Há dois fantasmas do campo eleitoral passado que, esta terça-feira, aterraram no PS e com mais segurança que o voo (desta vez da TAP) que levou António Costa até à Madeira. Os ventos fortes fizeram com que o avião que o transportava borregasse na primeira aterragem e só pisasse terra firme à segunda tentativa. É mais ou menos como o socialista que, no primeiro Governo, aterrou sem ganhar eleições, no segundo, aterrou sem a segurança de um acordo parlamentar escrito e, no terceiro, quer aterrar no solo seguro da “maioria absoluta”. Na Madeira disse mesmo que não pode haver medo, no PS, de pedi-la com todas as palavras e leva armas na bagagem.
O uso excessivo do Plano de Recuperação e Resiliência durante a campanha autárquica não desembocou num resultado eleitoral que animasse os socialistas, mas nem assim António Costa parece interessado em deixá-lo pousar nesta investida rumo às legislativas. É uma das armas que leva para esta campanha onde ainda não tirou a gravata, nem mesmo no domingo nos Açores, — coisa que nas autárquicas fazia para mostrar que nesse dia era o líder que ali estava e não o primeiro-ministro. Mas nesta campanha essa mistura é parte do plano.
Primeiro-exemplo. Pouco depois de chegar à Madeira o socialista Costa reuniu-se com a Associação dos Lesados do Banif (ALBOA) para levar um recado de Costa primeiro-ministro. Aliás, nem travou nas declarações aos jornalistas quando disse que tinha estado ali para “reafirmar o compromisso de procurar uma solução justa” para quem foi “enganado”. O compromisso é do Governo que ainda em dezembro criou um grupo de trabalho para chegar à tal solução.
O segundo exemplo é o do uso do Plano de Recuperação e Resiliência, que Costa referiu, no discurso do final do dia, em Machico, que está pronto e é para passar à ação rapidamente. “Não é o momento para pararmos para ir renegociar o que está negociado. É tempo de arregaçar as mangas e executar o que está negociado”, afirmou. Imediatamente antes — e para introduzir o assunto PRR — tinha dito que “O Governo assinou com a União Europeia o Acordo Operacional que nos permite receber as tranches do PRR que justamente repartimos com todo o território e as duas regiões autónomas e que são fundamentais para levar o país mais além e mais rápido”. Nem pestanejou ou hesitou na altura em que evocou a função de chefe do Governo.
Terceiro. David Neelman a acusou-o de “faltar à verdade” no debate com Rui Rio quando disse que comprou a TAP “para prevenir precisamente que aquele privado [Neelman] que lá estava e que não merecia confiança, não daria cabo da TAP no dia em que fosse à falência. Em 2020, as empresas do senhor Neelman foram caindo em todo o mundo”. Era a decisão do primeiro-ministro que estava em cima da mesa, nesta contenda eleitoral, e Costa não quis sair desse pedestal para contestar o empresário. Questionado pelos jornalistas sobre a indignação de Neelman, disse apenas que “era o que faltava” responder-lhe: “Não tenho nada a dizer ao senhor Neelman”.
Costa é visto como o principal trunfo do PS nestas eleições e isso no exercício do cargo de primeiro-ministro. É isso que em cada ação de campanha faz questão que não seja esquecido, seja pela indumentária seja pela organização do discurso onde também não falta — e não faltou na Madeira — o sublinhado constante sobre ter um Orçamento do Estado preparado para aprovar, desde que lhe deem a maioria absoluta. Não é coisa que alguém que entre de novo num Governo consiga garantir de forma tão célere como um Executivo que já lá estava e que tem o esquema montado.
O único senão é que Costa só o conseguirá sem negociações extra e isso implica um resultado que, até aqui, teve pudor em chamar pelo nome. No últimos dias já respondia a quem lhe perguntava — nos debates, por exemplo — que, sim, é mesmo a maioria absoluta que quer. Mas na Madeira exortou os socialistas a pedirem-na assim mesmo, sem “ter medo das palavras”. O caminho único do PS nesta fase é “uma vitória com uma maioria absoluta”, descreveu.
Outro PM que o PS não quer ver esquecido
Em terra social-democrata, Costa teve um apoio a avivar outra memória na liderança do Governo que não a sua — que luta por manter constante nesta campanha. Além desta, a que o PS, por ali, não quer ver esquecida é a de Passos Coelho. Carlos Pereira, recandidato do PS ao Parlamento pela região, abriu as comportas a este tema ao atirar a “Pedro Passos Coelho e Paulo Portas que proibiram os madeirenses de receber o subsídio de insularidade”, “proibiram que os madeirenses tivessem impostos mais baixos” e “impuseram custos administrativos à dívida”. “Pedro Passos Coelho e Paulo Portas fizeram-se de agiotas da Madeira”, recuperou desses tempos.
E Costa, na intervenção que se seguiu também não os esqueceu. Recuperou a velha ideia do “diabo” e como ele afinal “não veio”, apesar de Passos ter dito que ele “vinha aí”. Para argumentar que a direita defende que se o salário mínimo fosse aumentando, já que complicava a “competitividade das empresas”. Concluiu dizendo que foi o PS que “virou a página da austeridade e da estagnação”.