Eduardo Cabrita, admitiu, em entrevista à Lusa, a possibilidade de as eleições autárquicas, previstas para setembro ou outubro, se realizarem em dois fins de semana devido à pandemia de Covid-19. Perante as declarações do ministro, os partidos têm vindo a reagir ao longo desta sexta-feira.

O PCP pede “cautela”, enquanto que o PSD defende que só o adiamento das eleições poderá resolver o problema. Já o Bloco de Esquerda critica o Ministério da Administração Interna por não colocar a opção do voto antecipado em cima da mesa.

Ministro da Administração Interna admite eleições autárquicas em dois fins de semana

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O ministro da Administração Interna afirma que nas eleições autárquicas “não está previsto o voto antecipado”, mas existe “abertura para ponderar modelos”, sendo “a distribuição do voto entre dois fins de semana perfeitamente possível”.

PCP alerta para complexidade de eleições em dois fins de semana e pede cautela

O PCP admitiu esta sexta-feira discutir a proposta do ministro da Administração Interna de realizar as eleições autárquicas em dois fins de semana, mas alertou para a complexidade do processo, rejeitou “experimentalismos” e pediu “cautela”.

“Nós não excluímos obviamente discutir hipóteses que possam facilitar a vida aos eleitores, mas temos que ter o cuidado para não estarmos a complicar em vez de resolver problemas. E, portanto, é com cautela, sem excluir liminarmente, que encaramos esta possibilidade”, disse à agência Lusa o deputado comunista António Filipe.

Para o deputado comunista, esta proposta “não pode deixar de ser equacionada com toda a complexidade que envolve, porque há problemas complexos que, por exemplo, não existem em eleições presidenciais, mas existem em eleições autárquicas”.

António Filipe lembrou que estão em causa mais de 3.000 freguesias com diferentes boletins de voto e órgãos a eleger e que o voto antecipado em mobilidade “simplesmente não é possível dada a enorme diversidade de boletins de voto que existem”.

“Por exemplo, quando é que acabava a campanha eleitoral? Acabava antes do primeiro fim de semana ou depois do segundo fim de semana? Ou seja, íamos fazer o primeiro dia de eleições a meio da campanha eleitoral e a campanha eleitoral prosseguiria? Ou terminava a campanha eleitoral e depois ficávamos uma semana inteira em reflexão?”, questionou.

António Filipe questionou também como seria assegurada “a guarda dos votos” durante uma semana, visto que estes não seriam votos em mobilidade, normalmente em número menor, mas sim milhares de votos.

“Quem é que pode votar no primeiro e quem é que pode votar no segundo, é à escolha?”, voltou a perguntar. Face a estas interrogações, o deputado comunista sublinhou que os processos eleitorais “têm que ser estáveis” e que é necessário “resolver problemas antes de avançar com propostas”, lembrando que “há uns anos atrás, quando se alterou a lógica dos cadernos eleitorais e os eleitores passaram a organizar-se por ordem alfabética, criou-se uma confusão que ia levando inclusivamente à queda do ministro da Administração Interna”.

“Há problemas que têm que ser pensados porque não se pode arriscar a que o processo eleitoral corra mal porque isso teria consequências gravíssimas, e, portanto, não se pode fazer experimentalismos com as eleições. Há que ponderar muito bem todas as implicações daquilo que se propõe e isso ainda não vimos”, rematou.

PSD defende que só adiamento das eleições resolve “problema de fundo”

O PSD manifestou-se  “disponível” para analisar a realização das autárquicas em dois fins de semana, admitida pelo ministro da Administração Interna (MAI), mas defendeu que só o adiamento por dois meses das eleições “resolve o problema de fundo”.

Questionado pela Lusa, o secretário-geral e coordenador autárquico do PSD, José Silvano, considerou que esta é “a primeira reação do Governo em que reconhece as dificuldades que pode ter o ato eleitoral” autárquico, se se realizar na data prevista.

“Ao reconhecer que é preciso tomar medidas para aumentar a participação dos cidadãos – e essa pode ser uma das medidas – esconde o problema de fundo: cada vez é mais pertinente a proposta do PSD, que vai ser discutida no dia 25, do adiamento do calendário eleitoral por 60 dias”, defendeu Silvano.

Para o dirigente social-democrata, se o Governo reconhece que só se poderá atingir a imunidade de grupo no final do verão, ou na melhor das hipóteses em agosto, “era prudente adiar em 60 dias o calendário eleitoral para que se pudesse fazer um debate de ideias e os cidadãos participassem mais”.

Questionado sobre a proposta em concreto de realização das eleições em dois fins de semana, respondeu: “Estamos disponíveis para analisar tudo o que venha melhorar a participação da vida dos cidadãos, agora respondemos com a nossa proposta de fundo”, reiterou.

“Se existem essas dificuldades, qual o problema de adiar eleições 60 dias e permitir a participação em condições normais? Porque não há 60 dias para se fazer uma campanha eleitoral participativa, ativa, próxima dos cidadãos e que leve as pessoas a votar?”, questionou. Confrontado com as reações até agora negativas da maioria dos partidos, incluindo PS, a esse adiamento, José Silvano disse esperar que até à discussão e votação da proposta, na próxima quinta-feira, possa “imperar o bom senso”.

“Não bastam estas pequenas medidas se, nessa altura devido à pandemia, a participação não puder ser totalmente feita. A proposta do PSD resolveria esse problema de fundo”, insistiu.

Questionado sobre a alteração da data das eleições, Eduardo Cabrita referiu que matérias de lei eleitoral são de “reserva absoluta” da Assembleia da República, mas afirmou também que não há qualquer certeza “de que a situação em dezembro possa estar melhor do que em setembro”.

O projeto do PSD propõe adiar – excecionalmente devido à pandemia de Covid-19 – este ato eleitoral por dois meses (entre 22 de novembro e 14 de dezembro), permitindo que a campanha decorra numa altura em que, segundo o plano de vacinação oficial, já se prevê que o país possa ter imunidade de grupo quanto à Covid-19.

BE critica “desistência à partida” do MAI sobre voto antecipado em mobilidade

O BE considerou que eleições autárquicas em dois fins se semana “não é a ideia mais feliz” e propõe soluções mais cautelosas, criticando a “desistência à partida” do ministro da Administração Interna sobre o voto antecipado em mobilidade.

Em declarações à agência Lusa, o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, admitiu que os desafios para um voto antecipado em mobilidade numas autárquicas são maiores do que noutro tipo de eleições, por exemplo presidenciais ou europeias, mas o ministro, “ao rejeitar liminarmente”, está a desistir “com demasiada facilidade de responder a algo que é um desafio, mas que não deixa de ter uma solução”, sendo preciso “vontade para preparar com tempo este processo”.

Para o BE, as alternativas apresentadas por Eduardo Cabrita merecem ser discutidas, mas o dirigente bloquista considerou que “a ideia de poder dividir em vários fins de semana [as eleições autárquicas] não é a mais feliz”.

Pedro Filipe Soares adiantou uma outra proposta, que garante ser mais cautelosa, que é a “possibilidade de, no mesmo fim de semana, mas em dois dias diferentes, fazendo uso do dia de reflexão, poder haver a votação”, limitando-se assim “alguns problemas que poderiam ocorrer de fraude ou de suspeição sobre resultados”.

“Qualquer umas das escolhas precisa de alteração dos processos eleitorais, garantindo que eles são à prova de bala no que toca às suspeições que um período de urnas fechadas tem necessariamente que corresponder”, avisou.

Há uma “omissão” do governante que o líder parlamentar bloquista lamenta, que se prende com o desdobramento dos locais de voto.

“O desdobramento de locais de voto parece ser daquelas medidas mais simples e mais diretas que deveriam também estar no cardápio de algumas primeiras hipóteses a trabalhar”, defendeu.

O BE, de acordo com Pedro Filipe Soares, tem toda a disponibilidade para discutir soluções desde que seja garantida “uma total transparência e segurança no processo” e, também, “que se maximiza as possibilidades de votação, de participação das pessoas, para garantir que a democracia é participada e plena, não limitada por quaisquer circunstâncias, mesmo que seja uma pandemia”.

Há um tema sobre o qual o dirigente bloquista acompanha o ministro da Administração Interna que é a data das eleições, que ainda não estão marcadas.”Não nos parece, neste momento, que haja dados que justifiquem uma alteração da data da votação. Teremos que acompanhar a situação para ver se no futuro também continua a fazer sentido manter as eleições no mesmo período”, afirmou.

Assim, o BE considera a “extemporânea e sem dados que a possam justificar” a proposta do PSD, que vai ser discutida no parlamento na próxima semana e que prevê o adiamento das eleições autárquicas do período setembro/outubro para novembro/dezembro.