Os templos da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) em Angola, cuja reabertura foi anunciada na terça-feira, voltaram a ser encerrados e serão entregues à direção “legitimada pelo Governo angolano”, segundo o Instituto Nacional para os Assuntos Religiosos.

A IURD Angola (de origem brasileira, liderada por Alberto Segunda) anunciou a reabertura dos seus templos na passada terça-feira, dois anos depois, referindo que a mesma resultava de uma decisão do Tribunal da Comarca de Luanda.

Num comunicado, a IURD referia que o colégio de juízes da 4.ª Secção dos Crimes Comuns do Tribunal da Comarca de Luanda determinou o “desbloqueio dos bens móveis e imóveis da IURD em Angola”.

Em declarações hoje à estação pública TPA, Ambrósio Micolo, diretor-geral adjunto do Instituto Nacional para os Assuntos Religiosos (INAR), entidade que é também fiel depositária dos templos que estavam apreendidos por ordem da Procuradoria-Geral da República (PGR), confirmou que o tribunal decidiu devolver o património que estava sob arresto à igreja.

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“Mas é preciso que o tribunal notifique o INAR para que este seja autorizado a fazer a entrega e possa autorizar a reabertura dos templos”, disse, acrescentando que “os selos estavam colocados”, pelo que “os fiéis da Igreja Universal violaram o pressuposto legal”.

“Isto é uma violação muito grave. (…) O que vai acontecer é a que a PGR voltou a colocar os selos e aguarda a notificação do tribunal”, afirmou.

Ambrósio Micolo salientou que neste momento “já não existem alas, existe uma direção da Igreja Universal”, e é “esta direção legitimada pelo Estado angolano que vai rececionar os templos que vão ser entregues pelo INAR, esta é que tem legitimidade para reabrir e exercer as suas atividades”.

O mesmo responsável adiantou que mal o tribunal notifique o INAR este fará a devida comunicação à PGR para se proceder à entrega dos templos, sublinhando que “vai ser reposta a legalidade”.

A direção da IURD reconhecida pelo INAR é encabeçada pelo bispo Valente Bizerra Luís, que coordenava a comissão de reforma que entrou em conflito com a liderança brasileira da IURD em 2019.

Ambas as alas, a de origem brasileira, liderada agora pelo angolano Alberto Segunda e a ala dissidente, angolana, dirigida por Bizerra Luís, reclamam ser as legítimas representantes da igreja fundada por Edir Macedo.

Valente Bizerra Luís condenou a reabertura dos templos da IURD por dirigentes da ala brasileira, considerando que “é ilegal”, pois essa direção não é reconhecida.

Para os dissidentes, a reabertura dos templos do Maculusso e Alvalade (os principais locais de culto em Luanda) viola a decisão da PGR, pois só o INAR tem legitimidade para decidir

Bizerra Luís declarou à TPA que a ala que lidera foi reconhecida como a legitima representante da IURD pelo ex-ministro Jomo Fortunato [entretanto substituído por Filipe Zau].

“No ano passado, o ex-ministro da Cultura deixou bem claro de quem era a liderança legítima da igreja. O que estão a ver são cidadãos, estrangeiros, que não respeitam o Estado angolano”, sublinhou.

“Se um simples cidadão vai até esse templo, tira os selos, e faz uso desse imóvel, é uma invasão, essa direção já não é uma direção legítima”, reforçou Bizerra Luís.

A Lusa tentou ouvir o bispo Alberto Segunda, sem sucesso até ao momento.

A IURD em Angola enfrenta disputas internas desde 2019, quando bispos e pastores angolanos acusaram os gestores brasileiros de vários crimes, nomeadamente branqueamento de capitais, evasão de divisas, obrigação de vasectomia, bem como racismo.

Os brasileiros acusam os bispos e pastores angolanos, que se afastaram da igreja, de atos de xenofobia e agressões, na sequência da tomada à força de templos, em todo o país.

A justiça angolana abriu um processo, encerrou os templos e convidou missionários brasileiros a deixarem o território angolano.

No âmbito do julgamento, o tribunal de Luanda condenou em 31 de março o ex-responsável da IURD em Angola a três anos de prisão, de pena suspensa, pelo crime de violência física e psicológica, enquanto os restantes arguidos foram absolvidos.

O ex-líder Honorilton Gonçalves, atualmente no Brasil, e outros três coarguidos – o bispo angolano António Ferraz, o pastor brasileiro Fernandes Teixeira e o pastor angolano Belo Kifua – eram acusados de vários crimes, incluindo associação criminosa, branqueamento de capitais e violência doméstica, num julgamento que teve início em 18 de novembro de 2021.

Honorilton Gonçalves foi condenado pelos crimes de violência física e psicológica, ficando a pena suspensa por dois anos, e terá de pagar indemnizações de 30 e 15 milhões de kwanzas (60 mil e 30 mil euros) a dois ofendidos que foram submetidos a uma vasectomia.

Os arguidos foram absolvidos dos restantes crimes: associação criminosa, branqueamento de capitais, burla por defraudação e expatriação ilícita de capitais, um crime que o tribunal deixou cair por se tratar de uma transgressão que compete ao Banco Nacional de Angola.