestade de citoquinas que desencadeia um quadro muito grave, em que grande parte do problema não é a lesão que o vírus está a causar diretamente, mas sim esta inflamação que é causada pelo sistema imunitário”, descreveu Luís Graça, imunologista do Instituto de Medicina Molecular, ao Observador.

Mas, de acordo com a BBC, a estratégia pode ser útil para os pacientes que têm o sistema imunológico mais enfraquecido por outras doenças. Certezas ainda não há, por isso é que o medicamento entrará em ensaios clínicos para ser testado em 75 humanos e saber quão eficaz pode ser nesses casos. Metade receberá efetivamente o remédio, outra metade vai receber um placebo.

Uma das pacientes que vai participar no ensaio é Kaye Flitney, uma mulher de 67 anos infetada pelo novo coronavírus que tem sentido dificuldades respiratórias e tosse. Em entrevista à BBC Panorama, Kaye confessou ter ficado assustada quando soube que tinha Covid-19 — não por ela, mas pelo marido: “Fiquei assustada porque meu marido tem insuficiência cardíaca”.

A paciente do hospital em Southampton garante que a administração do medicamento não causou desconforto: “Não nos apercebemos de que estamos a tomá-lo até terminar. Não é assim tão mau. Imagino-me a tomá-lo em casa”, descreveu. Agora que já recebeu o remédio, os médicos que acompanham Kaye Flitney vão monitorizar a evolução da doente. Em junho saber-se-ão os primeiros resultados do ensaio clínico.