A Uber, e a concorrente norte-americana Lyft, estão a preparar-se para enfrentar um dos maiores desafios até hoje. Depois de a pandemia do novo coronavírus ter, praticamente, parado as operações de grande parte do negócio mundial das empresas, a decisão a 10 de agosto de um tribunal da Califórnia, nos EUA, mostra ser ainda um maior desafio. Porquê? Porque diz que os motoristas da empresa têm de ser considerados funcionários. O resultado da impugnação desta decisão vai ser conhecida entre esta quinta ou sexta-feira. Se se mantiver, ou a Lyft e a Uber contratam, do dia para a noite, milhares de motoristas, ou vão ter de cessar operações.

Isto tudo acontece, ironicamente, no Estado onde as duas empresas têm as suas sedes (localizadas em São Francisco). Ao The Guardian, um responsável da Lyft assumiu por email: “Se os esforços para estender a suspensão do pedido após 20 de agosto não tiverem sucesso, a Lyft encerrará as operações na Califórnia”, escreve o jornal britânico.

[Dara Khosrowshahi, presidente executivo da empresa, tem defendido que “os motoristas são clientes”, algo que sustenta a alegação das empresas]

Numa publicação, Alison Stein, uma economista na Uber, defende a posição da empresa: “Eles [os reguladores] acreditam que a Uber e outras empresas podem fazer de cada motorista um funcionário, continuando a deixá-los trabalhar exatamente da mesma maneira que o fazem atualmente — por exemplo, começar e parar o trabalho quando e onde quiserem; aceitando apenas as viagens que desejam fazer; ou trabalhar para concorrentes ao mesmo tempo”.

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Como prova, citam o facto de que as leis do trabalho, incluindo A.B. 5, não impõem horários de turnos ou outros requisitos rígidos que a maioria dos funcionários tem. Isso é verdade. Mas o que eles não mencionam é que não há nenhuma grande empresa no estado da Califórnia ou, na verdade, em todo o país, onde funcionários à hora possam trabalhar como os motoristas atualmente fazem com o Uber”, diz Stein.

Stein vai ainda mais longe nesta explicação: “A Starbucks oferece um dos empregos em part-time mais flexíveis do mercado, mas os baristas não podem simplesmente entrar sem avisar, decidir que só farão lattes enquanto recusam todos os pedidos de cappuccinos, sair durante a afluência matinal para ir buscar buscar o filho à escola (sem a permissão do chefe) e voltar a trabalhar no Peet’s Coffee. Isso seria absolutamente permitido pela lei, então por que isso não acontece? A resposta é simples: as empresas simplesmente não sobreviverão se não tiverem nenhum controle sobre o que seus funcionários à hora, sejam em tempo integral ou parcial, realmente fazem”, adianta.

Uber pode sair da Califórnia depois de tribunal dizer que motoristas são “empregados”

Nos EUA, da mesma maneira que um passageiro é um cliente da Uber, os motoristas também assim são encarados por esta plataforma de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados (TVDE). Na prática, por não estarem vinculados à Uber, os motoristas podem utilizar outros serviços concorrentes, não tendo, contudo, as proteções que teriam se tivessem um contrato de trabalho.

Este conceito, intitulado de “gig economy“, em inglês, permite a estas empresas terem maior facilidade de crescimento. Apesar de não conceder tantas garantias e flexibilidade como um contrato de trabalho, o que leva muitos a criticarem este modelo, há motoristas, refere o The Guardian, que não tiveram apoios de desemprego nos EUA devido a esta situação.

Em Portugal, o documento que legislou o transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados (TVDE), salvaguardou esta questão, fazendo com que existam empresas que criam relações com a Uber e outras plataformas. Contactada fonte oficial da Uber em Portugal sobre esta questão e que impacto podia ter no país, não houve comentários.