Os documentos confidenciais dos serviços de informação norte-americana que foram vazados nas redes sociais incluem referências a uma possível resistência da agência de espionagem israelita Mossad às ações do governo de Benjamin Netanyahu. Em concreto, nos documentos afirma-se que a agência terá “encorajado” os seus funcionários a participar nos protestos contra a reforma judicial que têm abalado o país ao longo do último mês — informação formalmente negada pela Mossad e pelo gabinete do primeiro-mininistro israelita.

De acordo com o The New York Times e o Washington Post, os documentos incluem uma avaliação de 1 de março em que as agências norte-americanas afirmam que os líderes da Mossad “fizeram força para que responsáveis da Mossad e cidadãos israelitas protestem” contra a reforma, “incluindo vários apelos explícitos à ação contra o governo israelita”.

O documento não dá mais pormenores, mas afirma que esses esforços terão ocorrido durante o mês de fevereiro e que esta informação terá sido obtida através de tecnologia SIGINT (interceção de comunicações).

A informação foi rapidamente desmentida pelo gabinete do primeiro-ministro israelita e da Mossad. “A publicação na imprensa americana é completamente falsa e absurda”, diz o gabinete de Netanyahu. “A Mossad e os seus responsáveis não encorajaram nem encorajam funcionários da organização a participar em manifestações contra o governo ou em manifestações no geral, nem a participar em atividade política.”

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O atual governo de Netanyahu, que inclui na sua composição vários partidos de extrema-direita, está sob forte pressão desde o início de março, altura em que se iniciou uma vaga de protestos contra a reforma judicial que propõe — e que, em concreto, submete os juízes do Supremo Tribunal a um maior controlo por parte do poder político.

Logo em fevereiro, a imprensa israelita noticiou que cinco antigos chefes da Mossad assinaram um documento que se opunha à proposta da reforma judicial. Nas semanas seguintes, o líder da Mossad, David Barnea, autorizou que funcionários com cargos de menor responsabilidade pudessem participar nos protestos, desde que não se identificassem como membros da agência.

Vários comentadores israelitas pronunciaram-se este domingo desvalorizando as notícias norte-americanas e apresentando estes dois pontos como possíveis explicações para a avaliação dos documentos. Terão confundido “encorajar” com “permitir” e terão baralhado a ação de antigos diretores da Mossad com os atuais, nota o Times of Israel.

Por outro lado, o filho do próprio primeiro-ministro israelita já acusou no passado membros das secretas do país de estarem a promover os protestos. Yair Netanyahu também acusou o Departamento de Estado norte-americano de fazer o mesmo “com o objetivo de derrubar Netanyahu, aparentemente para conseguir concluir um acordo com os iranianos”.

Embora oficialmente o Pentágono não tenha reconhecido a autenticidade dos documentos vazados, fontes desta entidade indicaram ao Times que se tratam de documentos legítimos da Defesa norte-americana, mas que as cópias aparentemente foram alteradas em certas partes. Uma das alegadas versões modificadas terá um número de baixas russas menor do que aquele que é considerado pelos analistas, por exemplo — razão pela qual Washington suspeita que a Rússia poderá estar por trás da divulgação.

Certo é que, se esta avaliação dos serviços secretos norte-americanos se confirmar, isso indicia uma total mudança de postura da Mossad face à política interna do país, já que habitualmente a agência não se imiscui em assuntos internos. “Se isto for verdade, é uma mudança drástica de procedimento na liderança da Mossad e deixa Israel num território sem precedentes”, analisou ao Washington Post Natan Sachs, especialista em Israel da Brookings Institution. “É um sinal de quanto a coligação Netanyahu está a empurrar a sociedade israelita e quão elevado é o risco.”