O movimento “A Pão e Água”, que pede mais apoios para os setores da restauração e diversão noturna, decidiu terminar a greve de fome de alguns dos seus elementos esta quinta-feira. Mas já esta sexta-feira um dos porta-vozes, José Gouveia, não descartou em conversa com a Agência Lusa que a greve de fome possa voltar, se as reivindicações do movimento não forem atendidas pelo Governo.

A decisão de acabar com a greve de fome, na quinta-feira, foi tomada depois de Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, ter reunido com o chef de cozinha Ljubomir Stanisic e com o presidente da Associação Nacional de Discotecas, José Gouveia, que encabeçam o movimento “A Mão e Quente”.

A reunião, durante a qual foram discutidos os problemas do setor da restauração e da animação noturna, aconteceu após sete dias de greve de fome de alguns elementos do movimento “A Pão e Água”, que estiveram acampados junto ao Parlamento.

O autarca lisboeta fez a ponte entre o movimento e o ministro Siza Vieira, explicou Ljubomir Stanisic na quinta-feira. Já na sexta-feira, o presidente da Associação Nacional de Discotecas corroborou em declarações à Agência Lusa, dizendo: “Fernando Medina serviu como interlocutor entre nós e [o ministro da Economia] Siza Vieira”.

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José Gouveia explicou ainda  esta sexta-feira à Lusa que o encontro com o presidente da CML aconteceu “por haver uma ligação de amizade entre o Ljubomir [Stanisic] e Fernando Medina”. O protesto não é um protesto lisboeta e a autarquia lisboeta não tem capacidade de resolver problemas que são nacionais, notou ainda José Gouveia — o papel de Medina foi sobretudo o de mediador do conflito, intervindo junto de Siza Vieira.

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Segundo adiantou José Gouveia já esta sexta-feira, as medidas que foram apresentadas pelo movimento, que incluem, por exemplo o levantamento das restrições de horário na restauração, vão ser estudadas esta semana e serão colocadas à apreciação de outros ministérios além do ministério da Economia, designadamente o da Saúde.

Na sexta feira [11 de dezembro] voltamos a reunir, Fernando Medina mais uma vez será o interlocutor da reunião, queremos também que Siza Vieira esteja presente, via telefone, ou que nos diga, no fundo que se faça um apanhado disto tudo“, acrescentou.

Se as principais reivindicações do Movimento não forem consideradas válidas pelo Governo, José Gouveia garantiu que estão dispostos a voltar à greve de fome. “Isto foi uma suspensão do processo em virtude desta porta que se abriu. Nós também não somos masoquistas”, admitiu, acrescentando que Fernando Medina lhes pediu que parassem com o protesto e que conversassem.

Esta quinta-feira, 3 de dezembro, após a reunião com Fernando Medina, os dois representantes começaram por afirmar que a greve de fome continuava e que só seria suspensa depois de uma discussão com os restantes elementos do grupo. “Nós somos um movimento, não somos pessoas individuais. Estamos como representantes de um movimento. A partir do momento em que o grupo decidir sair, nós saímos”, tinha dito José Gouveia aos jornalistas no final da reunião. A decisão de reverter a greve de fome chegou pouco depois.

“Esta reunião foi entre três homens razoáveis, entre três homens que querem chegar a um acordo, entre três homens que querem o melhor para este país. Não estamos díspares da realidade, sabemos o que acontece e não temos conhecimentos científicos ou médicos para estarmos a contestar seja o que for“, continuou José Gouveia. “Há situações em que a economia não pode parar. Temos de encontrar soluções para isso. As empresas estão encerradas e não podem esperar nem mais um dia.”

Medina a mediar contacto com ministro Siza Vieira

Já o chef Ljubomir Stanisic, o rosto mais mediático do grupo de manifestantes, fez um balanço positivo da primeira reunião com Medina e destacou que na próxima semana haverá um novo encontro para “continuar a encontrar soluções“. Admitindo que é “impossível” chegar a acordo em todos os aspetos, Stanisic sublinhou que “há muitas medidas que foram discutidas em conjunto e o próprio Fernando Medina estava de acordo com uma parte delas”.

O cozinheiro deixou ainda críticas à AHRESP, associação que representa o setor da restauração e hotelaria. “A AHRESP já devia ter estado aqui com esse papel e trazido soluções. Sou associado, pago as minhas quotas, estava à espera de mais”, afirmou Stanisic, que sublinhou a importância do encontro direto com Medina e destacou que o autarca de Lisboa “teve uma conversa diretamente com [o ministro Pedro] Siza Vieira a marcar uma reunião para estas soluções, por isso espero que sejam breves“.

Quando, durante a tarde, a Câmara Municipal de Lisboa confirmou ao Observador a realização da reunião, salientou que Medina se encontraria com os manifestantes na qualidade de responsável político da cidade de Lisboa — não como mediador do conflito entre o grupo e o Governo.

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Ao lado de Stanisic e Gouveia, o presidente da Câmara de Lisboa destacou não haver “nenhuma guerra” e classificou o encontro com os representantes do movimento como uma “conversa de olhos nos olhos, franca, de quem conhece bem a realidade da cidade, do país, de quem ouve os relatos de viva voz”, destinada a “encontrar pistas, saídas, respostas, canais para procurarmos apoiar a resolução de uma situação que é muito delicada para toda a gente”.

Acho que todos somos de menos. Neste momento que o país vive, em que tantas famílias tem tantas dificuldades, tantas empresas, tantas pessoas, que dedicam a sua vida aos seus restaurantes, aos seus comércios, aos seus bares, muitos que fizeram a cidade de Lisboa chegar à pujança que chegou“, sublinhou Medina, como forma de justificar a sua intervenção no conflito. “Todos somos poucos para nos juntarmos e tentarmos encontrar as soluções para uma situação que é muito dolorosa para muitas pessoas”, acrescentou o autarca, apelando a que não se perca “um sentido de humanidade”.

Medina salientou que existe da sua parte um “compromisso firme” no sentido de encontrar soluções para a restauração e comércio e deu como exemplo a iniciativa de apoio ao setor lançada pela autarquia neste mês.

Os manifestantes estiveram uma semana em greve de fome em frente ao Parlamento, em protesto contra as medidas restritivas que têm prejudicado especialmente o setor da restauração, e têm consumido apenas água e chá, que lhes tem sido levado por apoiantes do movimento. Exigiam falar diretamente com António Costa ou com o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, tendo recusado encontros com secretários de Estado.

A intervenção de Fernando Medina surge numa altura em que a tensão entre os manifestantes e o Governo atingiu o pico, depois de dois dos grevistas, incluindo o chef Stanisicterem necessitado de assistência médica por se terem sentido mal. O cozinheiro chegou a ter de ser hospitalizado durante a última noite.