O militante histórico socialista Manuel Alegre criticou esta terça-feira que o PS se possa colocar “na dependência do PAN”, numa opção contrária à sua “cultura de liberdade”, o que o poria a votar contra si próprio.
Num artigo no jornal Público, o antigo candidato presidencial argumenta ainda que a imposição de um programa de “cortes e proibições” por “dois ou três deputados” dispostos a negociar quer com o PS, quer com o PSD, põe em causa a “verdade da representação política”.
Manuel Alegre reconhece “o problema de confiança” que o chumbo do Orçamento do Estado para 2022 colocou ao PS relativamente aos antigos parceiros da chamada geringonça, designadamente BE e PCP, e por isso apoia “a posição do PS no sentido da obtenção de uma maioria que liberte o governo de novos constrangimentos e dependências”.
“E por isso não compreendo como é possível o PS colocar-se na eventual dependência do PAN, partido que subverte o primado da pessoa humana e os fundamentos humanistas da nossa sociedade. Se tal acontecesse, votar PS seria como votar contra mim mesmo, contra o que gosto de fazer, como caçar e pescar, algo que faz parte de uma cultura de vida e de relação com a natureza”, sustenta.
“Não só para mim como para muitos milhares de pessoas que se reconhecem no PS. Creio que a cultura de liberdade do PS não o permitirá. Até porque certas opções do PAN, pelo seu excesso, atingem a coesão cultural, territorial e social do país, dividindo a cidade e o campo, hostilizando e menorizando o mundo rural”, aponta.
O secretário-geral do PS e primeiro-ministro, António Costa, no debate televisivo com o presidente do PSD, Rui Rio, na quinta-feira, afastou a manutenção da geringonça nas atuais circunstâncias e observou que o PS e o PAN poderão somar mais de metade dos deputados.
“Houve um partido que, juntamente com o PS, não contribuiu para esta crise: O PAN. Não sei qual a representação parlamentar que o PAN vai ter”, disse na altura António Costa, antes de acentuar o seguinte: “Não há tabus sobre o que acontecerá o dia 30 de janeiro”.
Para Manuel Alegre, “a hipótese de dois ou três deputados poderem impor por decreto um programa baseado em cortes e proibições, não por força própria, mas com os votos dos partidos, PS ou PSD, a que o PAN se oferece para viabilizar governos, constitui algo que põe em causa a verdade da representação democrática”.
“E é incompatível com a história e natureza do PS, partido de liberdade e tolerância, que sempre respeitou a pluralidade e a diversidade. Por isso, sinto o dever cívico de publicamente afirmar que voto PS, não voto PAN”, declara.
Alegre sublinha que “o PAN tem o direito às suas opiniões”: “Mas não de me obrigar a elas, ainda por cima com o meu voto”.
“Quem vota no PS não o faz para que dois ou três deputados acabem com a pecuária, a caça e a pesca desportiva e outros seculares costumes e tradições do povo português. Quem vota no PS vota na liberdade, não em qualquer forma de extremismo ou dogmatismo, seja ele político ou animalista”, frisa.
Assim, o histórico socialista, “sem excluir futuras convergências, em novas condições, à esquerda”, defende, nestas legislativas, “uma maioria que permita ao PS recuperar a sua autonomia política e estratégica sem ficar refém de quem quer que seja, muito menos do PAN”.
“A esquerda tinha uma maioria. Não soube cuidar dela. O risco, agora, não está numa maioria do PS, mas no retrocesso que implicaria uma maioria de direita”, considera.
As eleições legislativas realizam-se a 30 de janeiro.