Longe de casa e sem data de regresso, os estudantes ucranianos Artem, Ihor e Veronika assistem, a partir de Beja, à “tragédia” que afeta o seu país, sem conseguirem encontrar explicação para a invasão da Rússia.

“Toda a gente falava disso [do ataque russo], mas ninguém pensou que fosse realmente acontecer. Não há razões para isto estar a acontecer”, conta à agência Lusa Artem Bukhantsev, de 18 anos, que é natural da cidade ucraniana de Dnipro e estuda Ciências Informáticas na universidade de Kielce, na Polónia.

Artem frequenta, desde setembro de 2021, o Instituto Politécnico de Beja (IPBeja), no âmbito do programa europeu Erasmus +, tal como Ihor Kotsar e Veronika Bakhchevan.

Estes últimos dois, naturais da cidade portuária de Odessa, na costa noroeste do mar Negro, tinham mesmo regresso a casa marcado para o dia 28 de fevereiro, mas o início do conflito militar deixou-os sem voo e retidos na cidade alentejana.

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“Agora, não podemos regressar e quando vemos as notícias sobre o nosso país é dramático para nós. Falamos com os nossos pais todos os dias, sabemos que as nossas cidades têm sido atacadas e tem sido muito duro. É uma tragédia“, diz Ihor Kotsar, de 20 anos, aluno na área de Economia na Odessa National Technological University.

Estudante na mesma universidade, Veronika Bakhchevan reconhece à Lusa que o início da guerra na Ucrânia, com a invasão russa de 24 de fevereiro, foi “uma verdadeira surpresa” para todos.

“Ninguém previa esta guerra”, acrescenta a jovem, de 21 anos, que estuda Administração Pública.

Tanto Veronika como Artem e Ihor têm as suas famílias diretas na Ucrânia, com quem mantêm contacto através de chamadas telefónicas ou das redes sociais.

“Falo com eles todos os dias, estão todos bem”, revela Veronika.

Também a família de Artem se encontra em segurança em Dnipro, no sudeste do país, mas, para breve, está prevista a chegada da esposa do seu pai a Portugal: “O meu pai é que não pode vir, pois foi mobilizado” pelo exército ucraniano.

A situação do pai de Artem ilustra como o dia a dia de quem vive em guerra na Ucrânia é muito diferente da rotina tranquila que estes jovens estudantes acabam por ter em Beja.

“A minha família está bem, mas quando há ataques aéreos” em Odessa “vai para abrigos subterrâneos”, nota Ihor, deixando o desejo de que a guerra “possa terminar rapidamente”.

Segundo o estudante, “com o apoio da Europa, esta guerra pode terminar em breve. A Rússia não pode continuar devido às sanções”, que são “um grande problema” para a sua economia.

Enquanto aguardam por um desfecho rápido do conflito no seu país, os três jovens ucranianos vão continuar em Beja, a estudar no politécnico da cidade.

“O IPBeja vai ajudar-nos a continuar em Erasmus no próximo semestre. Vão apoiar-nos e permitir que fiquemos por cá, para continuarmos os nossos estudos”, relata Ihor Kotsar.

Uma oportunidade para continuarem a desfrutar de um país que os tem “encantado” desde a chegada.

“Portugal é um país muito bonito, muito interessante, e tem sido uma experiência fantástica para mim”, frisa Ihor.

Já Artem destaca a “tranquilidade” de Beja por comparação com Dnipro, cidade com “quase dois milhões de habitantes”, acrescentando que “as pessoas em Portugal podem viver e relaxar”.

“Em Beja, temos um ambiente muito calmo e tranquilo. Portugal é um país lindo, com um clima excelente, mar e praias lindas”, concorda Veronika, admitindo a possibilidade de continuar no país depois de completar os estudos.

“Já pensei nisso. Estou a pensar continuar os meus estudos em Portugal, talvez através de um mestrado”, conclui.

A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que matou pelo menos 1.151 civis, incluindo 103 crianças, e feriu 1.824, entre os quais 133 crianças, segundo os mais recentes dados da ONU, que alerta para a probabilidade de o número real de vítimas civis ser muito maior.

A guerra provocou a fuga de mais de 10 milhões de pessoas, incluindo mais de 3,8 milhões de refugiados em países vizinhos e quase 6,5 milhões de deslocados internos.

A ONU estima que cerca de 13 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.

A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.