A Tanzânia recusou asilo a cerca de 3.800 moçambicanos em fuga dos ataques armados em Palma, Cabo Delgado, durante o mês de maio, anunciou esta sexta-feira o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
“Em maio, quase 3.800 moçambicanos foram devolvidos à força da Tanzânia através do posto fronteiriço de Negomano, de acordo com as autoridades moçambicanas”, lê-se num relatório do ACNUR divulgado esta sexta-feira.
Aquele órgão das Nações Unidas entregou ajuda naquele posto a 25 de maio e entrevistou 68 pessoas, entre as quais, “uma mulher que deu à luz enquanto foi forçada pela Tanzânia a regressar a Moçambique, sem receber assistência médica ou ajuda”. O ACNUR fala de relatos “preocupantes” e exorta “os países vizinhos a respeitarem o acesso ao asilo para aqueles que fogem da violência generalizada e dos conflitos armados no norte de Moçambique”.
Na sede de distrito de Mueda, de que Negomano faz parte, o ACNUR entrevistou 26 moçambicanos “que confirmaram a repulsa sistemática e recorrente” por parte da Tanzânia, “bem como preocupações de proteção já anteriormente relatadas, como a separação das famílias e a falta de ajuda humanitária”. Os testemunhos dão conta também de raptos regulares de deslocados para integrarem os grupos rebeldes.
“A maioria das famílias devolvidas à força viajam espontaneamente para outros distritos de Cabo Delgado, Nampula e Niassa, uma vez que Mueda é visto como um local inseguro”, acrescenta o relatório. Mês e meio depois do ataque de insurgentes, Palma é também classificado como “inseguro”, segundo o documento.
A avaliação do ACNUR é feita face ao desejo de alguns deslocados, albergados num pavilhão desportivo em Pemba, que expressaram a vontade de regressar a casa. “Embora algumas famílias hospedadas no centro queiram regressar a Palma, as organizações humanitárias não estão a apoiar o retorno à área devido a preocupações de segurança”, refere-se.
Noutra área, o ACNUR está a sensibilizar a população contra atos de exploração e abuso sexual de que são vítimas as raparigas e mulheres deslocadas. “A maioria dos casos relatados estão relacionados com pedidos de favores sexuais por parte dos líderes comunitários em troca da inclusão de deslocados nas listas de distribuição de alimentos, o que representa uma grande preocupação no que respeita à exploração e abusos em Cabo Delgado”, conclui.
Grupos armados aterrorizam a província nortenha desde 2017, com alguns ataques reclamados pelo grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico, numa onda de violência que já provocou mais de 2.800 mortes segundo o projeto de registo de conflitos ACLED e 714.000 deslocados de acordo com o Governo moçambicano.
O número de deslocados aumentou com o ataque contra a vila de Palma em 24 de março, uma incursão que provocou dezenas de mortos e feridos, sem balanço oficial anunciado. A fuga de Palma continua e já provocou perto de 68.000 deslocados.
As autoridades moçambicanas anunciaram controlar a vila, mas os tiroteios têm se sucedido e a situação levou a petrolífera Total a abandonar por tempo indeterminado o recinto do empreendimento que tinha início de produção previsto para 2024 e no qual estão ancoradas muitas das expectativas de crescimento económico na próxima década.