A Organização Mundial de Saúde (OMS) avisou que a variante Ómicron está a espalhar-se “a um ritmo nunca antes visto” noutras variantes do SARS-CoV-2 e que já estará na maioria dos países, mesmo naqueles que ainda não confirmaram qualquer caso positivo provocado pela nova linhagem. A OMS alerta ainda que a percentagem de casos globais da variante Delta do coronavírus está a cair pela primeira vez desde abril, no relatório semanal divulgado quarta-feira.

Em conferência de imprensa, Tedros Adhanom, diretor-geral da OMS, avisou esta terça-feira que as vacinas não bastam para controlar o impacto da variante Ómicron na realidade epidemiológica dos países. “As vacinas sozinhas não vão tirar nenhum país desta crise“, atirou:

Não são vacinas em vez de máscaras, não são vacinas em vez de distanciamento, não são as vacinas em vez da ventilação ou da higiene das mãos. Façam tudo isso, façam de forma consistente e façam bem”.

Tedros Adhanom diz-se preocupado que se esteja a desvalorizar a Ómicron, classificando-a como uma variante “mais leve”. Mesmo que a Covid-19 provocada por esta nova linhagem seja menos grave, é o elevado número de casos que ela pode causar (sendo mais transmissível) que torna tudo mais preocupante: “O grande número de casos pode mais uma vez sobrecarregar os sistemas de saúde despreparados”.

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O atual conhecimento sobre a variante Ómicron é limitado, mas as primeiras informações recolhidas na África do Sul, onde foi detetada originalmente, fazem crer que é mais transmissível que a variante Delta, podendo tornar-se dominante em relação a esta última.

Quanto à sua origem, permanece desconhecida e pode nunca ser revelada, mas um estudo em pré-publicação sugere que a nova variante do coronavírus pode ser resultado de uma recombinação de material genético do SARS-CoV-2 com o de um vírus da constipação comum ou do vírus da sida, quando os dois agentes patogénicos infetaram a mesma pessoa ao mesmo tempo.

Uma análise genética da NReference, uma empresa de dados biomédicos norte-americana, sugere que pelo menos uma das mutações da variante Ómicron pode ser um trecho de material genético de outro vírus. Essa mistura pode ter acontecido nas células de um hospedeiro simultaneamente infetado pelo SARS-CoV-2 e por esse esse segundo vírus.

Variante Ómicron pode ter surgido numa pessoa infetada com outro vírus

A porção de material genético não estará em nenhuma outra variante do SARS-CoV-2, mas também estará incorporada no genoma humano — porque parte dele é, de facto, obtido através dos milhares de anos de interação com o mundo viral. A teoria dos investigadores é que esta mutação pode não ser reconhecida pelo sistema imunitária, permitindo ao vírus escapar à vigilância do organismo.

Miguel Castanho, bioquímico do Instituto de Medicina Molecular, explicou ao Observador que há dois mecanismos principais a partir dos quais podem surgir novas variantes: através de mutações, erros que acontecem quando o vírus se multiplica no interior das células de alguém infetado; ou através dessas recombinações, quando dois vírus diferentes infetam a mesma célula ao mesmo tempo.

As recombinações acontecem quando o material genético de um dos vírus se mistura com o de outro agente patogénico, dando origem a partículas híbridas. A probabilidade de este mecanismo dar origem um vírus viável é extremamente baixa se os dois agentes forem muito diferentes — como a mistura entre o SARS-CoV-2 e o VIH. Mas se forem dois vírus semelhantes (como o SARS-CoV-2 e outros coronavírus, por exemplo) a probabilidade é mais alta.

Segundo Miguel Castanho, como os coronavírus das constipações convivem com os humanos há muito tempo, já amadureceram e evoluíram ao ponto de estarem muito adaptados. Esta transformação “pode ser um contributo de evolução e de adaptação” do SARS-CoV-2, tornando-o mais transmissível, mas eventualmente menos perigoso. Isso, no entanto, ainda não está cientificamente provado.

Quanto ao futuro do SARS-CoV-2, Paul Burton, diretor médico executivo da Moderna, disse que é “certamente possível” que uma nova variante venha a gerar-se pela fusão do material genética da Delta com a Ómicron, noticiou o Daily Mail.

Mas é raro que isso aconteça, ressalvou o médico e confirmou o bioquímico Miguel Castanho ao Observador: estes eventos de recombinação exigem condições muito específicas — um cruzamento de dois vírus ao mesmo tempo, no mesmo lugar. Mesmo a mistura de material genético é um fenómeno “aleatório” e mais raro que as mutações.

Casos da variante Delta estão a cair e Ómicron já tem transmissão comunitária, alerta OMS

A Organização Mundial da Saúde alertou esta quarta-feira que a percentagem de casos globais da variante Delta do coronavírus está a cair pela primeira vez desde abril, enquanto a Ómicron continua a crescer e já está presente em surtos de transmissão comunitária.

No relatório epidemiológico semanal, a organização destaca que, embora a maioria dos casos da variante Ómicron identificados desde novembro em mais de 70 países estejam relacionados com viagens, já existem fontes de contágio na comunidade.

No documento, a Organização Mundial da Saúde (OMS) destaca que a variante Delta, que em meados do ano já era a dominante no mundo e antes da Ómicron chegou a atingir 99,8% dos casos sequenciados, caiu para 99,2% na última medição realizada pela rede global dos laboratórios GISAID, que colabora com a organização.

Dos 879.000 casos sequenciados em laboratório pela rede nos últimos 60 dias, a grande maioria (872.000) ainda era da variante Delta, mas a Ómicron já representava 3.755 casos (0,4%), quando há uma semana essa percentagem era de 0,1 %, indicando rápida progressão.

As evidências atuais, acrescenta o relatório, parecem indicar que a variante Ómicron tem vantagens evolutivas sobre a Delta quando se trata de transmitir e que o faz mais rápido.

Tal situação foi observada não apenas em países com incidência relativamente baixa de casos Delta, como a África do Sul, o primeiro país onde a nova variante foi detetada, mas também noutros onde a Delta estava em níveis elevados, como o Reino Unido, acrescenta a OMS.

Na sua análise à Ómicron, a OMS reitera que a variante parece afetar a eficácia das vacinas contra a infeção e transmissão, aumentando também o risco de reinfecção.

Estudos preliminares independentes da OMS mostraram que a Ómicron reduz a proteção contra a reinfecção de quatro das principais vacinas covid, aquelas produzidas pela Pfizer-BioNTech, Moderna, AstraZeneca e Johnson & Johnson (Janssen).

No entanto, a variante não parece afetar a eficácia dos testes de PCR para deteção do vírus, o que pode ajudar a monitorizar a sua evolução. Os tratamentos contra casos graves ou críticos de Covid-19 “devem continuar a ser eficazes” contra a Ómicron, indica a OMS.

Notícia atualizada às 11h30 com as conclusões do relatório semanal da OMS