O bastonário da Ordem dos Médios disse esta terça-feira que os constrangimentos que desde junho têm afetado os serviços de ginecologia e obstetrícia de alguns hospitais deverão agravar-se no próximo mês se o Governo não tomar medidas.

Temo que, pelo facto de o Ministério da Saúde ainda não ter tomado decisões nesta área, setembro possa ser pior do que agosto e que, se calhar, o resto do ano não corra assim tão bem”, anteviu Miguel Guimarães.

O bastonário falava aos jornalistas no final de uma reunião com 20 dos cerca de 150 médicos internos de ginecologia e obstetrícia que, no início deste mês, enviaram uma carta à ministra da Saúde sobre a crise atual enfrentada pela especialidade.

Quando os médicos mostram preocupação em identificar as questões que estão menos bem e é necessário corrigir com urgência, não terem sequer uma sinalização da receção da carta ou, mais grave ainda, não existir uma reunião [com a tutela] é lamentável”, disse o bastonário.

Sublinhando que desde junho se assiste a constrangimentos nos serviços ginecologia e obstetrícia de alguns hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e que desde o início do ano os médicos alertavam para essa situação, Miguel Guimarães considerou que o problema vai agravar-se “se nada for feito” com consequências a diferentes níveis.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A própria formação está a começar a ser prejudicada nesta matéria”, referiu, explicando que em muitos casos os médicos internos “estão a ser desviados para fazerem serviço de urgência em detrimento de fazerem a sua formação em áreas especificas da obstetrícia e ginecologia”.

Por outro lado, o bastonário sublinhou também o excesso de horas extraordinárias realizadas pelos médicos internos, sendo que na carta enviada à ministra da Saúde esses profissionais reiteram a indisponibilidade de fazer mais de 150 horas extraordinárias por ano.

Médicos internos de Medicina Interna indisponíveis para mais 150 horas extra por ano

De acordo com Miguel Guimarães, uma das médicas presente na reunião relatou que no seu hospital, que o bastonário não identificou, todos os médicos internos já tinham feito mais de 600 horas extraordinárias entre janeiro e agosto.

“É quase uma escravatura”, disse o representante dos médicos, alertando que o excesso de horas extraordinárias tem também impacto na qualidade da prestação dos cuidados de saúde.

O problema, acrescentou, não é exclusivo da obstetrícia e ginecologia, estendendo-se a várias especialidades, e tem resultado, nos últimos anos, na saída de profissionais do SNS.

Os médicos, em vez de estarem a protestar, a fazer manifestações e greves, estão a sair do SNS e o facto de haver muitos médicos especialistas a sair do SNS é o sinal de alerta mais forte que existe”, disse, afirmando que não se trata de falta de médicos, mas da dificuldade em captar e manter médicos no setor público.

Questionado sobre que medidas são necessárias, por parte do Ministério da Saúde, para resolver a situação, o bastonário referiu a necessidade de alterações estruturais e a revisão da carreira médica,

Para rever uma carreira, não são precisos meses, nem anos. É preciso motivação, interesse em resolver os problemas e andar para a frente. No fundo, é preciso fazer acontecer”, resumiu, considerando que, em vez disso, o executivo tende a “empurrar para a frente com a barriga”.