Tem corrido em paralelo nas reuniões políticas e técnicas do Orçamento do Estado para 2021, mas a partir do momento em que o primeiro-ministro voltou à carga sobre o tema “acordo sólido e duradouro”, na reunião que teve com uma comitiva do Bloco de Esquerda esta semana, a questão não saiu mais da mesa. Tanto que no partido liderado por Catarina Martins já se fala num “acordo político” que inclua medidas que têm estado na negociação do Orçamento para 2021 mas que não são orçamentais. Um “acordo” escrito que serviria de condição para aprovar este Orçamento.

“Não temos de encher o Orçamento com medidas que não são orçamentais e que são compromissos do Governo. O BE admite que algumas dessas medidas sejam assinadas como acordo político” no caso daquelas que tenham “efeito plurianual”, como explica ao Observador um dirigente do partido. O partido considera mesmo que a existência desse acordo é importante para que seja “viabilizado o Orçamento” do próximo ano. “Um acordo político seria sempre um compromisso para este orçamento”, diz a mesma fonte.

Trata-se de compromissos que implicam mais anos, como a tendência de aumento do salário mínimo nacional, por exemplo, para que atinja os 750 euros mensais em 2023, ou garantir a permanência por mais anos da nova prestação social. Tudo matérias que estão a exigir negociação neste Orçamento do Estado, mas ao que o Observador apurou são também questões que o Governo está a aproveitar para tentar convencer o BE a manter-se ao seu lado, num acordo alargado, até ao final da legislatura. Uma espécie de garantia de estabilidade política.

Com o apoio político do Governo mais periclitante a cada Orçamento do Estado (o Suplementar já foi viabilizado apenas com a abstenção bloquista, já que o PCP votou contra), o Governo está empenhado na solução meia-geringonça, ou seja, na impossibilidade de voltar a juntar os parceiros (BE, PCP e PEV) da última legislatura todos debaixo de um acordo muito semelhante, volta-se apenas para o Bloco de Esquerda. Afinal este é o único que se mantém numa negociação mais profunda e parecida com as que aconteceram nos últimos cinco anos. O PCP está com outro envolvimento nesta legislatura e não tem entrado nas negociações com o Governo com um caderno de encargos à cabeça, mas antes a apenas ouvir. E fica nesta posição durante semanas.

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Nos últimos dias, nas reuniões com o Bloco, o Governo tem falado no acordo escrito. “Não é algo que nos fira a sensibilidade”, diz outro dirigente bloquista não descartando essa negociação. “Nunca fechámos nenhuma porta”, adianta ainda referindo-se ao que aconteceu nas últimas reuniões. Aliás, quando se fala na nova prestação social temporária, o Governo tem tentado sempre colocar essa mesma perspetiva ao BE. “Sem acordo mais longo, só nos comprometemos [a ter esta prestação] nesta legislatura”, descreve-se no partido de Catarina Martins quando se fala da posição do Executivo nesta negociação concreta. O Executivo tenta, assim, agarrar o parceiro por mais tempo nesta mesa negocial.

A pressão está forte e o Observador já tinha noticiado que o assunto tinha voltado às conversas, só ainda não era claro se o Bloco estava nesse jogo. Agora, nos últimos dois dias, já se ouviu o Governo a falar desta possibilidade sem rodeios. Duarte Cordeiro, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares que faz a negociação mais direta no Parlamento com os parceiros, detalhou que “há matérias que faz sentido estarem inscritas no Orçamento do Estado e há outras que partirão de documentos que queremos escrever em conjunto e de compromissos que teremos de assumir”. “Nem todas elas são matérias que se inscrevem no Orçamento do Estado”, disse ainda.

Este fim de semana o Bloco reúne o seu órgão máximo entre Congressos, a Mesa Nacional, e vai debater a posição do partido no Orçamento do Estado. É também de esperar que qualquer solução mais longa seja debatida, sendo certo que a prioridade do partido neste momento vai para o Orçamento do Estado. Aliás, para o Bloco, o Orçamento para 2021 é uma porta que pode abrir esse caminho. Recorde-se que no início da legislatura, quando ainda se negociava um apoio político para o PS (que não tinha maioria), o Bloco chegou a propor um acordo escrito, mas que o PS acabou por recusar por estarem em jogo linhas vermelhas do BE — alterações ao Código do Trabalho — que os socialistas não quiseram aceitar.

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