No início da temporada, quando o FC Porto apresentou o plantel que Sérgio Conceição iria ter à disposição para lutar pela conquista do Campeonato, as cabeças mexeram-se e questionaram-se quando o número 17 entrou em campo. Nas costas da camisola, não estava Jesús, não estava Corona — estava Tecatito. Jesús Corona apresentou-se como Tecatito durante toda a época mas a transformação foi apenas ao nível do apelido. Dentro do relvado, nem um nome diferente mudou um jogador que é o faz tudo dos dragões há cinco anos.

Danilo, a figura de uma época que foi de dispensado do estágio a super-herói (a crónica do FC Porto-Sporting)

No Monterrey, ainda no México e no início da carreira, Corona jogava a avançado. Víctor Manuel Vucetich, antigo selecionador mexicano, chegou ao clube e passou a utilizar o jogador na ala, mais como um extremo ou um médio menos interior do que um avançado. Foi já com essa posição e essas funções mais aprimoradas que Corona chegou ao Twente, em 2013 — e foi ao dar nas vistas na transição ofensiva dos holandeses, assim como na combatividade no meio-campo, que o mexicano levou o FC Porto a desembolsar mais de dez milhões de euros para o contratar em 2015.

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Corona chegou quando ainda era Julen Lopetegui o treinador dos dragões e depressa se tornou um dos jogadores mais utilizados da equipa, mesmo durante as passagens de José Peseiro e Nuno Espírito Santo, ainda que sempre perdido no maior protagonismo de Brahimi. Mas foi com Sérgio Conceição que o mexicano atingiu o estatuto de indiscutível: na temporada passada, esteve em todos os jogos do Campeonato e fez mais 19 nas restantes competições, terminando a época com 53 partidas disputadas e sete golos marcados, o terceiro melhor registo da carreira. Este ano, leva quatro golos e 16 assistências em todas as competições, tendo chegado em Tondela ao melhor registo desde que chegou ao Dragão, tornando-se também o 13.º jogador do FC Porto a oferecer 10 ou mais golos numa única edição da Liga desde 1995.

A utilização de Jesús Corona, porém, tem uma particularidade que o torna um jogador indispensável numa equipa de futebol. A versatilidade do mexicano permite-lhe desempenhar várias funções dentro de campo, nunca perdendo a titularidade, o rigor e a qualidade. Na ausência de Wilson Manafá na direita da defesa, ou por lesão, por castigo ou por não ser opção inicial, Corona assumiu diversas vezes a lateral defensiva, oferecendo um pendor ofensivo ao setor mais recuado da equipa que libertava o médio tombado para aquele lado para movimentos mais interiores. Já durante a retoma, e face ao bom rendimento de Manafá, o jogador de 27 anos tem sido solicitado novamente para uma posição mais adiantada, sempre no setor intermédio, onde não só aparece no corredor para criar situações de perigo na grande área como é um polivalente que faz a dobra ao lateral e torna aquela ala um autêntico forte. Combativo e persistente na defesa, Corona não deixa de ser virtuoso e criativo no ataque — algo que o torna praticamente elegível para todas as posições de campo no relvado.

Um dos jogadores mais regulares da temporada — contra o Tondela, na semana passada, fez o 35.º jogo consecutivo a titular para todas as competições, dado que caiu por terra ao falhar o Clássico com o Sporting por castigo –, Corona renovou contrato no ano passado e está ligado contratualmente ao FC Porto até 2022, ainda que o empresário do internacional mexicano garanta que este continua a ser seguido de perto pelo Inter Milão e a imprensa inglesa fale em interesse do Everton e do Wolverhampton. E no México, onde voltou à seleção de Tata Martino depois de uma polémica que o afastou de algumas convocatórias, é tido como o verdadeiro herdeiro de Cuauhtémoc Blanco, um dos jogadores mais influentes do futebol do país: uma distinção que não deixa de ser importante, já que está incluído numa geração que conta com nomes como Chicharito, Giovani dos Santos e Carlos Vela.

Mudou de nome, mudou de posição, não mudou o importante. Corona, o troca-tintas que é a imagem de uma equipa (a crónica do Rio Ave-FC Porto)

Largamente considerado um dos melhores jogadores a atuar na Primeira Liga, Jesús Corona tornou-se um dos elementos mais cruciais do percurso do FC Porto até ao título por ter servido de ponte entre o primeiro ano de Sérgio Conceição e aquela que, de forma quase certa, terá sido a temporada mais importante de Sérgio Conceição no Dragão. A par de Alex Telles, Danilo, Marega e outros, o mexicano foi um dos alicerces que aguentaram as saídas de Felipe, Herrera e Brahimi, três traves-mestras de uma equipa que no início da época parecia demolida a partir de dentro. A enorme estabilidade e coerência garantidas por Corona, extensão do treinador no interior do relvado mesmo sem a braçadeira, acabaram por deixar certo a Sérgio Conceição que teria sempre um elemento de equilíbrio entre o passado e o presente com o objetivo de chegar a uma pretensão de futuro. Um futuro que chegou esta quarta-feira — na conclusão da tal temporada que foi a mais importante de Sérgio Conceição no Dragão.

A lateral, a médio ou a avançado, a verdade é que Jesús Corona foi sendo uma espécie de “empregado de todos os meses” e ofereceu sempre uma regularidade rara entre os castigos e as ausências de Alex Telles, as fases menos boas de Marega, a adaptação de Luis Díaz e o binómio Danilo/Sérgio Oliveira. Assente numa experiência e maturidade acima da média para os 27 anos que traz no documento de identificação, o mexicano foi a calma no caos de uma equipa que chegou a ter um treinador a colocar o lugar à disposição, que perdeu um dos troféus internos e que recebeu o principal rival a sete pontos da liderança. E será o primeiro a ser celebrado pela vitória da equipa que ganhou com base num treinador que nunca quis realmente desistir, que recuperou o mais importante troféu interno e que recuperou de uma desvantagem de sete pontos para ser campeã nacional com jornadas ainda por disputar. Em tempos de “Ai Jesús”, Corona foi sempre a aposta certa.