A organização Human Rights Watch (HRW) acusou esta terça-feira as autoridades do Uganda de deterem ilegalmente e torturarem centenas de opositores e manifestantes pacíficos e responsabilizou o governo por não ter punido os autores dos abusos.
“O governo do Uganda tolerou as detenções ilegais e o abuso de detidos por parte dos seus oficiais (…). Medidas urgentes são necessárias para ajudar as vítimas, para responsabilizar os agentes e para pôr fim a este espetro de impunidade e injustiça”, disse o investigador da HRW Oryem Nyeko, citado num comunicado da organização.
Num relatório de 98 páginas, intitulado “Só preciso de justiça: Detenção ilegal e abuso em locais de detenção não autorizados no Uganda“, a HRW documenta desaparecimentos forçados, detenções arbitrárias, prisões ilegais e outros maus-tratos por parte da polícia, do exército, dos serviços secretos militares e da agência nacional de informações, a Organização de Segurança Interna (ISO, na sigla em inglês).
Na maioria dos casos, escreve a organização de defesa dos direitos humanos, estes abusos foram cometidos em locais de detenção ilegais em 2018, 2019 e nos meses antes das eleições gerais de janeiro de 2021.
Segundo os autores do relatório, embora as autoridades tenham por vezes reconhecido a existência destes abusos, pouco fizeram para lhes pôr fim ou para proporcionar justiça para as vítimas e as suas famílias.
As vítimas, acrescenta a HRW, enfrentam problemas físicos, mentais e económicos persistentes durante e após a sua detenção, assim como obstáculos para obter justiça.
As conclusões do relatório resultam de entrevistas a 51 pessoas, incluindo ex-detidos, testemunhas de raptos e detenções, responsáveis do governo, deputados, membros de partidos da oposição, diplomatas, ativistas dos direitos humanos e jornalistas, realizadas em Kampala entre abril de 2019 e novembro de 2021.
Os ex-detidos descreveram como as forças de segurança desprezam procedimentos judiciais durante as detenções e enquanto mantêm os detidos sob custódia.
Os agentes das forças de segurança detêm as vítimas nos seus locais de trabalho, em casa ou na rua e forçam-nos, às vezes com uma arma apontada, a entrar em veículos descaracterizados, normalmente furgonetas, localmente chamadas de ‘drones’.
As vítimas ficam detidas numa variedade de locais não autorizados, nomeadamente em esconderijos supostamente destinados a proteger testemunhas, mas usados como centros de detenção improvisados.
Em alguns casos, os detidos foram levados para uma ilha no Lago Victoria, detidos em veículos, numa sala subterrânea do parlamento ou em casernas militares.
Em fevereiro de 2020, a comissão parlamentar de direitos humanos divulgou um relatório sobre uma investigação que tinha aberto no ano anterior sobre alegações de que o ISO tinha raptado e detido ilegalmente mais de 400 pessoas.
O relatório confirmou que as forças de segurança detinham ilegalmente pessoas em locais de detenção ilegais e recomendou que as agências governamentais aprofundassem a investigação, mas o governo não tomou qualquer medida nesse sentido nem com o objetivo de parar estas práticas abusivas, acusa a HRW.
Os casos de abusos atingiram um recorde nos dois meses antes das eleições de janeiro de 2021, tendo as forças de segurança detido ou feito desaparecer críticos do governo, líderes e apoiantes de partidos opositores e alegados manifestantes. Embora alguns tenham sido libertados ao longo do ano passado, muitos ainda permanecem desaparecidos.
Ex-detidos contam que foram impedidos de falar com os seus advogados ou familiares, foram torturados, espancados, acorrentados, os seus captores deram-lhes choques elétricos e injeções com substâncias não identificadas.
Alguns detidos, tanto homens como mulheres, foram violados e vítimas de tortura sexual durante a sua detenção.
Tanto a lei do Uganda como a lei internacional proíbem absolutamente detenções arbitrárias, desaparecimentos forçados e tortura, sublinha a HRW, que apela às autoridades do Uganda para que fechem todos os centros de detenção ilegais e investiguem todos os relatos de abusos.