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A poesia, a moda e o plano de chegar à Casa Branca. Quem é Amanda Gorman, o novo ícone de estilo?

Este artigo tem mais de 3 anos

Poesia e moda. Aos 23 anos, ela provou que domina ambas as armas. Em janeiro, o casaco amarelo Prada ecoou quase tão alto como os versos de "The Hill We Climb". Afinal, quem é Amanda Gorman?

2019 Boston Pops Fireworks Spectacular
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Boston Globe via Getty Images

Boston Globe via Getty Images

A jovem poetisa reúne todos os ingredientes necessários para produzir um fenómeno em 2021. Além de autora talentosa, é uma promissora defensora dos direitos humanos, especialmente vocal em campos como o feminismo, a opressão e o racismo. A isto, há que juntar uma figura carismática, apesar da idade. Aos 23 anos (as velas são sopradas este domingo precisamente), Amanda Gorman soma à profundidade dos seus ideais uma imagem imediatamente empática.

O gosto pela moda surge com naturalidade e é habilmente trabalhado pelo seu conselheiro de serviço, o stylist Jason Bolden. No dia 20 de janeiro, deu-se a conhecer ao mundo ao ler o poema The Hill We Climb na tomada de posse de Joe Biden. Se no início da cerimónia muito se perguntaram quem era a rapariga de amarelo entre os convidados, horas depois o nome de Amanada Gorman era já um dado adquirido. No Instagram a jovem poetisa passou de 50 mil a 2,9 milhões de seguidores no Instagram, em apenas dois dias. Conta, atualmente, mais de 3,6 milhões.

Amanda Gorman na capa da revista Time, em fevereiro deste ano

Defini-la como um ícone de estilo seria redutor. Mas não há como negar que Gorman é um fenómeno completo, capaz de, simultaneamente, agitar as redes sociais e fazer furor entre os intelectuais, com um livro publicado (e dois a caminho) e uma passagem por Harvard. Há menos de um mês, o protagonismo e a influência puseram-na na capa da revista Time, uma entrevista conduzida por Michelle Obama. Os planos para o futuro são ambiciosos. Estamos em 2021, a poesia já a fez chegar longe, mas dentro de 15 anos a jovem Amanda quer estar na corrida à Casa Branca.

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Da terapia da fala ao louvor de Harvard. Quem é Amanda Gorman?

Amanda nasceu em Los Angeles, corria o ano de 1998. Os bares e restaurantes da Califórnia eram, há poucos meses, locais livres de fumo, e o país já assistia ao desenrolar do escândalo Lewinsky. Filha de uma professora de inglês, cresceu numa família monoparental e praticamente entre mulheres, com uma irmã gémea chamada Gabrielle e o irmão Spencer. O acesso à televisão era muito limitado, por isso, desenvolveu cedo o apetite pelos livros. A poesia destacou-se na lista de interesses quando, aos oito anos, uma professora lhe leu um poema de Ray Bradbury. Terá sido com essa mesma idade que escreveu os primeiros poemas.

Black Girls Rock! 2018 - Red Carpet 2019 Forbes Women's Summit American Black Film Festival Honors Awards Ceremony - Arrivals

A evolução de Amanda Gorman: eventos em 2018, 2019 e 2020

Getty Images for BET

Questionada inúmeras vezes sobre o que a levou a desenvolver-se tão precocemente enquanto autora, Gorman tem apontado a mãe, Joan Wicks, como uma importante influência — a par de referências como Maya Angelou, entre outras. “O que contribuiu para ter começado a escrever tão cedo foi o encorajamento da minha mãe. Ela mantinha a televisão desligada porque queria que eu e os meus irmãos fôssemos interessados e ativos. Então, construíamos fortes, montávamos peças e musicais e eu escrevia loucamente”, revelou em 2018, numa entrevista ao The New York Times.

“Tenho a certeza de que a minha mãe me vai descrever como uma menina precoce, mas, olhando para s tempos da escola primária, acho que era mais uma criança estranha. Passei a maior parte da escola primária convencida de que era uma extraterrestre. Literalmente”, referiu na mesma entrevista.

Gorman teve de se esforçar para ser uma fluente oradora. Ainda em criança, lidou com dificuldades na fala e com uma hipersensibilidade auditiva que, à partida, lhe negariam o dom da palavra. Fruto de horas de terapia e de muita determinação, tal não aconteceu. “Sempre encarei isto como um ponto forte, porque a partir do momento em que me deparei com esses obstáculos orais e auditivos, tornei-me mesmo muito boa a ler e a escrever”, partilhou numa entrevista dada em 2018. Cantar foi um dos mecanismos encontrados para vender os problemas de dicção, sobretudo no que diz respeito à letra r.

Um dos looks partilhados pelo stylist, com um vestido Alexander McQueen e sapatos Christian Louboutin

Aos 17 anos, publicou o primeiro livro — The One for Whom Food Is Not Enough. Em 2016, uma bolsa de 10 mil dólares garatiu-lhe acesso à universidade, mas não a uma qualquer. Amanda estudou Sociologia em Harvard e foi lá que começou a dar nas vistas. O ano seguinte seria glorioso para Gorman — foi a primeira jovem poetisa a ser incumbida de abrir a temporada literária na Biblioteca do Congresso e a primeira a receber o título de National Youth Poet Laureate, distinção criada em 2017 e que, desde então, tem destacado anualmente jovens autoras emergentes.

Em 2018, a jovem poetisa corria o país a declamar poesia, chamando para si as atenções — foi destaque no The New York Times, viu um dos seus poemas exposto ao lado da obra de Elizabeth Bishop e foi considerada pela revista Glamour uma das “College Women of the Year”. No seguimento da distinção, declarou publicamente a intenção de um dia se candidatar à presidência dos Estados Unidos. “Ver como eu, uma jovem negra, posso inspirar os outros é algo que me faz querer continuar na política. Não quero apenas falar sobre grandes obras. Quero transformá-las em ações”. Em 2020, formou-se em Harvard com a distinção cum laude.

O dia 20 de janeiro de 2021

Nunca uma tão jovem poetisa (ou poeta) havia participado da tomada de posse de um presidente nos Estados Unidos da América. Amanda Gorman abriu caminho e mereceu a honra no último dia 20 de janeiro. O poema em questão — The Hill We Climb — foi escrito semanas antes, durante a invasão do Capitólio.

“Não tentei escrever algo que retratasse aquele acontecimento como algo irregular ou diferente da América que conheço. A América é uma confusão. Ainda está no desenvolvimento de todo aquilo em que nos podemos tornar e tenho de reconhecer isso no poema. Não é algo que possa apagar ou ignorar. Por isso, escrevi um poema inaugural que reconhece essas cicatrizes, essas feridas. Tenho a esperança de que nos ajude a curá-las”, adiantou em entrevista ao Los Angeles Times, dias antes da cerimónia.

Ainda em vésperas do acontecimento mais marcante da sua curta carreira, Gorman partilhou com a CBS aquele que continua a ser o seu ritual de preparação para discursar em público, um mantra que repete interiormente antes de “fazer o que tem de ser feito” — “Sou filha de escritores negros. Somos descendentes dos que lutaram pela liberdade, quebraram as correntes e mudaram o mundo. Eles chamam-me”.

As repercussões da presença de Amanda na tomada de posse de Biden e Harris foram imediatas e muito além das métricas do Instagram. Os seus dois livros com lançamento marcado para 2021 — The Hill We Climb: Poems e Change Sings: A Children’s Anthem — ascenderam diretamente à lista dos mais procurados da Amazon. Dias depois, o nome da poetisa era anunciado como cabeça de cartaz da final do campeonato de futebol americano. “Ter poesia no Super Bowl é uma conquista para a arte e para o nosso país, porque significa que estamos a pensar de forma imaginativa nas ligações humanos, mesmo num contexto de isolamento”, escreveu a própria no Twitter, horas antes do espetáculo.

59th Presidential Inauguration

Amanda Gorman na tomada de posse de Joe Biden e Kamala Harris

CQ-Roll Call, Inc via Getty Imag

Outra das consequências daquela exposição sem precedentes foi o quase imediato agenciamento pela IMG Models, que garantiu a representação de Gorman (bem como de Ella Emhoff, outra das revelações do dia 20 de janeiro) nas indústrias da moda e da beleza.

Amanda e a moda

Hoje, vestida de Prada dos pés à cabeça. Amanhã, a experimentar um Alexander McQueen em frente ao espelho. O gosto de Amanda é para lá de apurado no que toca ao guarda-roupa. Na tomada de posse de Biden e Harris, fez um brilharete com o casaco amarelo e a bandolete vermelha, ambas as peças assinadas pela marca italiana com a qual mantém uma relação desde fevereiro de 2019. Convidada na altura para marcar presença na Semana da Moda de Milão, chegou a escrever um poema com o título “A Poet’s Prada”, depois publicado na Vogue.

Prada -Arrivals and Front Row: Milan Fashion Week Fall/Winter 2019/20 Private Opening of 'Il Sarcofago di Spitzmaus e altri tesori' exhibition at Fondazione Prada

Amanda Gorman em dois eventos da Prada, em Milão

Getty Images for Prada

O efeito Gorman foi além do deslumbramento da imprensa especializada — de acordo com a plataforma e e-commerce Lyst, a procura por bandoletes aumentou 40% e a pesquisa “casaco amarelo” disparou 1.328% durante a noite, segundo a WWD. Impacto idêntico teve o visual escolhido pela poetisa no espetáculo que antecedeu o Super Bowl — um casaco azul metalizado, com pérolas, de assinatura Moschino, que fez aumentar em 94% a procura por casacos da marca na mesma plataforma.

Não haja enganos. Por muito natural que o gosto pela moda possa ser (e que certamente a distingue de outras jovens ativistas de relevo como Malala Yousafzai e Greta Thunberg), Amanda conta com uma ajuda de peso. Enquanto stylist, Jason Bolden não se limita a vestir celebridades para arrasarem na passadeira vermelha. Conhecido por estar por trás dos visuais de Alicia Keys, Cynthia Erivo e Storm Reid (as duas últimas, atrizes negras que têm tomado Hollywood de assalto), especializou-se em trabalhar a imagem de estrelas cuja voz vai para lá da música e do cinema. São elas os novos ícones.

https://www.youtube.com/watch?v=wvk1EwXUsZ4&ab_channel=MadameFigaro

“Gorman e outros podem ter sido outsiders da indústria, mas estão focados em ser ativos em questões muito atuais. Eles podem muito bem ser os novos embaixadores de uma marca de moda, no meio dos estragos causados pela pandemia, mas também de uma exclusividade ultrapassada e de um historial de superprodução, numa altura em que os consumidores já não estão interessados nisso”, escreveu a editora Tara Donaldson para a WWD, na ressaca da reveladora aparição da jovem poetisa no dia 20 de janeiro.

Seja pela força das suas palavras, pela eventual carreira brilhante na política ou pelo genialidade do seu guarda-roupa, uma coisa é certa: ainda vamos ouvir falar muito de Amanda Gorman.

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