“Já vai gostar mais dos ciganinhos, agora?” A pergunta surgiu no meio da arruada do Chega, em Braga, à chegada ao Rossio da cidade e era dirigida ao próprio André Ventura, que ainda trocou umas palavras com Fátima Romero, a mulher que se dirigiu a Ventura, orgulhosamente cigana e defensora da comunidade, e que pede ao líder do Chega que seja uma “pessoa mais humana e que ajude quem precisa”.
“Os ciganos são seres humanos, como outra pessoa qualquer”, dizia, ao defender que “há ciganos doutores, médicos, na Segurança Social, atrás dos balcões, nas limpezas”. André Ventura insistia que não tem “nada contra” e que não é “racista”. “Só quero que os ciganos tenham de trabalhar como todos os outros, (…) têm de cumprir as regras que todos cumprem”, insistia o líder do Chega.
“Todos trabalhamos como na sua etnia uns também trabalham e outros não trabalham”, respondia Fátima Romero, que não arredava pé. André Ventura não a deixou sem resposta: “Todos, não trabalham. Alguns trabalham, uma grande parte não trabalha.”
O líder do Chega prosseguia a arruada, enquanto os holofotes se viraram para Fátima. Tem 58 anos, explicou que não trabalha por “ser viúva”, mas “vende nas feiras e paga impostos”. E assegura que não recebe Rendimento Social de Inserção (RSI).
“Queremos que o senhor André Ventura não seja tão racista, que ajude os ciganos porque a nossa etnia é como outra qualquer”, pedia Fátima Romero. Aos seus olhos, o líder do Chega é “racista” e, por isso, o voto no dia 30 está definido: “Agora vai tudo votar no Costa, sabia? O senhor Costa é que tem de ser o nosso primeiro-ministro.”
A troca de ideias aconteceu na maior arruada do Chega desde o início da campanha. A mais longa, a que contou com mais apoiantes, mais barulho — entre bombos e cânticos —, mas também a que contou com mais críticas. Das janelas às esplanadas, houve quem gritasse “fascista e xenófobo“. Os insultos não travam André Ventura, que se mostra pouco preocupado e até levanta a mão com um cumprimento.
Num distrito onde conseguiu mais de 39 mil votos nas eleições legislativas e onde que não conseguiu eleger um vereador nas autárquicas, o partido sonha com a conquista de dois deputados e aposta forte: três ações de campanha neste distrito em três dias.
Nas ruas de Braga, André Ventura abraçou e deixou promessas a quem se agarrou a ele com desabafos sobre o Serviço Nacional de Saúde. “Vamos dar o nosso melhor para ter um serviço de saúde que chegue a todos, em que não se fique à espera quatro anos nem três”, disse, enquanto encaixava uma das bandeiras que mais levantou no norte e interior do país.
A bandeira do Bloco que Ventura quer para o Chega
Por outro lado, houve um tema que surgiu na arruada, pela voz de quem se apercebeu do aparato, e que não faz parte do programa eleitoral do Chega nem das 100 medidas de Governo, mas que André Ventura estabeleceu — ali mesmo — como “uma das primeiras propostas a apresentar no Parlamento”: os cuidadores informais.
“Sinto-me revoltado, porque há uma série de vontades, de diplomas, de projetos-piloto, e realmente as pessoas precisam de ajuda, porque é desgastante”, explicava Armando Veloso ao líder do Chega, que concordava que os cuidadores informais “não têm tido apoio nenhum do Estado”.
Questionado sobre esta ser uma das grandes bandeiras do Bloco de Esquerda nos últimos anos e sobre se alinharia ao lado do partido coordenado por Catarina Martins para que este tema tivesse uma solução, André Ventura garantiu que vai antecipar-se: “Não vai ser o Bloco de Esquerda [a propor] porque o Chega vai ter mais votos e vamos ter a capacidade de agendar esse assunto antes do BE”.
André Ventura enalteceu que “é preciso apoio aos cuidadores informais” e “reconhecer o estatuto”, algo que culpa o PS por não ter feito. “É preciso conceder apoios a quem trata hoje de idosos que ficam completamente abandonados”, disse o líder do Chega, sem especificar a forma como o pretende fazer.
No final do dia, no maior jantar-comício da campanha, na Alfândega do Porto, onde estiveram mais de 300 pessoas, André Ventura começou o discurso a dizer que aquele é “um dos distritos que mais preza a liberdade”, um círculo eleitoral em que o Chega tem tido muita dificuldade nos últimos atos eleitorais e uma das maiores apostas da campanha eleitoral.
Apesar de precisar (e muito) de votos por ali, a mensagem que o líder do Chega levou ao Porto era para fora daquelas quatro paredes e dirigida a quem vê no Chega uma “voz incómoda”.
“Todo o diálogo e toda a narrativa política, da esquerda à direita, passa pelo pelo Chega. A questão é se o Chega vai governar, se vai fazer maioria, a posição que os partidos tomam já não é se são de esquerda ou de direita, é se vão governar ou não com o Chega”, afirmou o presidente do Chega, dando a certeza de que o partido vai ficar “em terceiro” no dia 30 de janeiro.
Para todos os que, na voz de Ventura, tentam “silenciar ou humilhar” o Chega, os que chamam “fascistas, extremistas, radicais” ou “herdeiro de Salazar”, o presidente do partido tem uma mensagem: “Enquanto nos chamam extremistas há um país que se destrói às mãos da corrupção socialista.”
Numa sala que, ao contrário dos últimos comícios, não é de casamentos, André Ventura não está para estender a mão ao amor: “Não nos perdemos em alianças, pedidos de casamento ou de namoro”, garantiu, preferindo focar-se em algumas das bandeiras da campanha: os impostos do combustível, a dívida pública portuguesa e a auditoria aos gastos do PS nos últimos anos de governação.
Sobre esse tema, ainda um desabafo: “Lamento muito que nenhum partido à direita aceite o desafio. Que medo tem PSD, CDS e IL de fazer auditoria aos gastos do PS?”