A pandemia de Covid-19 deixou milhares de cabo-verdianos sem trabalho no turismo, sobretudo na ilha do Sal, mas um sindicato local quer evitar situações como esta e propõe-se criar um fundo de emergência para os associados.
“Vamos ter de contar todas as moedinhas e ver onde se pode ir buscar [o dinheiro]”, começa por explicar, em entrevista à agência Lusa, em Espargos, o presidente da direção do Sindicato de Indústria, Comércio e Turismo (SICOTUR), Mário Correia.
O sindicato é regional, mas abrange os trabalhadores do turismo no Sal, que o responsável estima serem cerca de 8.000 naquela ilha, a mais turística de Cabo Verde e cujo aeroporto internacional movimentava anualmente, antes da pandemia, mais de um milhão de viajantes.
Contudo, admite, sem o retorno do turismo como em anos anteriores, “grande maioria não está a trabalhar” ou apenas para “necessidades pontuais” e dentro do regime de lay-off, que permite algumas horas de trabalho por semana.
“É insignificante a quantidade de trabalhadores a trabalhar. A pandemia paralisou tudo, deixou estragos extremamente grandes e cuja reparação não será fácil (…) A maioria dos trabalhadores vêm de outras ilhas e muitos foram de volta para ilhas de origem, isso criou uma instabilidade enorme, situações imprevisíveis”, alerta o sindicalista.
Numa ilha antes com cerca de 35.000 habitantes, em que o turismo mexe com todas as atividades, Mário Correia confessa que há quem passe dificuldades e que a situação é “inegavelmente” difícil.
“Este foi um ano (2020), e agora iniciando 2021, um período, em que nunca vi coisa igual. O sofrimento é grande”, aponta.
E se nesta pandemia todos foram apanhados desprevenidos, o presidente deste sindicato do Sal diz que é tempo de preparar o futuro e prevenir dificuldades que voltem a surgir para este setor e para os seus trabalhadores.
“Esta pandemia obriga a que as instituições se preparem para eventuais situações iguais ou piores”, afirma, garantido que levará já em 26 e 27 de março à conferência do sindicato, o seu órgão máximo, um “pedido de reflexão” para criar uma “reserva” ou “fundo de emergência” para “apoiar de forma pontual” os seus associados.
“Há que haver qualquer coisa guardada para algo desta natureza”, defende Mário Correia, que está em fim de mandato no SICOTUR.
E enquanto esse fundo não avança, dependente do regresso do turismo e da retoma da atividade laboral dos associados, o tempo é de “desviar pequenas reservas” que o sindicato tinha guardado “para pequenos projetos”, como a conclusão das obras na sede, na cidade de Espargos, e assim apoiar associados “em situação difícil”, alguns a receber em ‘lay-off’ pouco mais de 10.000 escudos (90 euros mensais), nomeadamente em tratamentos clínicos ou na compra de medicamentos.
Ao “parar parte desse projeto da sede”, avaliado em 30 milhões de escudos (271 mil euros), explica ainda, a verba poderá ser usada para “apoiar pontualmente” os associados que mais precisam, tendo em conta a gestão financeira feita até agora. “Isto apesar de desde abril de 2020 as receitas do SICOTUR terem caído 60%, então com mais de 7.000 inscritos.
“Mas no SICOTUR não estamos preocupados com a quebra nas receitas, estamos preocupados com a perda de rendimentos dos trabalhadores”, assume o sindicalista, explicando que o passo seguinte é deixar de ser uma organização sindical para passar a ser também uma instituição de prestação de serviços aos associados.
Sobre a realidade atual admite “pequenos sinais de retoma”, com alguns grupos de turistas que começam a chegar ao Sal, que são “animadores”, mas recorda que o turismo de Cabo Verde, face à situação nos países europeus, principal origem do turismo no arquipélago enfrenta ainda “muitas incertezas”.
E mesmo com o regime de lay-off em vigor desde abril – que garante 70% do salário, suportado até agora em partes iguais pelo sistema de segurança social e pelas empresas – o SICOTUR admite preocupação com o futuro e com os despedimentos, que “já se registam no Sal”.
“Os trabalhadores do setor do turismo sofreram bastante, primeiro porque os salários já eram baixos. E quando se recebe 70%, a situação fica muito mais complicada”, diz.
Ainda assim, elogia a resposta do Governo, ao “partilhar responsabilidades” entre o Estado e os empregadores, no modelo de suspensão do contrato de trabalho, “caso contrário seria bem pior”.
“O futuro é incerto e é preciso preparar para isso”, remata.