Foi um late night show, via Zoom, onde se viu um Paulo Portas descontraído. Enquanto fumava o seu cigarro, com uma estante de cenário e a bebericar o café, o antigo líder do CDS participou numa sessão do blogue Psicolaranja — que integra maioritariamente militantes do PSD. Bem tentou fugir, mas lá falou de algo a que raras vezes se tem dedicado em público: “Questões domésticas”. Questionado sobre quem na política portuguesa tinha sido mais favorecido com esta crise, Paulo Portas foi claro: Rui Rio. “No essencial, o líder da oposição fez o que o líder da oposição deve fazer numa situação desta gravidade em termos de saúde pública e de epidemia e creio que isso lhe dá crédito“, afirmou Paulo Portas perto da meia-noite desta sexta-feira.

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Paulo Portas diz que às vezes pode “não concordar com uma palavra ou com uma ideia de Rio”, mas no essencial o líder da oposição esteve certo na estratégia de “one nation, somos uma só nação, não há cá nem laranjas, não há rosas, não há cá esquerda nem direita, não há oposição e governo. Nós temos de sair juntos disto”.

O antigo líder centrista lamenta que em algum momento o governo tenha começado a abusar da “generosidade com medidas ideológicas” e com “decisões simbólicas que só privilegiam uns e esquecem outros”. Ainda assim, é momento de “confiar nas autoridades”. E aí, regista, o “líder da oposição também é uma autoridade importante”. Nesse sentido, em mais um elogio a Rio,  Portas prefere “quem contribua para que se saia melhor desta situação, do que quem queira fazer ganhos imediatos que se perdem na espuma dos dias”.

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“Tive sempre um princípio no CDS: à minha direita nada de relevante”

Numa semana em que o líder do CDS, Francisco Rodrigues dos Santos, voltou a admitir coligações com o Chega em entrevista à TSF, o ex-presidente Paulo Portas deixou uma lição na sessão do blogue. Sobre coligações do CDS à sua direita, o antigo vice-primeiro-ministro lembra que teve “sempre um princípio no CDS, e acho que esse princípio foi bem sucedido a propósito de relações com extremos: à minha direita a parede. E é minha responsabilidade que não haja nada de relevante à minha direita”.

Paulo Portas lembra que se teve “êxitos” e “insucessos” nos 16 anos que teve na liderança, não tem dúvidas que esta estratégia em particular foi “um êxito”. E acrescenta: “Nunca deixei que houvesse o que quer fosse de relevante [à direita do CDS], que a esquerda agradece que exista, como é evidente, que caricatura o centro-direita. Era minha responsabilidade que a direita estivesse dentro da democracia, dentro das instituições e soubesse respeitar as regras institucionais do país”.

Presidenciais? Regresso à política ativa não está para “breve”

Paulo Portas teve sempre um diálogo animado e começou por dizer que estar numa sessão do “psicolaranja” lhe fazia lembrar o “regresso à adolescência”. O antigo líder do CDS — que militou na JSD antes de passar para o CDS — lembra que o seu “primeiro entusiasmo político” que teve e que acha que “teria mantido se não se fosse o 4 de dezembro, foi com Francisco Sá Carneiro, que era líder do então Partido Popular Democrático que ainda é hoje o nome que carinhosamente eu dou ao PSD”. Ou seja: Sá Carneiro não tivesse morrido, Portas poderia nunca ter saído do então seu PPD.

O antigo vice-primeiro-ministro, que já integrou dois governos em coligação com o PSD, diz que normalmente chama “PPD” ao PSD, embora perceba que “quanto mais passam as gerações, menos as pessoas estão emocionalmente ligadas ao princípio do PSD, que foi o PPD”.

Uma das coisas que Portas confessou não ter gostado muito nessa experiência é que no PSD se tratavam todos por “companheiro”. Se bem me lembro, no PPD era companheira Manuela, companheiro Pedro. Achava que aquilo dava um ar um bocadinho… companheiro, companheira, companheiro, companheira.” Por isso, diz, no seu partido é diferente: “No CDS é amigas e amigos.” Mesmo que, registou, às vezes essa amizade não seja literal.

Na fase de perguntas, Portas foi questionado sobre quando voltaria à política numa alusão às presidenciais. O antigo líder do CDS disse que não responderia à pergunta porque a resposta não seria “breve”, nem o regresso  à política ativa acontecerá em breve.

Sem “simpatia” por apoios do governo à comunicação social

Paulo Portas foi depois questionado se, enquanto diretor d’ O Independente, aceitaria o apoio do governo à comunicação social. O antigo líder do CDS disse que não tem “muita simpatia por subsídios públicos às entidades de comunicação social” porque considera que “há sempre um preço da independência, por mais que ambas as partes proclamem que não.

Embora com várias exceções abertas para assuntos domésticos, de que não tem falado desde que saiu da liderança do CDS, grande parte da intervenção de Paulo Portas foi sobre a pandemia, os efeitos desta, de geopolítica e política internacional no geral.

Paulo Portas disse, por exemplo, que “não há nenhum populista da esquerda à direita que tenha gerido decentemente esta crise”, e aí deu exemplos à direita (como EUA e Brasil) ou à esquerda. O antigo líder do CDS foi duro para o vice-presidente do governo espanhol, Pablo Iglesias, que em Espanha “colocou a ideologia à frente da saúde pública”. Ter “populistas no governo”, acredita Portas, “prejudicou Espanha e beneficiou Portugal [por não ter esses populistas no executivo]”.

O antigo líder do CDS chamou ainda atenção para “presidentes ou primeiros-ministros que utilizaram estados de alarme ou de emergência para abusar do seu poder”. Para Portas, “o maior risco que tem a concentração de poderes abusivos em situações excecionais é os líderes habituarem-se a isso.”