António Mexia e João Manso Neto, que foram suspensos por ordem judicial das suas funções na EDP em julho, anunciaram que não estão disponíveis para fazer um novo mandato na elétrica. Em comunicado à Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, a empresa informa que se deverá realizar uma assembleia geral extraordinária em janeiro para eleger novos administradores.
Os acionistas representados conselho geral e de supervisão convidaram Miguel Stilwell de Andrade, que substituiu interinamente António Mexia, a formar a nova equipa da comissão executiva.
Na carta a que o Observaor teve acsso enviada ao conselho geral e de supervisão na qual comunica a “decisão mais difícil” — mas esperada — que teve de tomar na sua vida profissional, o gestor mostra-se espantado com o desenvolvimento da investigação que nasceu com base em denúncias anónimas e que se arrasta há oito anos.
António Mexia é presidente executivo da EDP e Manso Neto é administrador executivo e presidente da EDP Renováveis. Os dois foram suspensos do exercício de funções na sequência do inquérito judicial conhecido como o caso EDP.
MP avança para a suspensão de funções de Mexia e Manso Neto na EDP
Os mandatos de Mexia e Manso Neto terminavam no final deste ano e perante a indefinição judicial sobre a possibilidade de retomarem funções, optaram por comunicar a sua saída, o que permite à elétrica antecipar a clarificação dos seus órgãos de administração. António Mexia esteve 15 anos à frente da EDP, tendo sido nomeado pela primeira vez em 2006. Foi o gestor que esteve mais tempo à frente de uma empresa da bolsa portuguesa. Fez cinco mandatos à frente da elétrica, tendo atualmente 63 anos.
Já João Manso Neto subiu à administração da EDP com António Mexia e era presidente da EDP Renováveis desde 2012, sendo apontado como o braço direito do homem forte da elétrica. Manso Neto foi também responsável pelas operações de produção de energia da EDP que estão no centro das investigações judiciais devido a suspeitas de favorecimentos por parte de governos.
Para além dos mandatos suspensos, os dois gestores estavam impedidos de contactar colaboradores da EDP e entrar nas instalações da empresa, na sequência das medidas de coação decretadas pelo juiz Carlos Alexandre a pedido dos procuradores que conduzem o processo que envolve a elétrica e no qual os gestores são suspeitos de crimes de corrupção ativa.
O sucessor de António Mexia, Miguel Stilwell de Andrade, também fazia parte da equipa de administração da EDP há vários anos.
No comunicado onde informa da decisão de saída dos dois administradores, a EDP “reconhece a indelével contribuição do Dr. António Mexia e do Dr. João Manso Neto para o crescimento e criação de valor para a Sociedade e para os seus stakeholders ao longo dos últimos 15 anos e deixa expressamente registadas a importância da liderança do Dr. António Mexia e a contribuição muito relevante do Dr. João Manso Neto no cumprimento dos objetivos da EDP neste período.”
Inquérito judicial que envolve EDP é baseado em “insinuações e construção fantasiosa”
António Mexia abandona definitivamente funções com palavras duras para o desenvolvimento do inquérito judicial conhecido como caso EDP, questionando os “incompreensíveis desenvolvimentos” ocorridos em julho deste ano quando o exercício de funções foi suspenso.
“É com profunda indignação e espanto que nestes últimos mais de três anos continuo a assistir ao desenrolar do processo baseado em insinuações e suspeitas alicerçados numa construção fantasiosa e puramente especulativa sem qualquer aderência à verdade dos factos”.
Na carta que enviou aos órgãos da EDP, António Mexia sublinha que a decisão judicial de suspender o seu mandato foi tomada “sem quaisquer factos novos”, e contrariando a vontade do acionistas de uma empresa privada como a EDP é desde 2012. Esta “aplicação injustificada” das novas medidas de coação, que “legalmente me impede de trabalhar e de exercer o meu atual mandato desde julho último, e estamos a um mês do seu final, aliados a uma investigação artificialmente arrastada levam-me a considerar que é tempo de mudar”.
E é na sequência de “uma profunda reflexão”, que comunica a indisponibilidade de fazer parte de uma nova lista de órgãos sociais. Uma decisão que, garante, não depende da decisão do Tribunal da Relação sobre o recurso para reverter a suspensão de funções ordenada pelo juiz.
O ainda presidente executivo da EDP defende a atuação que teve à frente da empresa e a da sua equipa. A “consciência do que fizemos e a realidade dos factos justificam que nos sintamos absolutamente tranquilos no que se refere à resolução deste processo, ainda em fase de investigação”. E destaca o apoio e a clareza dos órgãos sociais da empresa que após análise profunda de todos os temas em investigação “confirmaram a inexistência de qualquer benefício ilegítimo para a companhia”.
Dá ainda nota dos resultados conseguidos pela empresa durante a sua gestão, salientando o cenário de adversidade vivido nos últimos três anos por causa da investigação judicial, mas não apenas. A EDP enfrentou várias decisões políticas e regulatórias negativas que tiveram impacto de centenas de milhões de euros em Portugal, braços-de-ferro com o Governo que foram parar a tribunal, uma comissão parlamentar de inquérito às suas ditas “rendas excessivas” e uma oferta pública de aquisição falhada por parte do seu maior acionista, a China Three Gorges.
A missiva endereçada a Luís Amado, presidente do conselho geral e de supervisão, começa por comparar a sua liderança do grupo EDP a uma “viagem extraordinária” da qual recorda alguns pontos altos como passar uma das empresas mundiais líderes na produção de energia renovável e da transição energética, a duplicação da capitalização bolsista e os investimentos realizados. Viagem essa que terá sido interrompida pelo inquérito judicial onde António Mexia e João Manso Neto foram constituídos arguidos logo em 2017, sendo suspeitos de crimes de corrupção ativa ligados às chamadas rendas da EDP.