Ruizinho de Penacova fazia entre 140 a 160 espetáculos por ano nos arraiais das aldeias portuguesas e das comunidades de emigrantes antes de chegar a pandemia que o fez trocar o acordeão pelo volante de um camião de mercadorias.

Sem apoios e sem arraiais, aos 38 anos, valeram-lhe as poupanças arrecadadas com a concertina e o acordeão e alguns serviços como motorista de pesados.

“É muito depressivo, para quem chegava a fazer 10.000 quilómetros por mês sempre em contacto com o povo”, desabafou em entrevista à agência Lusa um dos muitos músicos impedidos de desenvolverem a atividade de que sempre viveram, fora dos grandes centros urbanos e longe do acesso aos centros de decisão e manifestação.

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Filho de acordeonista, começou por tocar bateria nos arraiais em que o pai atuava, até que decidiu que queria ocupar o lugar da frente no palco. “Comecei a pegar no acordeão do meu pai, que às vezes estava lá em casa, em cima de um banco, e fui-lhe apanhando o jeito”, contou.

Há 20 anos que percorre os arraiais portugueses com mais dois ou três músicos. Define-se como “um homem da borga”, que quando vai para as aldeias é para fazer “rir, dançar e cantar”.

Discípulo de Quim Barreiros, a quem tem por padrinho e inspiração, Rui, Cantador de Penacova, é conhecido pelo talento para a desgarrada e pelas letras apimentadas.

“Eu sou um homem da borga! Quando vou tocar para as aldeias, já sabem ao que vou e eles também sabem ao que vão. Vão ali passar um bocadinho de borga, vão dançar, vão-se rir”, assumiu, definindo a música que toca como “muito terra a terra”, dentro do folclore e do registo popular.

“No fundo, sou um mensageiro das tradições. O que eu faço já se fazia antes de eu nascer”, frisou.

Já marcou presença em programas de televisão e nas festas estudantis de Coimbra e do Porto. Sabe que nem todos lhe apreciam o estilo, mas orgulha-se de levar alegria às aldeias e aos emigrantes: “As pessoas às vezes andam doentes, andam tristes e durante aquele bocadinho [de baile], esquecem os problemas”.

“Na emigração só não fui a Macau. Somos muito requisitados para a emigração. Nesta altura do ano, como não há muitas festas cá, costumava estar no Canadá”, recordou.

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O Brasil e os Estados Unidos faziam igualmente parte do itinerário de inverno. Pela Europa, deslocava-se também com alguma frequência. “Cheguei a apanhar aqui um avião ao sábado de manhã e a voltar na manhã seguinte, no primeiro voo, para vir fazer uma festa a Portugal”.

Agora aproveita o tempo de paragem para escrever músicas e não compreende a falta de apoio do Estado, mas desistiu de “andar a mendigar”.

“A gente conforme foi ganhando o dinheirinho, foi-o poupando. Agora temos um pezinho de meia que dá para segurar um bocadinho o barco, mas ele também tem um fim”, referiu.

“À vezes vou ali fazer uns serviços. Como tenho carta de condução de pesados articulados, às vezes também vou conduzir. Conduzo um camião e vou assim passando o tempo”, disse, conformado, mas com esperança de que o tempo volte a colocá-lo na rota dos arraiais.

Alguns colegas tiveram de emigrar, muitos estão endividados. “A minha sorte foi ter-me precavido antes, ir poupando e não ter uma estrutura muito grande, ter uma coisa pequenininha, porque tenho aí colegas, coitados, com camiões parados, estruturas muito grandes, e isso é muito complicado voltarem outra vez ao ativo”, revelou.

“Há muita gente que tem subsídios disto, recebe daqui, recebe de acolá. Eu não recebo nada. Tenho a Sociedade Portuguesa de Autores (SPA), como sou autor e compositor, de vez em quando lá vem alguma coisinha, mas nunca dei importância a isso, porque era sempre um extrazinho, não é para viver com aquilo, agora apoios nenhuns, nada!“, lamentou.

Este ano, no que diz respeito à agenda dos espetáculos, nem o telefone toca.

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