O pacote de medidas para mitigar o “choque geopolítico” é a principal novidade financeira de uma proposta de Orçamento que teve de ser parcialmente refeita, face a outubro de 2021, por causa dos impactos económicos da guerra na Ucrânia. As medidas já tinham sido apresentadas esta segunda-feira, mas a sua dimensão financeira e o impacto nas contas públicas só foi conhecido esta quarta-feira.
E uma das surpresas é a de que a redução do imposto petrolífero (ISP) para um nível equivalente à cobrança de uma taxa reduzida de IVA nos combustíveis “só” vai custar em receita perdida 170 milhões de euros.
De acordo com a estimativa já divulgada pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, esta descida acentuada do imposto — que só entra em vigor em maio porque tem de ser aprovada no Parlamento — ia tirar 80 milhões de euros por mês à receita fiscal e seria reavaliada trimestralmente. Mas segundo a proposta agora conhecida, pode apenas estar em vigor dois meses — maio e junho — confirmou o ministro das Finanças na conferência de imprensa. Fernando Medina sublinhou que o apoio ajudará a “mitigar em 72% o aumento do preço da gasolina e 52% do preço do gasóleo”, sinalizando a “possibilidade dos apoios serem prolongados”, ainda que com outra solução.
A descida do imposto petrolífero num total de 21 cêntimos por litro (dos quais mais de 4 cêntimos já está em vigor) foi apresentada como a solução possível até chegar (se chegar) a luz verde de Bruxelas ao pedido de Portugal para ajustar as taxas do IVA nos combustíveis. Uma medida que poderá nunca vir a ser adotada se o preço dos combustíveis estabilizar a um nível mais baixo que o atual.
O Executivo tem avisado que as medidas de contenção do preço dos combustíveis têm de ser temporárias e em permanente reavaliação e que baixar a carga fiscal sobre estes produtos vai contra os objetivos de política climática da União Europeia.
Nas contas da proposta orçamental, o impacto é limitado e inferior a outra medida inscrita no pacote. O congelamento da atualização da taxa de carbono (que iria encarecer os preços em 5 cêntimos por litro) tem uma dimensão que é mais do dobro — 360 milhões de euros. Mas há uma diferença importante entre estes dois valores. A descida do imposto é uma perda de receita que já era cobrada e a não atualização da taxa de carbono é abrir mão de uma receita que não chegou a ser cobrada.
No total, e incluindo a redução já introduzida no imposto petrolífero desde outubro, a título de devolução dos ganhos a mais arrecadados no IVA por via do aumento dos combustíveis, o Governo estima perder 688 milhões de receitas fiscais nos combustíveis. A esta perda junta-se uma despesa de 208 milhões de euros, da qual mais de metade corresponde aos reembolsos feitos através do Autovoucher aos particulares que compraram combustíveis entre outubro e abril — em maio a medida é descontinuada porque entrará em vigor a descida mais acentuada do imposto petrolífero — e os apoios até 30 cêntimos por litro dados às empresas de transporte de passageiros (incluindo táxis e TVDE —Transporte Individual e Remunerado de Passageiros em Veículos Descaracterizados a partir de Plataforma Eletrónica) e mercadorias, orçamentados em 75 milhões de euros.
Tudo somado, o pacote dos combustíveis tem um impacto financeiro de 855 milhões de euros, ou 0,4% do Produto Interno Bruto, do qual 647 milhões de euros refletem a perda de receita fiscal. Apesar desta dimensão, a proposta orçamental prevê apenas um recuo de 2% na receita do imposto petrolífero face a 2021, o que corresponde a cobrar menos 54 milhões de euros. A explicação para um impacto tão reduzido face ao ano passado reside na pandemia e na retoma económica prevista para este ano que aumenta o consumo de combustíveis e que, nas contas do Governo, permitirá travar a perda de receita.
Quando a comparação é feita com a proposta de orçamento apresentada em outubro, o desvio é mais significativo e passa de uma cobrança estimada de 3.503 milhões de euros para uma receita do ISP prevista de 3.310 milhões de euros. São menos 193 milhões de euros ou 5,5%.
O apoio aos combustíveis equivale a quase dois terços — 64% — do pacote total de medidas de resposta à guerra na Ucrânia que vale 1.335 milhões de euros. O impacto no saldo orçamental é menor de 1.125 milhões de euros, porque na conta entram também receitas de fundos europeus. No final, o peso destas medidas extraordinárias no saldo das contas públicas representa 0,5% do Produto Interno Bruto.
Fernando Medina adiantou na conferência de imprensa que o esforço total associado à resposta de Portugal aos efeitos da guerra e da crise energética será de 1.800 mil milhões de euros, incluindo neste número o diferimento do pagamento das contribuições sociais e impostos por parte das empresas mais afetadas.