Um volte-face nas posições assumidas pelo Ministério Público e pela juíza titular dos autos permitiu a emissão a dos mandados de condução à prisão de três arguidos do processo Face Oculta (José Penedos, Paulo Penedos e Domingos Paiva Nunes) um ano após o trânsito em julgado dos respetivos acórdãos condenatórios. O advogado Paulo Penedos já se apresentou esta manhã no Estabelecimento Prisional de Coimbra para cumprir a pena de quatro anos por um crime de tráfico de influência.

À entrada para o estabelecimento prisional, Paulo Penedos questionou à TVI o momento da decisão: “Um processo que se arrastou ao longo de 10 anos sem ser por nossa culpa, porque é que agora a 15 dias do Natal se toma esta decisão?” Ao Observador, o seu advogado Ricardo Sá Fernandes afirmou que “o dr. Paulo Penedo levou a luta até onde pôde. Emitidas as ordens legítimas para se apresentar no estabelecimento prisional, acatou essa ordem como é seu dever”.

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Já Domingos Paiva Nunes, condenado a uma pena de três anos e seis meses por corrupção, solicitou, segundo o JN, que seja conduzido ao Hospital Prisional de S. João de Deus, em Caxias, alegando problemas de saúde. O cumprimento da pena de José Penedos também poderá vir a ocorrer num hospital prisional devido igualmente a problemas de saúde.

Tudo começou no dia 30 de novembro quando a procuradora que acompanha o processo Face Oculta no Tribunal de Aveiro promoveu a emissão dos mandados de condução à prisão daqueles três arguidos, tendo a juíza Isabel Ferreira de Castro deferido tal promoção na última sexta-feira, dia 4 de dezembro.

Recorde-se que o Observador noticiou em primeira mão no dia 26 de novembro a demora na execução das penas de prisão dos Penedos e de Paiva Nunes quando os autos tinham transitado em julgado há um ano. Naquele momento a juíza Isabel Ferreira de Castro entendia que, apesar da Relação do Porto ter mudado a fixação dos últimos recursos pendentes para devolutivo, tinha de esperar pela decisão do Tribunal Constitucional que ainda iria apreciar um novo recurso das defesas dos Penedos e de Paiva Nunes. O próprio Ministério Público de Aveiro tinha dúvidas sobre a situação e nada fez.

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Após o Conselho Superior da Magistratura ter garantido ao Observador que estava atento à situação e a recolher informação, tudo se precipitou. Em primeiro lugar, o Ministério Público começou por promover a emissão dos mandados de condução à prisão e a própria juíza Isabel Ferreira de Castro mudou de posição e ordenou a detenção dos Penedos e de Paiva Nunes.

Assim, o Tribunal de Aveiro emitiu mandados para que a GNR de Vila Nova de Poiares e de Albufeira possa conduzir à cadeia estes três arguidos ( o que, para o caso de Paulo Penedos já não será necessário).

O advogado de José Penedos já requereu a suspensão do mandado emitido, alegando que se encontra ainda pendente um recurso e lembrando o estado de saúde débil do seu cliente, que tem 75 anos. 

José Penedos e o filho foram condenados em setembro de 2014

Do total de 11 arguidos condenados em 2014 a penas de prisão — que foram confirmadas pelo Tribunal da Relação do Porto em 2017 e pelo Supremo em 2018 (em relação a Manuel Godinho) —, passarão assim a ser seis os que estão atualmente a cumprir a pena desde janeiro de 2019. Juntando-se assim a Armando Vara (ex-vice-presidente do BCP e ex-ministro, que cumpre pena de cinco anos em Évora), Manuel Guiomar (ex-funcionário da Refer, condenado a pena de seis anos e seis meses) e João Manuel Tavares (ex-funcionário da Petrogal, que cumpre pena de cinco anos e 9 meses).

Afonso Costa e Manuel Gomes (funcionários da Lisnave) viram a Relação do Porto determinar a suspensão das penas de prisão efetiva de, respetivamente, quatro anos e de quatro e quatro meses pelos crimes de corrupção passiva no setor privado e burla qualificada. Enquanto Manuel Godinho, o principal réu do processo Face Oculta, e o seu sobrinho Hugo Godinho ainda aguardam o trânsito em julgado de um último recurso relacionado com o cúmulo jurídico aplicado pelo Tribunal de Aveiro em Março de 2020

Manuel Godinho tem pendente uma pena de prisão efetiva de 12 anos por 35 crimes depois do STJ ter rejeitado a 19 de novembro de 2020 um recurso sobre o cúmulo jurídico. O sucateiro de Ovar ainda poderá recorrer para o Tribunal Constitucional desta decisão. O mesmo se passa com o seu sobrinho Hugo.

Defesa pede a Tribunal que dê sem efeito ordem de prisão devido à “delicada e grave situação de saúde” de José Penedos

O arguido José Penedos tem a situação mais complexa por padecer de uma doença grave. A sua defesa, a cargo de Rui Patrício, discorda veementemente que os autos tenham transitado em julgado para os Penedos e para Paiva Nunes desde 25 e 26 de novembro — apesar da própria juíza Isabel Ferreria de Castro ter assumido isso mesmo num despacho datado de 20 de janeiro de 2020 que foi revelado pelo Observador.

Segundo um comunicado emitido por Rui Patrício, “a defesa do senhor engenheiro José Penedos (…) transmitiu ao Tribunal nas últimas 48 horas a sua posição sobre as questões jurídicas e processuais que entende relevantes, bem como a sua profunda discordância com a oportunidade processual da emissão de mandado.”

Sem especificar o que está a requerer ao tribunal, a defesa de José Penedos diz ainda que, tendo em conta a “delicada e grave situação de saúde do senhor engenheiro José Penedos, bem como dos atos médicos recentes e em curso”, espera que se verifiquem  “as necessárias consequências de tal situação.”

Ao que o Observador apurou, Rui Patrício requereu ao Tribunal de Aveiro que dê sem efeito a emissão do mandado de detenção emitido para José Penedos.

Certo é que, não tendo o Presidente da República emitido um indulto para José Penedos, a pena de prisão terá de ser sempre cumprida. Atendendo à situação de saúde do arguido, a pena poderá ser cumprida num hospital prisão.

[Artigo atualizado às 10h24 com a informação de que Paulo Penedos já se entregou na prisão de Coimbra]