A Santiago, um dos discípulos de Jesus Cristo, foi atribuída, de acordo com a lenda, a evangelização de Espanha. Em 872, o rei Afonso III mandou erigir uma majestosa igreja em Compostela, no local onde se encontravam sepultados os restos mortais de Santiago. Setenta e nove anos depois, no ano de 951, Goldescalc, o Bispo de Puy, entra na História como o primeiro peregrino oficial estrangeiro. As peregrinações a Santiago de Compostela continuaram durante cerca de 17 séculos. Renasceram três séculos depois, no século XX, fazendo de Santiago de Compostela o terceiro lugar Santo do Cristianismo, logo a seguir a Jerusalém e Roma.

Os Caminhos para Santiago

Apesar da sua forte conotação religiosa e espiritual, hoje em dia, vários são os peregrinos que percorrem o Caminho de Santiago com o objetivo de superarem os seus limites físicos e mentais, acima de tudo. Chegam a Santiago de Compostela através de uma das várias rotas históricas definidas, que atualmente são 7: o Caminho Francês, o Caminho do Norte, a Rota Marítimo fluvial, a Vía de la Plata, o Caminho Inglês, o Caminho Primitivo e, finalmente, o Caminho Português. Durante vários anos, não se podia propriamente apontar um local de início para o Caminho Português. Há quem parta de Lisboa, onde, de acordo com várias associações e entidades, se inicia oficialmente o Caminho. Porém, há quem o inicie ainda mais a Sul. Independentemente do seu local de início, todos passam pela região Centro de Portugal.

A rota do Caminho pelo Centro de Portugal

A região Centro de Portugal é atravessada por três itinerários oficiais e em vias de certificação: o Caminho Central ou Caminho Português de Santiago, o Caminho Via Portugal Nascente e, finalmente, o Caminho do Interior. Três alternativas de Caminho que oferecem aos peregrinos diferentes experiências, dependendo das suas preferências pessoais.

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O Caminho Central ou Caminho Português de Santiago

O Caminho Português entra na região Centro de Portugal por Vila Nova da Barquinha, no distrito de Santarém, uma cidade pitoresca, localizada mesmo junto às margens do Rio Tejo. É aqui que se ergue o que se diz ser um dos castelos mais bonitos de Portugal, o Castelo de Almourol. O caminho continua em direção à Igreja da Atalaia, com origens no século XVI e um dos melhores exemplos da arte renascentista em Portugal.

Infografia: Teresa Dias Costa

De Atalaia, os peregrinos continuam em direção a Tomar, através de Ferreira do Zêzere, um concelho que surpreende pelos seus vales e serras cobertos por vastos mantos verdes e outras verdadeiras pérolas a nível de paisagem natural, como a Albufeira de Castelo de Bode. Tomar marca a entrada num dos mais importantes centros de História templária do mundo. O Convento de Cristo e a Praça da República, no coração da cidade, são dois dos locais a não perder nesta histórica cidade.

Seguindo por Alvaiázere, Ansião e Rabaçal, com uma passagem pelas ruínas romanas de Conimbriga, chega-se a Coimbra, a eterna cidade dos estudantes. Não poderá passar por aqui sem incluir uma visita ao Mosteiro de Santa Clara-a-Nova, onde se encontra o túmulo da Rainha Santa Isabel, sepultada com três símbolos do peregrino de Santiago: a vieira, a cruz e o bordão. Santa Isabel, também conhecida como a “Rainha dos pobres” percorreu várias vezes o caminho de Santiago. O percurso continua para norte, com passagem pela Mealhada, Anadia, Águeda, pertencentes ao distrito de Aveiro e, finalmente, Albergaria-a-Velha, o concelho com maior número de moinhos-de-água da Europa e o último destino no Centro de Portugal antes de seguir rumo à Galiza.

O Caminho Via Portugal Nascente

O Caminho Via Portugal Nascente liga a cidade de Tavira, no Algarve, a Trancoso, na Beira Alta. A entrada na região Centro de Portugal faz-se por Vila Velha de Ródão, conhecida pelo seu vasto património histórico, parte do qual remonta a 600 milhões de anos atrás. O percurso continua pela zona da Beira Baixa, passando pela bela cidade de Castelo Branco e pela aldeia da Soalheira, até chegar ao Fundão, terra onde as cerejas são rainhas.

Seguindo em direção a norte, os peregrinos entram na vila de Ferro, no concelho da Covilhã. De olhos postos na imponente Serra da Estrela, seguem caminho, passando por Belmonte – terra de Pedro Álvares Cabral, com um passado intimamente ligado à comunidade Judaica;  e pela aldeia Trinta – onde foi recentemente inaugurado um albergue para peregrinos; até chegarem à Guarda, a cidade mais alta de Portugal.

Da Guarda até Celorico da Beira, também conhecida por Capital do Queijo da Serra e Catedral do Parapente, são 24 km de caminhada. Aproveite para descobrir o seu passado histórico e desfrutar da famosa hospitalidade beirã.  O Caminho Via Portugal Nascente termina em Trancoso, o último destino antes de seguir o percurso em direção à Galiza e a Santiago de Compostela.

O Caminho do Interior

O Caminho do Interior estende-se por 205 km, unindo a cidade de Viseu a Chaves. O vasto património histórico e arquitetónico da cidade de Viseu marca o inicio perfeito para este Caminho pelo Centro de Portugal que continua até Castro Daire, zona marcada por uma belissima envolvente natural e um passado histórico de grande interesse.

Este Caminho apresenta ainda a particularidade de se cruzar com a Via da Estrela, um antigo percurso de peregrinação que liga Cáceres (em Espanha) a Viseu, percorrido durante séculos por peregrinos medievais que seguiam a estrada romana com inicio em Mérida (antiga Emerita Augusta)  e término em Braga (Bracara Augusta).

Como se deve preparar para o Caminho de Santiago

O Caminho de Santiago é uma experiência única, independentemente do seu local de início. Mas é necessário ter noção que percorrê-lo implica um grande desafio – não só a nível físico como mental -, pelo que uma preparação prévia é da maior importância.

Se não está habituado a fazer grandes caminhadas, o ideal será preparar o corpo previamente, começando por fazer algumas caminhadas curtas que poderá aumentar a distância gradualmente. Inclua caminhadas de montanha para habituar o corpo às subidas e descidas, juntando-lhe uma mochila para se preparar para o peso que terá de carregar durante o Caminho.

No planeamento efetivo do Caminho, estabeleça metas de 20 a 30 kms diários, tendo em conta as opções de alojamento existentes ao longo do percurso. Informe-se do estado do tempo para o período em que andará na estrada e adapte o seu vestuário e equipamento, tentando sempre reduzir ao máximo o peso que leva consigo, mantendo a mochila abaixo dos 10kg. Opte por peças leves mas que o protejam do calor ou frio, dependendo da altura do ano que escolher para fazer o Caminho, dando preferência à sobreposição de vestuário.

A proteção dos seus pés é essencial, pelo que umas boas botas ou sapatos de caminhada são fundamentais, mas certifique-se que não os estreia no Caminho, já que os seus pés já deverão estar adaptados ao calçado por essa altura para evitar bolhas e feridas desnecessárias.  Leve um ou dois bastões de caminhada consigo para ajudá-lo nos percursos mais complicados e para evitar tendinites, e não menospreze a necessidade de hidratação (beba água mesmo antes de ter sede para evitar câimbras) e de descanso. Faça uma pausa a cada uma ou duas horas de caminhada por, pelo menos, 10 minutos, e aproveite, se possível, para refrescar os pés com água fria, secando-os bem antes de se voltar a calçar. Para evitar a insolação, não se esqueça de usar sempre um chapéu nos dias de sol.

Finalmente, o último conselho que lhe damos é para aproveitar ao máximo o Caminho. Faça-o ao seu próprio ritmo e certifique-se que o encara com otimismo e espírito de aventura. O Caminho é, para além de uma experiência espiritual, uma oportunidade para descobrir alguns dos destinos mais pitorescos de Portugal de uma forma única e altamente memorável.

Saiba mais sobre este projeto
em https://observador.pt/seccao/centro-de-portugal/