Cerca de 160 euros à viúva e 43 euros a cada um das duas filhas é quanto recebe a família do trabalhador atropelado mortalmente em junho pelo carro oficial do ministro Eduardo Cabrita. Ao todo são 246 euros que a Segurança Social entrega e só a partir de setembro — três meses após o acidente —, à família de Nuno Santos, que era o único sustento do agregado.

A informação foi confirmada pelo advogado que representa a família ao jornal Público. José Joaquim Barros considera que este valor — que corresponde a 60% do valor que Nuno Santos receberia de reforma se fosse aposentado agora — é “muito pequeno”, já que a vítima tinha 43 anos e, “no máximo, 20 anos de descontos e também não tinha um salário muito elevado”.

O advogado sublinha que “a família só não morre de fome” porque a seguradora da empresa onde trabalhava o marido lhe paga uma pensão de pouco mais de 500 euros. A viúva e as duas filhas de Nuno Santos poderiam no entanto receber uma eventual compensação do Estado. Mas para isso era preciso, primeiro, que a investigação fosse concluída e, depois, que se provasse que a culpa era de quem conduzia o automóvel do Estado.

Só que cinco meses depois do acidente mortal a investigação ainda não terminou e o processo ainda se encontra em segredo de justiça — algo que tem sido contestado também pelo advogado José Joaquim Barros. As contradições continuam por esclarecer e o que aconteceu ao certo ainda é uma incógnita.

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Nuno atravessou a A6 e foi atropelado junto ao separador central. O acidente com o carro de Cabrita contado por quem estava no local

acidente aconteceu cerca das 13h15 de 18 de junho, ao quilómetro 77,6 da A6, perto da Azaruja, em Évora, no sentido Estremoz-Lisboa. Num comunicado emitido logo após o atropelamento, já com o caso em segredo de justiça — motivo alegado depois disso para não serem dados mais esclarecimentos — o Ministério da Administração Interna esclareceu que a viatura em que seguia Eduardo Cabrita “não sofreu qualquer despiste” e que a vítima “atravessou a faixa de rodagem, próxima do separador central, apesar de os trabalhos de limpeza em curso estarem a decorrer na berma da autoestrada”. Também o MAI não revelou até hoje a velocidade a que seguia o BMW.

Reconstituição do acidente com base em testemunhos de quem presenciou o acidente (ANA MARTINGO/OBSERVADOR)

O homem de 43 anos terá deixado temporariamente o grupo de trabalho que estava na berma e atravessou a faixa de rodagem até ao separador central. A vítima teria saltado por cima do rail de separador central para atravessar a estrada e regressar à berma, quando foi atingido pelo carro do ministro. Estaria de costas quando a colisão se deu. O corpo terá sido projetado no ar, tendo caído a cerca de quatro metros de distância, na valeta de cimento no separador central.

No comunicado emitido logo após o acidente, o MAI garantia que “não havia qualquer sinalização que alertasse os condutores para a existência de trabalhos de limpeza em curso”. Estas informações já foram desmentidas por fontes da Brisa, a empresa responsável pela manutenção da estrada, que tinha subcontratado a empresa Arquijardim, para a qual trabalhava a vítima — tal como noticiou o Observador.

O que dizem os trabalhadores também vai neste sentido: o trabalho de limpeza era feito em andamento, pelo que não era possível alertar os condutores com sinais de trânsito fixos — razão pela qual os trabalhadores eram protegidos à retaguarda por uma carrinha com um sinal luminoso. Além disso, os próprios usavam calças e coletes refletores para serem facilmente avistados — como era o caso de Nuno Santos, a vítima.

Acidente na A6. Sem câmaras no local, Brisa já terá concluído que trabalhos estavam sinalizados, o que contraria Cabrita