Esperava-se um combate aceso entre os dois candidatos que, segundo as sondagens, disputam o segundo lugar e, quem comprou bilhete, não terá ficado desiludido. Ana Gomes e André Ventura disseram frente a frente o que dizem há meses pelo twitter um do outro: “Fascista” de um lado, “antidemocrata”, do outro; Trump como arremesso de um, Sócrates de outro. Ana Gomes não conseguiu esconder o desprezo, em alguns momentos por Ventura, tratando como “aquele senhor” ou “esse senhor”. Ventura, na mesma linha, ia alternado entre “dra. Ana Gomes” e “esta senhora” e voltou a atirar Paulo Pedroso e José Sócrates. Ambos não resistiram em atirar o passado contra o adversário.
Era o segundo lugar que está em causa o que, numa eleição com um vencedor antecipado, não é coisa pouca. Se André Ventura admitiu que Ana Gomes é a sua “principal adversária” porque Ana Gomes representa “tudo aquilo que o país não deve ser”, a socialista garante que o seu “principal adversário” é Marcelo Rebelo de Sousa porque acredita que pode ser Presidente da República. Mas disfarçou mal. Atirou até o próprio Marcelo contra Ventura, lembrando que dias antes o Presidente revelou que o líder do Chega tem “um registo de coelhinho” nas audiências em Belém e que nos debates se transforma em “modo gatarrão“. Ventura negou e lamentou que o chefe de Estado tivesse revelado “conversas privadas”.
Foi sempre parada-resposta. Ana Gomes acusou o adversário de ser um “boneco” de “poderes ocultos“, com alusões à banca e ao setor imobiliário. Ventura disse que antes ser “um boneco antissistema que um boneco de José Sócrates, Paulo Pedroso ou dos seus amigos do Irão”. Não era a primeira vez que o candidato apoiado pelo Chega falava do antigo primeiro-ministro, pois já antes tinha dito: “Gosto da moralidade desta senhora quando há uns anos estava aos beijinhos a José Sócrates”. Ana Gomes contra-atacou ao dizer que “como funcionário da Autoridade Tributária ajudou o patrão de Sócrates, Lalanda de Castro, a escapar ao fisco”.
Ana Gomes lembrou a invasão no Capitólio nos EUA, dizendo que é esse tipo de riscos que combate em Portugal ao enfrentar André Ventura e disse mesmo que “o seu ídolo é Trump“. “O meu ídolo é Deus“, respondeu de imediato Ventura. A socialista continuou e acusou o candidato do Chega de querer “destruir a democracia”, numa estratégia de presidencializar que, lembra, foi utilizada quer por “fascistas, quer nazis, quer totalitários estalinistas”.
Já André Ventura respondeu que a socialista é que é “anti-democrata”, já que defende a “ilegalização do Chega”, diz que não daria posse a um Governo apoiado pelo Chega e militou no MRPP. Disse-o ao mesmo tempo que mostrava um cartaz a dizer: “Morte aos traidores!” Ana Gomes já tinha a resposta na ponta da língua para dizer que foi apenas um “soldado raso” no partido, ao contrário de “um antigo líder” do “antigo partido de André Ventura [o PSD]”, que era dirigente (Durão Barroso). Além disso, a socialista diz que tem uma “marca na cara da vergastada de um PIDE, de um tempo que muita gente lutou contra a ditadura”. Pelo caminho ai lembrou que o Chega foi “legalizado com assinaturas falsas, incluindo de pessoas já falecidas”.
Sobre o adiamento das eleições, Ana Gomes diz que a democracia “não deve ser suspensa” e que só aceitaria isso em condições muito extremas. Apesar de acreditar que em termos jurídicos é muito difícil — por implicar revisão constitucional — André Ventura não estaria “totalmente disponível”, já que acredita que “quanto mais tempo tiver de campanha”, mais irá ganhar. E acrescentou uma provocação a Ana Gomes: “Acho que Ana Gomes passa para quinto ou em sexto”.
Ana Gomes lembrou ainda que André Ventura ainda esta sexta-feira “esteve com uma fascista que quer destruir a Europa”, questionando: “O que seria dos emigrantes portugueses se esta senhora tivesse esse discurso quando foram por essa Europa fora?”. O líder do Chega respondeu a dizer que a líder da Frente Nacional “tem hoje muitos dirigentes no seu partido que são lusodescendentes”.
Ventura utilizou ainda, ao longo do debate, um recurso habitual: mostrar uma fotografia. Uma delas publicação de um dirigente do PAN, partido que apoia Ana Gomes, onde se vê um ataque a um polícia. Ana Gomes chegou a acusar André Ventura de querer arrastá-la para lama, mas disse não ceder aquilo que chamou de “truques”.