Um gangue de contrabandistas especializados estará a transportar ilegalmente artefactos históricos de grande valor da Ucrânia para a Rússia, denunciou uma equipa internacional de académicos e especialistas em tecnologia digital que está a monitorizar os roubos.

Brian Daniels, um antropólogo que está a colaborar com a equipa num laboratório no estado da Virginia, nos Estados Unidos da América, disse ao Observer que existem “evidências muito fortes” de que se trata de um “movimento propositado” por parte da Rússia, que quer ver retiradas da Ucrânia certas pinturas e ornamentos.

Os roubos têm tido sobretudo como alvo a chamada arte cita, peças decorativas em ouro, geralmente muito detalhadas, produzidas por antigas tribos nómadas da região conhecida como Cítia, entre a atual Mongólia e Rússia. “Estes objetos são visualmente impressionantes”, comentou Daniels.

“Existem atualmente tantos relatos de roubos que é evidente que se trata de uma estratégia”, afirmou o antropólogo, sem, porém, conseguir dizer qual o interesse dos russos nestas e outra peças de arte específicas. “Há a possibilidade de tudo fazer parte de uma tentativa de minar a identidade ucraniana ao implicar que todas as exposições são propriedade legítima da Rússia.”

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Quem foi Hryhorii Skovoroda, o poeta e filósofo ucraniano cujo museu foi destruído pelos russos?

Tem sido sugerido que a destruição de locais associados à cultura ucraniana faz parte da estratégia militar russa, mas não existem provas concretas de que a Rússia esteja deliberadamente a atacar o património cultural ucraniano. Em maio, o museu do poeta e filósofo Hryhorii Skovoroda em Skovorodynivka, uma pequena localidade sem qualquer interesse estratégico, foi destruído por um míssil russo. Skovoroda é considerado um dos fundadores da língua ucraniana escrita e um símbolo de liberdade.

Têm sido também registados vários atos de vandalismo contra símbolos culturais em áreas ocupadas pelas forças russas. Na cidade de Borodianka, perto de Kiev, a estátua do poeta Tarás Shevchenko, fundador do modernismo na Ucrânia, foi alvejada e muito danificada. Shevchenko foi exilado por Nicolau I por lutar contra o poder instituído e defender a ideia de uma Ucrânia autónoma e independente.

A situação levou ao lançamento de um projeto de digitalização de locais culturais e monumentos, numa tentativa de preservar o património cultura ucraniano, em risco de desaparecer devido aos ataques das forças invasoras. A iniciativa, chamada Backup Ukraine, envolve mais de uma centena de voluntários que estão a scanear os lugares com recurso a uma aplicação chamada Polycam, noticiou a CNN.

A última atualização do governo ucraniano sobre o património cultural do país, divulgada a 27 de maio, referia a destruição de 29 museus, 133 igrejas, 66 teatros e bibliotecas e um cemitério judeu com mais de 100 anos. Ao todo o Ministério da Cultura da Ucrânia documentou 367 crimes de guerra contra o património cultural ucraniano.