“A comida é saúde, cultura, lazer e indústria, é o que fazemos todos os dias e por isso faz sentido falarmos dela”, quem o diz é Ricardo Dias Felner, jornalista gastronómico e curador do Melting Gastronomy Summit. A 2.ª edição do congresso exclusivamente dedicado à gastronomia terá como foco a cozinha portuguesa e os seus produtores, pois “é aqui que reside grande parte da nossa riqueza”.

“Quando queremos fazer uma conferência importante temos normalmente a tendência em Portugal de procurar os nomes mais sonantes para os espetarmos num cartaz com letras grandes. Não é que não tenhamos coisas a aprender com o que se faz lá fora, mas acho que temos esquecido os traços da nossa culinária e aquilo que nos distingue”, começa por explicar o curador ao Observador, acrescentando a importância de voltar às raízes do receituário português. “Começámos a viajar e a perceber que se faziam lá fora coisas extraordinária, ficámos muito deslumbrados com isso e aquela ideia de que a cozinha portuguesa é imbatível foi sendo posta em causa. Hoje os chefs têm mais mundo e gostávamos de ter no Melting essa mistura de conhecimentos que fomos adquirindo pelo mundo.

Olhar para a identidade gastronómica nacional e para os produtos que a tornam única, convidar 12 chefs a trabalhar esses ingredientes, dando-lhes uma nova imagem, mais contemporânea, mas sem esquecer a memória e os sabores associados a esses pratos é uma das premissas do evento, que contará com table talks e livecookings, num encontro harmonioso entre chefs e produtores.

“A grande maioria da restauração é fornecida por duas ou três marcas de distribuição de comida, são empresas competentes e que fazem bem o seu trabalho, mas isto leva a que encontremos os mesmos produtos em quase todos os restaurantes, a mesma carne, as mesas verduras e os mesmos camarões. É altamente desinteressante, não apenas porque a qualidade não chega aos patamares mais altos, mas sobretudo porque acaba com a possibilidade de usarmos toda a diversidade de produtos locais. Este trabalho com os produtores que muitos chefs já fazem é extremamente importante e enriquecedor”, sublinha Ricardo Dias Felner.

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“Quando vamos viajar, do que sentimos mais saudades?” Foi este o mote para escolher receitas e produtos a explorar dentro de portas, como a carne, o marisco, as sopas ou o azeite. Natalie Castro, chef responsável pela cozinha do Isco, em Lisboa, vai abrir as hostes e preparar um caldo verde com batata raíz de cana, uma variedade antiga da Lourinhã que está a desaparecer. No mesmo dia, Marco Gomes, chef do portuense Oficina, irá preparar um arroz de costelinhas com Allorio, azeite e carnes autóctones. “Somos o país europeu que mais consome arroz e um dos maiores produtores do mundo, conhecemos e tratamos muito mal o nosso arroz e nos últimos anos desapareceram algumas variedades portuguesas que eram únicas. Conseguimos levar ao Melting o arroz carolino Allorio, de Montemor, um ingrediente já não comercializado”, partilha o curador.

André Magalhães, da Taberna da Rua das Flores, apresentará uma carne de porco à alentejana, onde não faltará o seu pimentão caseiro, já Nuno Castro, do Fava Tonka, e Renato Cunha, do Ferrugem, juntam-se na estreia mundial de um sarrabulho vegetariano. O azeite português irá imperar em duas sobremesas, uma mousse de chocolate com 85% de cacau e um gelado de baunilha, numa prova comentada pelo jornalista Edgardo Pacheco e a oleóloga do Esporão, Ana Carrilho.

O programa inclui ainda dois nomes espanhóis que irão dar nas vistas no sábado. Edu Perez, chef do restaurante Tohqa, um dos mais emergentes na região da Andaluzia, mostrará os seus dotes na grelha com o seu prato mais famoso: uma gamba branca com brasa de videira e gordura de vaca. Já Juanlu Fernández, chef do Cañabota, em Sevilha, chega com uma receita de peixe ousada e sustentável onde, do aparelho digestivo aos lombos, tudo é aproveitado na hora de cozinhar umas tripas lírio.

A edição de 2022 do Melting Gastronomy Summit, promovido pela AGAVI – Associação para a Promoção da Gastronomia, Vinhos, Produtos Regionais e Biodiversidade, acontece nos próximos dias 25 e 26 de novembro, na Galeria do Mercado do Bolhão, no Porto, e os bilhetes começam nos 50 euros por pessoa.