“Truques”, “falta de coragem”, “ilusão”, “fraude”. Do partido mais à esquerda no hemiciclo ao partido mais à direita houve quase unanimidade em relação à falta de ambição do Governo no pacote de medidas anunciadas para combater os efeitos da inflação. Nas habituais reações pós-anúncios, um a um, os partidos sucederam-se aos microfones num coro de críticas ao Executivo de Costa.

O PSD acusou Governo de “colocar em primeiro a arrecadação de impostos”, falando numa “ilusão“. “É uma ilusão, não é pôr as famílias em primeiro”.

“Não está a colocar primeiro nada mais que a arrecadação de impostos. Esqueceu que devia ter defendido primeiro as famílias portuguesas. Esta ilusão com os pensionistas é profundamente errada”, apontou o social-democrata António Leitão Amaro,  que recordou que “desde maio o PSD” tem apresentado propostas. Para o PSD, aliás, a única novidade que António Costa trouxe esta segunda-feira foi “uma ilusão”.

“O primeiro-ministro disse que os portugueses vão ganhar, [mas] não vão. [O Governo] começa a pagar agora para no próximo ano pagar menos do que deveria. Não só tem uma proposta que apoia menos os pensionistas como é uma forma errada de tratar os pensionistas, parece que está a dar, mas na realidade dá menos que a lei previa para o próximo ano”, apontou o social-democrata. E criticou também a falta de ambição do Executivo de Costa: “Não cumpriu a proposta de reduzir o IVA para gás e combustíveis, p PSD propunha redução para taxa mínima na eletricidade, gás e combustíveis. O Governo decidiu não o fazer”.

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Na direita, Iniciativa Liberal e Chega usaram a mesma expressão para classificar o plano do Governo: “fraude“. O Chega acusou o Governo de dar apenas “uma migalha” aos portugueses. “Este plano é uma fraude política, financeira e fiscal”, disse o líder André Ventura.

“Este pacote de ajuda é uma migalha do que o Governo tem cobrado com a impostos a mais a crescer com a inflação”, disse Ventura, frisando que no que diz respeito ao aumento dos pensionistas anunciado por Costa, este se trata de “uma fraude”: “É uma fraude, não é um aumento, é uma antecipação apresentada como aumento. António Costa falhou aos portugueses, fingiu que estava a aumentar quando na verdade está só a antecipar”.

Já a Iniciativa Liberal considerou ainda que “montanha pariu um rato” e acusou Governo de “continuar viciado em impostos”.  “Quando os portugueses mais precisam, o PS falha. Falha porque é incompetente, prepotente e porque mente”, acusou Rodrigo Saraiva, da Iniciativa Liberal.

“[O programa] é uma fraude, é o PS na sua propaganda a enganar as pessoas. O primeiro-ministro esqueceu-se de dizer hoje que esteve a mentir: desde abril podia ter baixado o IVA da eletricidade e do gás”, apontou frisando que o Governo “continua viciado em impostos” e que, por isso, não houve qualquer medida que mexesse com os impostos (além de passar parte da fatura da luz, taxada a 13% para os 6%).

Esquerda insiste na taxação de lucros excessivos e aponta falta de coragem

Com a maioria absoluta do Partido Socialista a comandar os destinos do país, longe vai o tempo da necessidade de articulação ou criação de consensos com a esquerda. Agora, dos parceiros de outras núpcias, Costa só ouve mesmo críticas.

O PCP diz que as “medidas são curtas, parciais e que não dão uma resposta estrutural ao que o país precisa”. Coube a Bruno Dias falar na noite desta segunda-feira, frisando que é “urgente taxar os lucros extraordinários dos grupos económicos” e “aumentar extraordinariamente o Salário Mínimo Nacional para os 800 euros”.

“Há um total descontrolo nos preços”, notou o deputado Bruno Dias, considerando que “vai continuar a haver perda de poder de compra” e que o que foi anunciado pelo primeiro-ministro “de modo nenhum pode substituir atualizações e pensões de reforma e salário dos portugueses”.

Pelo Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua apresentou aos portugueses contas mais claras para desfazer o que o BE considera serem “truques” do Governo e classificou também o pacote de medidas como “muito curto”.

“Os 2,4 milhões de euros ficam muito aquém da receita fiscal extraordinária que os portugueses estão a dar ao Estado através do IVA acrescido ou dos impostos sobre os combustíveis fruto da inflação”, notou a bloquista, considerando que são insuficientes “para compensar toda a perda de poder de compra, salários e pensões que todas as pessoas têm tido ao longo do último ano”.

Sobre as medidas para os reformados, Mortágua diz que foi um dos “truques” de António Costa e pediu “cuidado aos pensionistas”: “O que António Costa está a dizer é que vai rever a atualização de 2023 e vai reduzir o aumento que os pensionistas têm direito. Em troca vai dar meia pensão em 2022. Estamos a falar de um adiantamento relativamente às pensões que têm direito em 2023.”

Também na redução do IVA da eletricidade o Bloco desconfia do alcance do que foi anunciado por Costa: “O IVA da eletricidade não vai descer para 6%, só desce o que estava a 13%. A maior parcela do IVA que estava a pagar é 23% e vai continuar a ser.”

“Não estamos a falar de reposição ou devolução, estamos a falar de perda acelerada do poder de compra dos portugueses”, disse a bloquista com matemática simplificada para ajudar a descortinar o anunciado: “O apoio extraordinário de 125 euros é dado a quem já perdeu um mês de salário. Para um salário de 1.200 euros (a 14 meses) um pagamento único de 125 euros equivale a 0,75% quando a inflação está a 4% ou 5%”.

Pendido, tal como o PCP, “medidas para taxar lucros excessivos”, Mortágua frisou que “Portugal é o único que se recusa”. “Não existe vontade política do Governo para apresentar medidas substanciais para o país e que consigam mudar a vida das pessoas”.

Já o Livre considerou que há “oito lacunas nas oito medidas do Governo” que nelas “não há nada de corajoso”. As lacunas identificadas pelo Livre começam, desde logo, na “dimensão”: “é um plano 23 vezes menor que o alemão, está aquém”.

No que diz respeito às restantes áreas, entre a falta de ambição na gratuitidade dos transportes, na necessidade de “ajudar mais os pensionistas mais pobres” — defendendo, para isso, o apoio com um valor absoluto e não proporcional às pensões –, a falta de respostas na “eficiência energética” ou a inexistência de medidas para “taxar lucros excessivos”, Rui Tavares diz que no plano do Governo “não há nada de corajoso”.

Pedindo “inovação nas políticas públicas”, Rui Tavares recordou ainda que a ambição do Governo para o salário mínimo nacional do próximo ano é a mesma que era a “30 de janeiro, antes do início da guerra a 24 de fevereiro” quando, lembrou, António Costa diz que “tudo mudou”.

Pelo PAN, Inês Sousa Real considerou que “é fundamental que o Governo possa continuar a revisão” e que as “medidas para os pensionistas ficam abaixo”, apontando que “não é um aumento real”. “É uma política de zero acomodação das reais necessidades dos portugueses”, apontou a líder do Pessoas-Animais-Natureza.

Partido Socialista, completamente sozinho, congratula-se com medidas anunciadas pelo Governo de maioria absoluta e fala em “medidas de caráter histórico”

Na sede socialista, falou o secretário-geral adjunto do Partido Socialista João Torres para garantir que “os portugueses podem contar com o PS nos bons e maus momentos”.

“Quando os portugueses mais precisam do PS, o PS diz presente e isso ficou comprovado com o anúncio que o primeiro-ministro fez ao país”, diz o socialista, considerando que as medidas anunciadas “abrangem todas as gerações” e “toda a classe média”.

Deixando uma “mensagem de esperança aos portugueses”, João Torres considera que o líder socialista e chefe de Governo anunciou “medidas de caráter histórico” que se somam “aos apoios já mobilizados em 2022”.