As manchetes mais sensacionalistas foram fáceis de escrever: “Rooney contraria Klopp”. Algo que, de facto, aconteceu. O que é preciso acrescentar, porém, é que o experiente avançado inglês contrariou Klopp para o elogiar — a ele, ao trabalho desenvolvido no Liverpool e ao próprio clube. O atual jogador do Derby County, que voltou a Inglaterra em janeiro depois de dois anos nos Estados Unidos, decidiu pegar em declarações recentes do treinador alemão para defender que o futuro do Liverpool pode ser hegemónico.

Isto porque, há dias, Klopp disse que dificilmente o Liverpool — ou qualquer outro clube — conseguirá dominar o futebol inglês e europeu como o Manchester United chegou a fazer, nos anos 90 e já no século XXI, com Alex Ferguson ao comando e com Rooney, na segunda geração, como uma das figuras de proa. Na opinião do avançado de 34 anos, porém, este conjunto de jogadores dos reds tem toda a possibilidade de chegar a um nível de hegemonia semelhante.

“O plantel do Liverpool é bastante jovem e os jogadores mais importantes têm contratos muito longos. Há um grande potencial para ganharem mais troféus. O Klopp diz que é impossível um clube dominar agora como o Manchester United já fez, mas está enganado. Há uma forma para o Liverpool o fazer: continuar com o Klopp por muito tempo. O United dominou porque isso aconteceu com Sir Alex. O Klopp só tem 53 anos e acredito que se ficar em Anfield nos próximos 10 anos vai ganhar pelo menos cinco campeonatos”, escreveu Rooney na coluna de opinião que mantém no jornal The Times.  Embora reconhecendo que “não quer ver o Liverpool ganhar o que seja” — Rooney é formado no Everton, eterno rival dos reds, e foi no outro clube de Merseyside que deu nas vistas na Premier League –, o antigo internacional inglês garante que “respeita” o sucesso da equipa como “apaixonado do futebol” e admite que serão “campeões de forma bastante merecida”.

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Certo é que, e depois de três meses de paragem que adiaram o mais do que certo título do Liverpool, a equipa de Jürgen Klopp voltou à competição com um insonso empate sem golos precisamente com o Everton, no dérbi da cidade. O nulo, aliado às duas vitórias do Manchester City nas duas jornadas que já disputou — primeiro com o Arsenal, depois com o Burnley –, voltaram a atirar mais para a frente no calendário a confirmação da conquista da Premier League. Esta quarta-feira, no regresso a Anfield e na receção ao Crystal Palace, o Liverpool já sabia que não seria campeão no final da partida, independentemente do resultado: em caso de vitória, a equipa de Klopp teria sempre de esperar pelo jogo do City, esta quinta-feira com o Chelsea, e só festejaria em cenário de derrota ou empate do conjunto de Guardiola.

Com Salah e Robertson de regresso ao onze inicial, depois de ambos terem falhado o primeiro jogo da retoma por problemas físicos, Klopp colocava em campo aquele que é teoricamente o onze tipo do Liverpool, exceção feita à presença de Joe Gomez ao lado de Van Dijk, em substituição do lesionado Matip. Os reds assumiram o controlo da partida logo nos primeiros instantes, com a dupla de centrais, como é habitual, já depois da linha do meio-campo, a alavancar toda a equipa para os últimos 30 metros da metade adversária. Depois de várias oportunidades — e de Zaha, uma das figuras do Palace, sair lesionado — o primeiro golo da partida acabou por surgir através de um lance de bola parada: o que não retira uma ponta de brilhantismo àquilo que aconteceu ao minuto 23 do encontro da noite desta quarta-feira em Anfield.

Livre a beneficiar o Liverpool à entrada da grande área do Crystal Palace, quase na zona central, a descair ligeiramente para a direita. Salah do lado esquerdo da bola, Alexander-Arnold do lado contrário. Avançou o lateral, num movimento anatómico perfeito, e atirou de pé direito. A bola passou por cima da barreira e só parou na junção entre o poste e a trave da baliza de Hennessey, que ainda voou para não conseguir chegar a lado nenhum. Um golo delicioso de Alexander-Arnold, que se tornou o jogador mais novo do Liverpool a marcar de livre direto em Anfield em 25 anos e que já leva intervenção em 30 golos da equipa desde que se estreou, em agosto de 2016, cinco vezes mais do que qualquer outro defesa no mesmo período.

Até ao intervalo, o Liverpool ainda aumentou a vantagem, por intermédio de Salah. Fabinho, com um grande passe picado, descobriu o egípcio na grande área, que dominou com o peito para depois rematar de pé esquerdo (44′). No final da primeira parte, a equipa de Jürgen Klopp ganhava confortavelmente e merecidamente, não tendo permitido qualquer lance de perigo ao Crystal Palace durante 45 minutos.

Na segunda parte, e apesar de o ritmo ter caído ligeiramente, o Liverpool manteve a superioridade face ao adversário e só precisou de esperar 10 minutos para voltar a marcar. Depois da assistência perfeita para Salah no segundo golo, Fabinho atirou do meio da rua um remate fortíssimo que não deu qualquer hipótese a Hennessey (55′). Mesmo a ganhar por três golos de diferença, os reds não abdicaram da posse de bola e mantiveram-se a olhar para o jogo de frente, com todos os elementos da equipa no interior do meio-campo adversário e uma pressão asfixiante que não permitia um centímetro de espaço ao Crystal Palace.

Até ao fim, e ainda antes de Klopp tirar Alexander-Arnold e Firmino para lançar Neco Williams e Minamino, o Liverpool aproveitou uma recuperação de bola para confirmar a goleada. Firmino colocou em Salah na zona central e o egípcio, com um passe magistral que rasgou por completo a defesa do Palace, descobriu Mané em velocidade na esquerda. O senegalês correu e à saída de Hennessey, com um remate em arco, inscreveu o nome da ficha de jogo (69′).

O Liverpool goleou e fica agora à espera de saber o que faz esta quinta-feira o Manchester City, contra o Chelsea, para descobrir se festeja a conquista da Premier League já esta semana ou se precisa de esperar por mais uns dias e mais uma vitória. Trent Alexander-Arnold, com um livre brilhante que abriu o marcador, foi a figura do jogo e da equipa: mas a verdade é que este Liverpool de Klopp, nos dias em que está inspirado, é praticamente imparável. E exibições como a desta quarta-feira recordam as declarações de Rooney e a possibilidade de esta ser a melhor equipa de uma geração inteira.