O secretário-geral do PS, António Costa, garante que não está nos seus planos deixar Portugal no curto prazo para ocupar o cargo de presidente do Conselho Europeu. Em entrevista à Rádio Observador esta sexta-feira, o líder socialista diz que o atual presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, foi eleito com “acordo para a sua reeleição” para um novo mandato de dois anos e meio — uma reeleição que deverá ocorrer ainda este ano.
“Ficou acordada a estabilidade da Comissão e do Conselho“, diz Costa, assegurando que não está nos seus planos de curto prazo ocupar aquele cargo.
O líder socialista fala também das propostas do PS para o mundo laboral, incluindo a ideia de implementar a semana de quatro dias. “Há várias formas de organização do trabalho“, argumenta, afirmando que “a câmara de Mafra há vários anos que pratica a semana de quatro dias”. Reconhecendo que “não é uma proposta para amanhã”, Costa diz que a possibilidade de passar para uma semana de quatro dias “deve entrar na agenda dos parceiros sociais“.
O teletrabalho, diz Costa, obrigou os portugueses a “repensar” o modo como orientam a sua vida, uma vez que “as pessoas têm uma noção diferente do tempo“. Ainda assim, o líder do PS reconhece que a exequibilidade da semana de quatro horas depende “de setor para setor”, quando questionado sobre a possibilidade de a implementar, por exemplo, nos hospitais.
Questionado sobre as carreiras da administração pública — nomeadamente alguns casos que mais controvérsia têm causado nos últimos anos, como os professores e os enfermeiros —, Costa diz que “há várias carreiras setoriais” a precisar de empenho político, mas alertou que “não podemos consumir todos os recursos com as carreiras especiais continuando a ignorar as carreiras gerais, como os técnicos superiores”.
Costa garante ainda que vai manter a promessa do PS de aumentar o salário mínimo para os 900 euros, mesmo sem o acordo das entidades patronais.
“Temos uma grande vantagem nesta campanha: um Orçamento do Estado”
O primeiro-ministro salienta, por outro lado, que o PS vem para as legislativas de 2022 em vantagem. “Nós temos uma grande vantagem nesta campanha”, diz Costa, sublinhando que traz “um Orçamento do Estado”. “Não são promessas eleitorais”, afirma. “Não vale a pena virem dizer ‘ah, agora que estamos em eleições vêm falar de baixar IRS’“, continuou Costa, insistindo que se o Orçamento do Estado para 2022 tivesse sido aprovado esta baixa de impostos, bem como o aumento das pensões, já estaria em vigor.
Quando questionado sobre porque é que ainda não foi cumprida a promessa de atribuir médico de família a todos os portugueses, António Costa assinalou que o número de utentes do SNS aumentou significativamente, o que impossibilitou o cumprimento da medida. Segundo Costa, houve pessoas que não estavam inscritas no SNS e que se inscreveram, bem como portugueses que vivem no estrangeiro e que quiseram retomar a ligação ao SNS durante a pandemia. O primeiro-ministro coloca em perto de um milhão o número de novos utentes do SNS.
Há companhias europeias com interesse em comprar parte da TAP
António Costa fala da situação da TAP e garante que o processo de compra da companhia aérea pelo Estado só foi possível porque a Comissão Europeia considerou relevante assegurar a empresa. “Logo que seja possível, nós iremos alienar 50% do capital da TAP. Pode ser que sejamos capazes de alienar mais“, diz Costa. “O que é importante é que o Estado mantenha uma posição estratégica.”
“Há companhias que já manifestaram interesse em vir a adquirir”, diz, sublinhando que se trata de empresas europeias que, por ainda estarem sujeitas a apoios estatais nos seus países, ainda estão impedidas de novas aquisições. Pelo menos “uma delas” vai deixar de estar sujeita a essas restrições em breve, diz Costa.
“Não posso dizer aos portugueses que vamos continuar a geringonça”
António Costa fala também sobre a complexa aritmética parlamentar que tem ocupado grande parte da discussão eleitoral nesta campanha eleitoral. “As maiorias são um resultado da vontade dos portugueses e não dos líderes partidários”, diz Costa, antes de apelar novamente a uma maioria estável. “Ninguém quer que andemos de crise política em crise política, com Governos de dois anos.”
Assumindo que nasceu à esquerda e que a esquerda é a sua “família”, Costa diz que não está “em condições de dizer hoje aos portugueses o que disse há dois anos”. “Há dois anos eu disse que a geringonça provou bem“, disse Costa, dizendo que mantém essa posição, mas que as dificuldades de entendimento com o Bloco de Esquerda em 2020 e as dificuldades de negociação do Orçamento do Estado minaram o acordo à esquerda. “Podia ter dado o dito por não dito e negociar o Orçamento com o PS, mas não o fiz.”
“Não posso dizer aos portugueses que vamos continuar a geringonça”, diz Costa, afirmando que estará aberto para outras “soluções”. E garante: se tiver maioria absoluta, continuará a “dialogar” e a promover “consensos”. Se não tiver, será “pior“, porque é preciso negociar cada medida com os partidos, algo que “demora mais tempo”.
Sondagens? “Foi com ilusões deste tipo que se perdeu a câmara de Lisboa”
O líder do PS antecipa o que fará em caso de derrota eleitoral. “Se uma pessoa é primeiro-ministro seis anos e ao fim de seis anos os portugueses não lhe dão a vitória”, então demite-se nessa noite, repete. Mas mantém-se em funções enquanto o partido se reorganiza. “Quando disse que me demito nessa noite, não deixo as chaves do Rato no porteiro”, diz, salientando que terá de haver um congresso extraordinário.
Porém, diz que dificilmente o cenário se coloca. “Só o disse com franqueza“, para que se saiba que “não vou manter-me agarrado ao lugar”, diz Costa.
Mas Costa não se fia particularmente nas sondagens, que têm dado consistentemente a vitória ao PS. “Quem quer a vitória do PS, não se deixe iludir pelas sondagens”, diz. “Foi com ilusões deste tipo que se perdeu a Câmara Municipal de Lisboa.”
António Costa esteve na manhã desta sexta-feira a ser entrevistado em direto na Rádio Observador. O líder do PS foi entrevistado pelo editor de Política do Observador, Rui Pedro Antunes, e pela grande repórter Rita Tavares, numa altura em que termina a primeira semana da campanha eleitoral para umas legislativas em que António Costa quer alcançar uma maioria absoluta que lhe permita governar sem depender dos partidos da esquerda.
O primeiro-ministro, secretário-geral do PS e cabeça de lista dos socialistas pelo círculo eleitoral de Lisboa, foi o sexto líder partidário a ser entrevistado na Rádio Observador a propósito das eleições legislativas agendadas para o dia 30 de janeiro. Pode recordar as entrevistas de Jerónimo de Sousa (CDU), João Cotrim Figueiredo (IL), André Ventura (Chega), Francisco Rodrigues dos Santos (CDS) e Rui Tavares (Livre). A líder do PAN, Inês de Sousa Real, chegou a ter entrevista marcada, mas acabou por cancelá-la devido a “um imprevisto pessoal”.