Rui Pinto, criador da plataforma e única cara dos Football Leaks, deu uma entrevista à revista alemã Der Spiegel em que garantiu que durante os mais de 12 meses em que esteve em prisão preventiva preparou o o seu julgamento, que começa na próxima sexta-feira, dia 4 de setembro.
“Obviamente que ninguém consegue aguentar o isolamento durante muito tempo. De qualquer, tenho orgulho em mim próprio por ter lidado bastante bem com tudo isto”, disse. “Eu sabia que claramente não podia perder a sanidade, porque tinha uma vida inteira pela frente e tinha de me concentrar no julgamento. Tinha de chegar ao julgamento fresco, para lhes mostrar que estou aqui para lutar, que sou um whistleblower [denunciante]. Fiz o que tinha a fazer.”
Na reportagem que dá conta desta entrevista, a Der Spiegel, que publicou algumas das principais reportagens resultantes do Football Leaks (incluindo a que denunciou a fuga ao fisco de Cristiano Ronaldo em Espanha, e que levou o jogador português a ser condenado a uma pena suspensa e ao pagamento de 20 milhões de euros), refere que a entrevista aconteceu numa zona rural “não muito longe de Lisboa”.
“Ele pode estar oficialmente em liberdade, mas tem de consultar a polícia a cada vez que quer sair, para que os possíveis riscos possam ser discutidos”, lê-se naquele texto. Para combinar a entrevista, Rui Pinto enviou uma mensagem num serviço de chat encriptado aos jornalistas da Der Spiegel, marcando encontro no “parque de estacionamento de um supermercado longe de Lisboa”.
Rui Pinto diz que Doyen tentou aliciá-lo a espiar Federação Portuguesa de Futebol
No local, conta aquela revista, apareceu um carro que pediu para ser seguido — por entre “curvas bruscas, aparentemente para afastar possíveis perseguidores”. Os jornalistas só viram Rui Pinto depois de tudo isto, numa estação de serviço, onde o alegado hacker saiu da parte de trás do carro com um boné, óculos de sol e uma máscara.
Além do mundo do futebol, Rui Pinto tem vindo a concentrar-se com particular dedicação ao caso angolano, envolvendo-se recentemente em trocas de acusações com a filha do ex-Presidente de Angola, Isabel dos Santos — um despique público que surge depois de, quando Rui Pinto ainda estava em prisão preventiva, terem sido publicados os Luanda Leaks. O alegado pirata informático de 31 anos fez saber, à altura, que era ele que estava por trás daquela fuga de informação.
“É repugnante ver como Portugal se tornou na lavandaria das elites angolanas”, diz agora na entrevista à Der Spiegel.
Rui Pinto estava em prisão preventiva desde 22 de março de 2019 e foi colocado em prisão domiciliária a 8 de abril deste ano, mas em habitações disponibilizadas pela Polícia Judiciária. Na sequência de um requerimento apresentado pela defesa do arguido, a juíza Margarida Alves, presidente do coletivo de juízes que vai julgar Rui Pinto, decidiu colocá-lo em liberdade.
Rui Pinto foi acusado pelo Ministério Público de 147 crimes. Além de uma tentativa de extorsão à Doyen, em coautoria com o advogado Aníbal Pinto, o despacho de acusação referia ainda um crime de acesso ilegítimo à sociedade de advogados PLMJ, outro de sabotagem informática à SAD do Sporting, aos quais se somam 74 crimes de acesso ilegítimo, 63 crimes de violação de correspondência (a contas do Sporting, da Federação Portuguesa de Futebol, Procuradoria Geral da República, PLMJ, Doyen e Plataforma Score) e sete por violação de correspondência agravados (em relação a Carlos Vieira, Sancho Freitas, Rui Caeiro e Pedro Almeida do Sporting e João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês de Almeida Costa, advogados da PLMJ).
Já na fase de instrução, a juíza Cláudia Pina decidiu pronunciá-lo por 90 crimes.
PJ nega ter contratado Rui Pinto e garante que não paga ao hacker “qualquer vencimento”