Entra Mário Rui, sai Raphael Guerreiro. A pequena janela de dias que existe entre a paragem nas provas nacionais e a concentração nas respetivas seleções tem um léxico relativamente curto e conhecido. Entra, sai. Lesionado, substituído. Dispensado, chamado – ou apenas dispensado, ficando a convocatória mais curta num elemento. Por aqui, a saída de Rafa da Seleção por renúncia era uma surpresa. Depois, como explicaram ao Observador, há a comparação com outros casos. Ou com em específico, também em 2022: Bruno Alves. Aos 40 anos, perspetivando o início de funções como diretor desportivo do AEK, o central que nunca se mostrou indisponível para a Seleção anunciou o final da carreira e teve a mensagem personalizada do líder da Federação a agradecer por tudo o que fez no futebol nacional. Agora, o jogador de 29 anos anunciou em comunicado à agência Lusa o fim para a equipa principal de Portugal, numa notícia que foi colocada no site da Federação com uma curta mensagem de agradecimento da Direção da FPF.
Rafa renuncia à Seleção Nacional. Avançado do Benfica cita “razões de foro pessoal” para a decisão
Oito anos e meio da estreia pela Seleção A promovida por Paulo Bento, num encontro particular com os Camarões em Leiria que acabou com uma goleada por 5-1 e que teve o então avançado do Sp. Braga como titular a dar lugar ao intervalo a Edinho, o caminho que cruzou com os pontos mais altos de Portugal mas que nunca foi propriamente o mais tranquilo chegou ao fim. “Julgo tratar-se de uma decisão honesta e acertada, neste momento da minha carreira. Peço que as razões, de foro pessoal, sejam respeitadas por todos. Estarei sempre na primeira fila a apoiar a equipa de todos nós”, destacou na despedida.
“O que nós temos mais de fazer é respeitar e honrar a vontade do Rafa. Foi a vontade dele. Ele pretende dedicar-se e estar concentrado a 100% no Benfica. É uma decisão que tomou, assim o pretendia. Graças a Deus houve, da parte de todos, respeito mútuo. Os grandes jogadores deixam sempre saudades. Nós sabemos também que vai deixar essa saudade. Ela justifica-se por, uma vez mais, em mais uma temporada, ele ter vindo a ser destaque no clube que representa desde há uns anos a esta parte”, referiu António Araújo, empresário do avançado dos encarnados, em declarações feitas à Antena 1. Não sendo caso único no futebol europeu, a decisão não deixou de surpreender. Assim acabaram oito anos e meio.
As presenças no Europeu e na Liga das Nações com a chegada à Luz pelo meio
Depois dessa primeira internacionalização frente aos Camarões, e numa temporada em que o Sp. Braga chegou às meias-finais da Taça de Portugal e da Taça da Liga mas acabou em Campeonato no nono lugar, Rafa foi suplente utilizado nos particulares com a Grécia (0-0) e com o México (1-0) e entrou na lista final do Campeonato do Mundo de 2014, no Brasil, onde Portugal não passou da fase de grupos e o avançado não chegou a ser utilizado, saindo depois das opções da Seleção até outubro já com Fernando Santos no comando da equipa, sendo suplente não utilizado na Sérvia na qualificação para o Europeu, jogando nos particulares com Rússia (0-1) e Luxemburgo (titular, 2-0) no final de 2015.
Em 2016, naqueles que seriam os últimos meses antes da saída do Minho para a Luz naquela que foi até este verão a transferência mais cara de sempre entre clubes nacionais (David Carmo superou essa fasquia), Rafa assumiu um papel mais efetivo na Seleção antes do Campeonato da Europa em partidas particulares: titular com a Bulgária (0-1), suplente não utilizado com a Bélgica (2-1), suplente utilizado com a Noruega (3-0), titular com Inglaterra (0-1) e suplente não utilizado com a Estónia (7-0). No Europeu de França, que terminou com a histórica vitória de Portugal, o avançado foi suplente utilizado com a Áustria (0-0), não saindo do banco nas restantes partidas da caminhada que terminou com o decisivo golo de Éder.
Euro 2016. Um ano depois, como estão os 23 campeões europeus?
No regresso, já como jogador do Benfica, Rafa foi suplente utilizado com Gibraltar (5-0) mas falhou depois os restantes encontros até ao final de 2016 e todos em 2017, ficando de forma quase natural fora do último Mundial em 2018. Só mesmo em outubro, na Polónia, a contar para a Liga das Nações, o avançado voltou à Seleção e como titular (3-2), sendo suplente utilizado no particular com a Escócia (3-1) e titular de novo com a Polónia mas em casa (1-1). O jogador tinha voltado para ficar, sendo suplente utilizado na fase de apuramento para o Euro-2020 com a Ucrânia (0-0), titular com a Sérvia (1-1) e suplente utilizado na final da Liga das Nações com os Países Baixos (1-0), segunda conquista nacional (golo de Guedes). Ainda em 2019, Rafa foi suplente utilizado na Lituânia (5-1), naquele que foi o último encontro esse ano.
Em outubro de 2019, teve início uma fase distinta da presença do jogador na Seleção que a primeira de mais dispensas por lesão quando era convocado (nesse caso, devido a um problemas no joelho). Depois da paragem nas competições devido à pandemia, Rafa voltou em outubro de 2020 na receção à Suécia para a Liga das Nações como suplente utilizado (3-0) e manteve essa presença nos eleitos no início de 2021 sendo suplente utilizado na qualificação para o Mundial com o Azerbaijão (1-0), suplente não utilizado na Sérvia e suplente utilizado frente ao Luxemburgo (3-1). Também nos jogos particulares foi aposta, como suplente utilizado em Espanha (0-0), antes de ser chamado à fase final do Campeonato da Europa de 2020, onde foi suplente utilizado com duas assistências frente à Hungria (3-0) e frente à Alemanha (2-4).
As duas dispensas, a “falta de compromisso” desmentida e a renúncia na primeira chamada
No arranque da temporada de 2021/22, Rafa foi titular na qualificação para o Mundial com a Rep. Irlanda (2-1), suplente utilizado no particular com o Qatar (3-1) e suplente não utilizado com o Azerbaijão (3-0), na última vez que entrou numa ficha de jogo. Em outubro, apenas um mês depois dessa convocatória, Rafa foi chamado, apresentou problemas físicos e foi dispensado; em novembro, mais uma vez, foi chamado e a seguir dispensado também por lesão. Foi também nessa altura que surgiu uma notícia que dava conta de outras razões para a dispensa, com o jornal Record a falar de falta de compromisso aos olhos das pessoas responsáveis da Federação que gerava algum incómodo além de uma personalidade que era tida como “complicada” e que condicionava também a sua presença. Fernando Santos recusou a ideia, sendo que, em paralelo, o avançado acabou por jogar e marcar no jogo seguinte à dispensa pelo Benfica.
“É totalmente falso. Foi convocado das últimas duas vezes. Está comigo desde 2015, quando estava no Sp. Braga. Foi campeão da Europa, ganhou a Liga das Nações. Vai voltar a ser chamado, sem dúvida. Estava na última convocatória, como estava João Mário, Raphael Guerreiro e Anthony Lopes, mas lesionaram-se. Não estava a 100%. Está tudo tranquilo com o Rafa. Faz parte dos 30, não dos 40. Relação com a equipa? É boa. Desgaste? De maneira nenhuma. A relação, pessoal e profissional, é excelente. Se sinto os jogadores do meu lado? Sim. Tenho 34 anos de treinador. Quando não se joga, há sempre insatisfação e azia, como se diz na gíria. Na Seleção, quando todos têm qualidade, é normal os jogadores que não jogam não ficarem satisfeitos. Mau seria se eles ficassem satisfeitos”, disse em entrevista à TVI.
“Saio pelo meu próprio pé.” Fernando Santos promete abandonar Seleção se Portugal falhar o Mundial
Esta quinta-feira, quando anunciou os convocados para os últimos dois jogos da Liga das Nações com Rep. Checa e Espanha, Fernando Santos voltou a colocar na lista o nome de Rafa, não tendo indicações de que não o devesse fazer. “Ausência de Otávio? As informações que tenho são do meu departamento clínico. O meu departamento diz que há dois jogadores indisponíveis, Otávio e Renato Sanches. A partir do momento em que dizem que estão inaptos, é porque não têm condições físicas para estarem presentes”, referiu, sendo que, este domingo, Raphael Guerreiro foi também substituído por Mário Rui por lesão.
De Rafa, nem um sinal de uma possível renúncia, que surgiu no dia seguinte a mais uma grande exibição pelo Benfica frente ao Marítimo e numa fase em que atravessa o melhor momento desde que chegou à Luz. Uma coisa é certa: desde que falhou as duas últimas jornadas de qualificação para o Mundial, e apesar de Fernando Santos ter garantido que não havia qualquer problema, Rafa não voltou a ser chamado. Agora, a dois meses de um Campeonato do Mundo onde tinha fortes hipóteses de entrar nos convocados, decidiu não só não integrar a Seleção como abdicar dessa competição em novembro e dezembro, falando apenas numa posição “honesta e acertada” nesta fase da carreira e alegando apenas “razões de foro pessoal”.