O caso de Pedro Nuno Santos gerou uma dissonância no discurso da Iniciativa Liberal no que toca às decisões que o ministro das Infraestruturas podia ou não ter tomado relativamente à participação na empresa da família. A posição do partido é clara — a lei é para cumprir. No limite, se tiver de ser revisitada, o processo não deve ser acelerado a reboque de casos e casinhos.

Mas a dissonância é outra e foi notada pelos adversários políticos da Iniciativa Liberal: o deputado Carlos Guimarães Pinto desresponsabilizou Pedro Nuno Santos, já depois de João Cotrim Figueiredo ter dito que o ministro podia e devia ter abdicado da participação.

As frases em causa surgem em dois momentos distintos. Primeiramente, o presidente da IL foi questionado sobre a questão das incompatibilidades depois da audiência com Marcelo Rebelo de Sousa em Belém e foi perentório:

Há remédios que ficam previstos imediatamente na lei, um deles não foi usado por nenhum destes ministros e era facilmente utilizável que era o da suspensão das participações sociais.

João Cotrim Figueiredo, 12 de outubro no Palácio de Belém

Para João Cotrim Figueiredo, “à letra e ao espírito da lei atual”, Pedro Nuno Santos e Manuel Pizarro cometeram atos “ilícitos e ilegais” que “têm uma sanção clara prevista na lei”.

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Apesar de não estar de acordo com as consequências que a lei prevê, Cotrim Figueiredo realçou que a mesma é “clara” e defendeu que Pedro Nuno Santos poderia ter usado um dos “remédios” previstos na lei para não estar em situação irregular, nomeadamente optando pela “suspensão das participações sociais”.

Guimarães Pinto teve outro entendimento. Cinco dias depois, no momento em que os partidos tiveram, pela primeira vez, a possibilidade questionar o ministro das Infraestruturas, Carlos Guimarães Pinto saiu em defesa de Pedro Nuno Santos.

Não podendo controlar nem quem compra nem quem vende, não consigo responsabilizá-lo politicamente por isto.

Carlos Guimarães Pinto, 19 de outubro na audição de ministro das Infraestruturas e da Habitação

Para o deputado liberal, é “evidente que o ministro nem tutela o comprador nem tem capacidade de influenciar decisões de quem vende”. Assim, admitiu que não é possível “responsabilizar politicamente” o ministro e nem julgá-lo em termos éticos.

No final da intervenção, Guimarães Pinto separou aquela afirmação da “questão legal“, mas defendeu que Pedro Nuno Santos fez o possível, sem qualquer sugestão sobre o que havia sido dito pelo líder liberal (que a suspensão teria sanado as incompatibilidades).

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Rodrigo Saraiva, líder da bancada parlamentar da IL, usou o debate para esclarecer: “Se existe uma lei, cumpra-se. E isto não significa que se concorde com uma lei em específico ou normas particulares de uma lei.”

O deputado liberal sublinhou que a IL não “confunde” a lei com “avaliação política, sobretudo de considerações de salvaguarda ética no exercício de funções de alguns governantes, com a aplicação da lei existente”.

João Cotrim Figueiredo já tinha criticado a lei e a redação da mesma, dizendo até que “há coisas que não se entendem nem à décima leitura”, e acredita que não se devem fazer alterações “à pressa”. “E de revisão em revisão em revisão em revisão, o que fica é confusão“, realçou o líder parlamentar no debate.

“Há valores que no imediato têm de ser acautelados — os valores da transparência e hombridade na gestão de dinheiros públicos e das relações de titulares de cargos públicos —, mas há valores de mais longo prazo que têm de ser acautelados — os valores da qualidade da classe política perante o emaranhado de legislação e limitações têm vindo a ocorrer corremos o risco de ter cada vez piores titulares de cargos públicos”, referiu o presidente da IL.

E sublinhou que “é preferível ter uma lei menos particularizada nos casos específicos de parentesco, mas que defina os ilícitos do que é que constitui tratamento de favor”.

No mesmo sentido, Carlos Guimarães Pinto afirmou, em frente a Pedro Nuno Santos, que “entrar na política já tem implicações excessivas sobre a vida de quem decide fazê-lo”, realçando que as “famílias não podem ser responsabilizadas” pelas decisões de quem tem cargos públicos.

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