O Irão está preocupado com a exigência formulada pela Rússia aos Estados Unidos para que as sanções económicas impostas pelo Ocidente a Moscovo não afetem as relações entre Rússia e Irão no âmbito do acordo nuclear, noticia este sábado a agência Reuters citando uma fonte das autoridades iranianas.
Para o Irão, esta exigência russa “não é construtiva” para as negociações, atualmente em curso, entre Teerão e os parceiros internacionais com vista à retoma do Acordo Nuclear de 2015, que foi rompido depois de Donald Trump ter retirado os EUA do pacto em 2018. Após quase quatro anos sem o acordo em vigor, Irão e os parceiros internacionais estão prestes a voltar a assinar o compromisso de desnuclearização do país, mas a exigência russa pode ser um obstáculo, teme Teerão.
O ministro dos Negócios Estrangeiros russos, Sergey Lavrov, exigiu este sábado que os Estados Unidos deem à Rússia “garantias escritas” de que as sanções impostas a Moscovo como retaliação pela invasão da Ucrânia não afetarão as relações com o Irão.
“Precisamos de garantias de que estas sanções não afetarão de modo algum o comércio e as relações económicas e de investimento contidas no Plano de Ação Conjunto Global para o programa nuclear iraniano“, disse Lavrov numa conferência de imprensa. “Pedimos aos homólogos americanos, que estão à frente disto, que nos deem garantias, pelo menos ao nível do secretário de Estado, de que o atual processo lançado pelos EUA não afetará, de modo algum, o nosso direito ao comércio livre e total, ao investimento económico e à cooperação militar e tecnológica com o Irão.”
A exigência russa surge numa semana em que as negociações que decorrem em Viena para a recuperação do acordo nuclear chegaram a um entendimento preliminar sobre os próximos passos para a reimplementação do pacto — e pode criar obstáculos à sua operacionalização efetiva.
“Os russos colocaram esta exigência na mesa nos últimos dois dias”, diz uma fonte do regime iraniano à Reuters, lembrando que nesta semana o diálogo em Viena chegou a bom porto. “Há o entendimento de que, ao mudar a sua posição nas negociações de Viena, a Rússia quer salvaguardar os seus interesses noutros lugares. Esta movimentação não é construtiva para os diálogos nucleares em Viena.”
O Acordo Nuclear foi assinado inicialmente em Viena em 2015 entre o Irão e uma coligação internacional composta por China, Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Rússia e União Europeia.
O documento previa que o Irão se comprometesse a uma série de objetivos para se desnuclearizar, nomeadamente desmantelando instalações de enriquecimento de urânio, eliminando as reservas de urânio enriquecido, garantindo a não construção de novas unidades de produção, entre outros compromissos. Em troca, os Estados Unidos, a União Europeia e a ONU reduziriam as sanções económicas de que o Irão era alvo.
Porém, o acordo não durou muito tempo. Em 2018, o então Presidente norte-americano, Donald Trump, anunciou que os EUA iriam abandonar o acordo, alegando que os compromissos não eram suficientemente fortes da parte do Irão: os prazos permitiam que o Irão retomasse o seu programa nuclear em 2030 e que o material das instalações desmanteladas fosse reaproveitado nessa altura. Além disso, Israel, forte aliado dos EUA (uma aliança que se intensificou durante o consulado de Trump), opunha-se ao acordo nuclear, dizendo que a redução das sanções ao Irão daria “centenas de milhares de milhões de dólares” a um “regime terrorista” considerado o arqui-inimigo de Israel.
A saída dos EUA do Acordo Nuclear fez com que o pacto acabasse por se desfazer por completo. Devido à reimposição das sanções norte-americanas, o Irão deixou de cumprir as suas obrigações e os anos de 2019 e 2020 ficaram marcados por momentos de grande tensão, incluindo os ataques a petroleiros no golfo de Omã e a morte do general iraniano Qassem Soleimani por parte dos Estados Unidos.
Na altura, os EUA encontravam-se em período pré-eleitoral e o então candidato Joe Biden prometeu que, sob a sua Presidência, os EUA voltariam ao Acordo Nuclear do Irão. Ao longo do último ano, o Irão e os parceiros do acordo têm levado a cabo negociações em Viena com vista à reimplementação do acordo, um processo que se tem aproximado do sucesso — com um dos últimos obstáculos, um diferendo entre o Irão e a Agência Internacional de Energia Atómica sobre a origem de partículas de urânio encontradas recentemente em geografias não previamente declaradas, perto da resolução.