O dia 21 de abril de 2022, quase dois meses depois de a Rússia ter invadido a Ucrânia, fica na história como o dia em que Volodymyr Zelensky marcou presença (à distância) numa sessão solene na Assembleia da República. Num discurso em que recordou “barbaridades” cometidas pelas tropas russas em cidades ucranianas e onde pediu mais apoio militar e económico, o Presidente da Ucrânia quis tocar no coração dos portugueses e fê-lo através do 25 de Abril.
Faltava pouco mais de meia hora para o início do discurso de Volodymyr Zelensky e o Parlamento preparava os últimos pormenores. Os ecrãs do hemiciclo estavam ligados, as comunicações eram notórias e pedia-se a quem estava do outro lado mais uns minutos para questões técnicas. As primeiras imagens do local em que o Presidente ucraniano iam discursar começavam a aparecer. No fundo do ecrã, o nome que se esperava: “President of Ukraine.”
Aos poucos, os deputados foram entrando no hemiciclo e eram visíveis alguns adereços pouco vulgares: uma fita azul e amarela num microfone, alguma roupa com as cores da Ucrânia e vários elementos ao peito, desde fitas com as cores em causa a cravos (um deles vermelho, no bolso de Rui Tavares; e vários azuis e amarelos).
A sessão teve início à hora certa, com o Presidente da República e o presidente da Assembleia da República a entrarem numa espécie de cortejo e a dirigirem-se à mesa principal, onde escutaram o discurso. Pelo meio, uma nota: os deputados do Chega só chegaram depois desse momento, quebrando o protocolo. André Ventura acabou por o desvalorizar, pouco depois, apontando para os cravos que foram preparados de propósito para a sessão solene.
Nos ecrãs do Parlamento apareceu Volodymyr Zelensky, “grato pela oportunidade” e pronto para falar sobre as atrocidades a que tem assistido na Ucrânia. “Ontem, não muito longe da nossa capital, encontraram mais duas sepulturas de dois homens de 35 anos e uma rapariga de 15 anos.” A descrição do horror prosseguiu, com o Presidente da Ucrânia a dizer que tinham sido “torturados” pelos soldados russos e que estes tinham “matado para se divertir”.
O chefe de Estado não poupou nas palavras, falou em “inferno”, em crianças mortas, em humilhações, em pessoas proibidas de irem à casa de banho. “É a diversão dos russos.”
Volodymyr Zelensky lembrou ainda o cenário que se vive em Mariupol, “uma cidade tão grande como Lisboa e perto do mar”. “Está toda incendiada. Os russos fizeram dela um inferno.” E sobre as pessoas que estão a chegar a todos os países da Europa, o Presidente da Ucrânia lembra que estão a fugir da guerra: “As nossas pessoas não são refugiadas. Tiveram de fugir.”
“Estamos a lutar não apenas pela nossa independência, mas sobrevivência, pelas nossas pessoas, para não serem torturadas e violadas, capturadas pela Rússia”, lembrou o Presidente ucraniano, que culpa a Rússia de estar “a fazer o que outros regimes totalitários faziam”, com “os ucranianos a não terem direito a ficar com famílias”.
Volodymyr Zelensky aproveitou a oportunidade de estar a falar para Portugal e para os portugueses e comparou a guerra na Ucrânia com o 25 de Abril: “O vosso povo vai daqui a nada celebrar o aniversário da revolução dos cravos e sabem perfeitamente o que estamos a sentir.”
E voltou a aproximar-se de Portugal ao dizer que a posição geográfica não torna os valores menos próximos: “Vocês estão no Oeste, nós mais a Leste, mas as nossas visões são iguais e sabemos que regras, direitos e valores deve haver na Europa.”
No seguimento, o agradecimento de Zelensky a Portugal e um pedido para que o país não só defenda o embargo do petróleo, como mantenha e aumente as sanções à Rússia e envie armamento.
A sessão solene prosseguiu com o discurso de Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República, que sublinhou que “o agredido tem o direito de se defender e deve ser apoiado nessa legítima defesa”. “Defendendo-se a si própria, a Ucrânia defende-nos a todos”, apontou.
Santos Silva fez questão de referir que Portugal e o Governo estiveram sempre ao lado da Ucrânia e do povo ucraniano, que existe um “relacionamento estreito” entre os dois países e prometeu continuar esse apoio.
“Portugal é um país médio à escala europeia, pequeno à escala mundial, não é uma potência demográfica, económica ou militar, mas é uma nação com História, com um posicionamento geopolítico há muito consolidado e com uma política externa que não varia com o Governo do momento, porque exprime interesses nacionais duradouros”, disse, frisando que “a chave da política externa é o respeito pelo direito internacional”.
Apesar de admitir que “Portugal é um país médio à escala europeia, pequeno à escala mundial, não é uma potência demográfica, económica ou militar”, Santos Silva realça que “é uma nação com História, com um posicionamento geopolítico há muito consolidado e com uma política externa que não varia com o Governo do momento, porque exprime interesses nacionais duradouros”.