O primeiro-ministro socialista apareceu à última hora na reunião do grupo parlamentar do PS, acompanhado pelo ministro das Finanças, para explicar aos deputados o Orçamento do Estado para 2022 que está em risco de chumbo, depois de PCP e BE terem dito que votam contra a proposta do Governo se ela ficar como está. Aos deputados, na intervenção inicial que foi aberta à comunicação social, o líder do PS disse não ter “nenhuma razão para achar que este ano não acontece o mesmo que aconteceu nos anos anteriores” e que consiga aprovar o Orçamento com o apoio da esquerda parlamentar.

Costa disse ter “confiança” na proposta que apresentou ao Parlamento, mas assume que “há sempre alternativas, há escolhas a fazer”. Quanto à sua proposta diz refletir as escolhas do Governo, mas “quem tem autoridade máxima em matéria orçamental é a Assembleia da República e a Assembleia da República pode fazer aqui outras decisões”, afirmou mantendo a porta aberta para negociações.

“Temos a humildade como sempre tivemos de saber dialogar e saber ouvir ao longo do debate, quer na apresentação na generalidade e entre essa e a votação final global”. Costa sabe que precisa de apoios além PS — tal como em todos os anos desde que é primeiro-ministro — e promete “ouvir, negociar e sair daqui com um Orçamento melhor” do que aquele que apresentou, diz piscando o olho à esquerda. Depois remata, desdramatizando o cenário de crise que vai crescendo: “Não tenho nenhuma razão para achar que este não acontece o mesmo que aconteceu nos anos anteriores”. O ministro da Economia tinha já usado na noite anterior, em entrevista à RTP, a mesma expressão sobre a negociação que se segue.

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Disparar medidas para conquistar esquerda: SNS e Trabalho

Na intervenção inicial e antes da reunião fechar a porta aos jornalistas para fazer o debate, Costa começou por fazer uma longa exposição das medidas mais emblemáticas do seu Orçamento, focando sobretudo a reposição de rendimentos e investimentos, nomeadamente no Serviço Nacional de Saúde. O líder socialista sublinha que nas três últimas legislaturas, o Governo “reforçou em 3.300 milhões de euros a dotação inicial” para o Serviço Nacional de Saúde. “Quase o dobro do que fizemos na totalidade da legislatura anterior”, acrescentou. Foi especialmente aplaudido pelos deputados que o ouviram quando falou nas medidas previstas no Orçamento sobre a autonomia de contratações do SNS.

Este é um tema caro à esquerda e, por isso mesmo, Costa anunciou ali que na próxima semana vai aprovar no Conselho de Ministros o novo estatuto do SNS, que decorre da Lei de Bases da Saúde, aprovada com o apoio da esquerda, e que aguarda regulamentação desde 2019. Uma situação que a esquerda tem contestado e que pressiona também na negociação deste Orçamento.

A mesma promessa para a Agenda do Trabalho Digno, que também disse já esta manhã que aprovará em Conselho de Ministros na próxima semana e que associa diretamente às negociações do Orçamento. É nesse âmbito que promete tratar a questão da caducidade da contratação coletiva, segundo disse aos deputados, abrindo outra porta à esquerda num tema que é caro, em particular ao PCP.

Também no salário mínimo nacional, onde a esquerda tem reclamado maior velocidade na atualização e onde o objetivo do Governo é chegar a 2023 com 750 euros, Costa deixou abertura para no próximo ano o país se aproximar “o mais possível desse objetivo para que o esforço em 2023 não seja excessivo”. Remeteu essa negociação para a concertação social, como habitualmente acontece em paralelo à negociação dos orçamentos. A ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, disse esta quinta-feira, em entrevista à RTP, que esse aumento será “pelo menos de 30 euros” em 2022, ou seja, um salário mínimo de 700 euros, no mínimo.

Uma das referências que fez na intervenção foi o “objetivo das contas certas” que este Orçamento mantém. “Não podemos achar que o Orçamento é uma moeda que não tem duas face, tem a face da despesa e da receita. E também do saldo entre as duas”, afirmou para avisar mais uma vez: “Temos de ter contas certas”.

Ainda assim, e quando a esquerda pressiona a negociação final do Orçamento já entregue para o viabilizar, Costa citou Jorge Sampaio quando este afirmou que “há mais vida para além do Orçamento”, para apontar ao PRR.

As maiores críticas foram para a direita, com António Costa a arrancar aplausos do auditório quando aconselhou todos “a ouvirem o que disseram os opositores sobre o que iria acontecer durante esta crise. Saímos desta crise de uma forma que nenhum imaginou”. O socialista acena com uma chegada ao final de 2022 “tendo não só recuperado tudo o que perdemos em 2020 e 2021, mas já estando acima de onde estávamos em 2019” e que é a “credibilidade” das previsões do se Governo que lhe permitem “fixar metas que sambemos que não estão para lá da nossa perna”.